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Denúncias de maus-tratos contra animais explodem durante pandemia

Em 2020, número de casos registrados na delegacia eletrônica de São Paulo chegou a 15.478 – um crescimento de 28% em relação ao ano anterior

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Cachorro com medo
1 de 1 Cachorro com medo - Foto: Reprodução/ Freepik

São Paulo – Durante o ano de 2020, a Delegacia Eletrônica de Proteção Animal (Depa) do estado de São Paulo recebeu 15.478 denúncias de maus-tratos contra animais, o que representa 42 registros por dia. Em relação a 2019, quando foram 12.075 registros, houve crescimento de 28%, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP).

“Infelizmente, no começo da pandemia, surgiram algumas notícias sensacionalistas de que cães e gatos poderiam transmitir a Covid-19 aos seres humanos. A gente viu casos de abandono, de pessoas maltratarem e colocarem o bicho para fora. Em outros países, houve casos bem mais graves, de pessoas que jogaram animais de sacadas e de janelas”, afirma Rosangela Gebara, médica-veterinária e membro da Comissão Técnica de Bem-Estar Animal, do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP).

Em março do ano passado, diversos municípios e ONGs relataram o aumento de casos de abandono animal. “Isso pode ser atribuído à questão da crise econômica. Muitas pessoas fecharam os seus negócios, perderam o seu emprego, não tinham como pagar aluguel e mudavam de cidade, de estado, e acabavam abandonando os animais. Ou deixavam eles presos dentro de casa, ou paravam de dar comida, ou não levavam o animal ao veterinário”, informa Rosangela.

A presidente da União Internacional Protetora dos Animais (Uipa), Vanice Teixeira Orlandi, afirma que a entidade recebeu, durante a pandemia, diversas ligações de pessoas que estavam com problemas financeiros e diziam que precisavam abandonar o animal. Para ela, no entanto, isso é um pretexto para uma situação que sempre existiu.

“Espera aí! Quanto custa um pacote de ração? Não é assim também. Na verdade, meio que mudou o pretexto. Gente querendo se livrar do próprio animal é direto. É porque ficou grande, é porque ficou pequeno, é porque vai se mudar de casa, porque casou. E agora arrumaram uma desculpa mais aceitável moralmente e que não convence”, diz.

Segundo Rosangela, notou-se também um crescimento em denúncias feitas em redes sociais de casos de violência, como animais esfaqueados, mas não há como fazer uma associação direta desse aumento com a pandemia. “Será que as pessoas que as pessoas estão mais violentas, estão mais dentro de casa com animal?”, pondera.

Por outro lado, a veterinária destaca que há uma relação direta entre maus-tratos contra animais e violência doméstica contra a mulher – ambos os crimes registraram aumento de casos, durante pandemia. “Os animais são os mais vulneráveis dentro de uma residência. Muitas vezes, há uma pessoa agressora convivendo mais com a família dentro de casa, o que resulta em violência contra o ser mais vulnerável. Começa com o cachorro da família, com gato, e aí parte para crianças, esposas e idosos. Tanto que a gente fala que os animais domésticos são as sentinelas para casos de violência doméstica”, avalia.

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O que são maus-tratos contra animais

Maus-tratos consistem em qualquer ação que resulte em um prejuízo para a saúde, física ou psicológica do animal. Segundo o Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), isso inclui, por exemplo, manter um animal preso a uma corrente no quintal, não oferecer cuidados veterinários quando o animal fica doente, não fazer medicina preventiva, não dar carinho, gritar e abandonar o bicho, além da violência física.

“Qualquer coisa que afete o bem-estar desse animal, tanto do ponto de vista físico como psicológico, é considerado maus-tratos”, diz Rosangela. Uma resolução do CFMV, de 2018, lista 31 exemplos de maus-tratos contra animais domésticos.

Uma lei sancionada em setembro de 2020 aumentou a pena para quem maltratar cães e gatos. A prática de abuso, maus-tratos, ferimento ou mutilação dos bichos de estimação passou a ser punida com reclusão de dois a cinco anos, além de multa e proibição de guarda.

A norma alterou a Lei dos Crimes Ambientais e foi batizada de “lei Sansão”, em homenagem a um cão da raça pitbull, que foi amordaçado com arame farpado no focinho e teve suas patas traseiras decepadas. Até então, a pena era de detenção de três meses a um ano, mais multa, dentro do item que abrange todos os animais (silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos). Há agravante de um sexto a um terço da pena, se o crime causar a morte do animal.

“Infelizmente, a gente não teve uma prisão desde que essa lei foi sancionada. Há casos de pessoas que foram detidas na delegacia e pagaram fiança – o processo, então, está correndo com o acusado em liberdade. Não que alguém vá se livrar da acusação criminal: pode haver julgamento e prisão, ao fim do processo”, afirma a veterinária.

Para a presidente da Uipa, a legislação atual ainda é muito complacente e prevê uma pena muito baixa. Na avaliação de Vanice, além disso, há dificuldade das autoridades em interpretar o que são maus-tratos.

“Animal acorrentado é muito comum em comunidades ou em um imóvel que o muro é baixo. A pessoa acorrenta o animal e acha que isso não constitui maus-tratos, e é – porque o animal é obrigado a se alimentar e permanecer ali mesmo, onde defeca. A maioria das autoridades não considera isso maus-tratos”, afirma.

Denúncias

A SSP não quis se manifestar sobre o aumento de número de denúncias, que podem ser registradas on-line pela Depa. Segundo a secretaria, as denúncias são encaminhadas para os distritos policiais em todo o estado de São Paulo, onde são elaborados os boletins de ocorrências e os fatos são investigados. Caso o cidadão presencie a situação em flagrante, deve acionar o 190 e falar com a Polícia Militar.

Rosangela destaca que é importante, ao fazer a denúncia, reunir provas, de preferência fotos e vídeos, e testemunhas. “Tem as delegacias especializadas, mas qualquer uma é obrigada a recepcionar esse tipo de denúncia”, acrescenta.

Para situações em flagrante, como espancamento de um animal, a recomendação é acionar a Polícia Militar. “Para um caso grave, você tem que parar qualquer carro da PM. Se o carro parou na beira da estrada e abandonou um cachorro, a pessoa tem que tirar foto e ligar para a concessionária e polícia rodoviária, e dar assistência para aquele animal”, diz a veterinária.

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