Dentista suspeita de deformar pacientes oferecia cursos por R$ 15 mil
Divulgação dos cursos, não reconhecidos pelo MEC, era feita pelas redes sociais, nas quais a dentista soma mais de 650 mil seguidores
atualizado
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Presa suspeita de deformar o rosto de pacientes com a realização de procedimentos estéticos, a dentista Hellen Kacia Matias da Silva, oferecia cursos técnicos de forma irregular. De acordo com a Polícia Civil, os cursos profissionais só poderiam ser aplicados por médicos, no entanto, eram ministrados por Hellen, que não é reconhecida pelo Ministério da Educação (MEC).
A coluna Na Mira, do Metrópoles, divulgou o vídeo em que Hellen foi presa.
Segundo a delegada responsável pela investigação do caso, Débora Melo, um dos cursos oferecidos por Hellen, para realização de cirurgias faciais, com carga horária de três dias, chegavam a custar até R$ 15 mil por aluno.
Ainda de acordo com a investigadora, a quantidade de pessoas que fizeram cursos com Hellen é grande. Segundo ela, os profissionais estão espalhados em diversas regiões o país, por isso ainda não se tem o número exato. Conforme a delegada, os casos ainda estão sendo contabilizados pela corporação.
Débora Melo aponta que o contrato do curso ministrado por Hellen tinha a informação de que ela não era reconhecida pelo Ministério da Educação (MEC). Em nota, o MEC respondeu que “é responsável por instituições e cursos de nível superior, não tendo competência sobre cursos livres” e que o “exercício da profissão é de competência do respectivo Conselho Federal”.
Por sua vez, o Conselho Regional de Odontologia afirma que “medidas administrativas pertinentes estão sendo tomadas, obedecendo o devido sigilo aplicável ao caso”.
O registro profissional de Hellen continua ativo em Goiás. No site da entidade, consta que a profissional é cirurgiã-dentista com especialidade em harmonização orofacial.
Em posts de divulgação nas redes sociais é possível ver que alguns dos cursos que Hellen ministrava possuem essa temática, mas outros revelam cursos com uma técnica de lipo de papada, que na prática, segundo a polícia, se assemelha ao procedimento conhecido como face lifting, que é de realização proibida por profissionais.
Prisão da dentista
Hellen foi presa na última terça-feira (30/1), na capital goiana, com outros quatro mandados de busca e apreensão em endereços ligados à ela, tanto em Goiânia e em Santa Bárbara de Goiás. Naquela data, tinham sido colhidas declarações de 13 vítimas, bem como depoimentos de ex-funcionários do instituto.
Segundo a delegada, todos relataram que a mulher não aceitava qualquer crítica ao seu trabalho, tratando os pacientes com descaso.
Após a divulgação do nome e fotos de Hellen, mais quatro pessoas procuraram a delegacia para denunciá-la. A polícia diz que todas as novas vítimas são do interior do estado e vão prestar depoimento em breve.
No celular usado por Hellen para falar com pacientes, a polícia encontrou mais de 30 reclamações de consumidores insatisfeitos com os resultados dos procedimentos. Por esse motivo, a delegada acredita que o número de vítimas pode aumentar muito até o fim do inquérito.
Prints mostram que pacientes reclamavam de inflamações, cicatrizes e assimetria nos resultados . Todas as pessoas ouvidas pela polícia até o momento confirmam a realização de cirurgias estéticas proibidas em local inadequado (fora do ambiente hospitalar), gerando grave risco à integridade física dos consumidores.
A delegada afirma que as cirurgias estéticas eram anunciadas nas redes sociais da dentista, que possui mais de 650 mil seguidores, por valores abaixo do mercado, atingindo uma ampla gama de pessoas.
Materiais vencidos
No instituto coordenado por Hellen, no Setor Oeste, a polícia encontrou diversos instrumentos cirúrgicos, anestésicos e medicamentos vencidos. Os materiais foram apreendidos e descartados pela Vigilância Sanitária.
O órgão autuou a mulher por inadequação do alvará sanitário do estabelecimento, que não autorizava a realização de nenhum procedimento invasivo. Superintendente de vigilância em saúde de Goiânia, Pedro Guilherme de Moraes informou que o local foi interditado e multado em R$ 400 mil.
Segundo as advogadas Caroline Arantes e Thaís Canedo, que representam a dentista, a Justiça confundiu o procedimento realizado. A profissional – que tem a especialidade buco maxilo facial, realizou, após o dia 22 de novembro, procedimento reparador e não estético, dentro da competência da especialidade da profissional. Ela corrigiu lesão em uma paciente como uma complicação de procedimento (ectrópio) realizado anteriormente por uma outra profissional, o que é permitido pela resolução 65, artigo 41, do Conselho Regional de Odontologia (CRO).
A defesa reitera que o procedimento foi reparador, uma sutura feita na paciente para sanar uma intercorrência ocasionada por cirurgia prévia realizada por outra profissional e não uma blefaroplastia, como consta nos autos e no próprio depoimento da paciente.
Sob a condução das investigações, a defesa reclama que estão sendo veiculadas imagens de procedimentos com intercorrências que não foram realizados pela dentista Hellen Matias. Fotos que, inclusive, não são de pacientes da odontóloga, mas casos que foram levados para discussão em grupo de estudo, o que está muito claro no processo, até mesmo banco de imagens. As advogadas afirmam também que as fotos divulgadas foram descontextualizadas. Em sua grande maioria são de reações inerentes aos procedimentos e ao processo de cicatrização, como hematomas, inchaços e intercorrências normais.
As advogadas Caroline Arantes e Thaís Canedo alegam que o vazamento das imagens – que deveriam ser sigilosas, posto que não submetidas ainda ao crivo do contraditório – demonstra falta de lisura nas investigações. A propósito, o laudo do exame de corpo de delito que fundamenta a prisão da dentista comprova que não houve a execução de cirurgia estética facial pela Dra Hellen Matias, mas sim por outra profissional.
Todas essas alegações serão apresentadas pela defesa durante a audiência de custódia, que será realizada na tarde desta quarta-feira (31), no Fórum Cívil,3 Vara Criminal, mezanino, sala M 3 C, às 17 horas, do dia 31 de janeiro de 2024.