Crise na articulação: quem é José Guimarães, líder de governo na Câmara
Obstáculos na articulação política, especialmente na Câmara dos Deputados, têm feito o governo sofrer uma série de derrotas
atualizado
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O terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) começou com dificuldades no Congresso Nacional. Os obstáculos na articulação política, especialmente na Câmara dos Deputados, têm feito o governo passar por uma sequência de derrotas.
A liderança do governo na Casa Baixa é responsabilidade de José Guimarães (PT-CE). O deputado cearense tem enfrentado dificuldades em gerenciar pedidos de deputados e se relacionar com o presidente da Câmara e ministros que fazem a ponte entre Legislativo e Executivo.
Na última semana, o governo assistiu a Câmara aprovar o marco temporal das terras indígenas, que vai contra a agenda socioambiental promovida por Lula durante a campanha à Presidência.
Deputados também derrubaram o decreto de Lula que altera o marco do saneamento básico. Além disso, o governo penou para aprovar a medida provisória que reorganizou a Esplanada dos Ministérios, e precisou de muito diálogo e bilhões de reais em emendas para que o texto fosse apreciado.
Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, criticou duramente a articulação da gestão Lula. O alagoano disse que as lideranças precisam “andar com as próprias pernas”. No entanto, enalteceu o trabalho de Guimarães.
“[Guimarães] tem sido um herói bravo, lutando para que as coisas aconteçam. Se o resultado [das votações] for negativo, a culpa é do governo de maneira geral”, pontuou.
Os empecilhos na aprovação de matérias prioritárias no governo e as deficiências na articulação motivaram o presidente Lula a “entrar no jogo” e convocar reuniões com líderes da Câmara e do Senado no início desta semana. O objetivo é manter contato mais próximo com os parlamentares e debater os cenários de votações importantes no Congresso.
Quem é José Guimarães?
José Guimarães é advogado e deputado federal desde 2007. O cearense tem 63 anos e está em seu quinto mandato na Câmara. Filiado ao PT desde 1985, o político foi presidente do diretório da legenda no Ceará entre 1991 e 2000.
Guimarães foi citado no principal escândalo de corrução do PT, o mensalão. Em 2005, seu chefe de gabinete , José Adalberto Vieira, foi preso no embarque do aeroporto de Congonhas, em São Paulo, com US$ 100 mil na cueca.
Homem de confiança de Lula, Guimarães foi coordenador da campanha do petista à presidência em 1989 e 2002. Além disso, atuou como líder do governo na Casa Baixa durante o gestão de Dilma Roussef (PT).
Diferente dos primeiros mandatos de Lula, onde a articulação entre Executivo e Legislativo teve sucesso, o diálogo com deputados não foi bem-sucedido durante a gestão de Dilma — que acabou sofrendo impeachment em 2016.
Na avaliação de Eduardo Galvão, coordenador do MBA em Políticas Públicas e Relações Institucionais do IBMEC DF, a liderança pecou e a falta de proximidade entre governo e Congresso desagradou deputados no governo Dilma.
“Foi um governo muito fechado para receber parlamentares e conversar com eles. Quem acabou desempenhando esse papel e fazendo esse contato com os parlamentares foi o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que por conta disso acabou ganhando muito prestígio”, explicou em entrevista ao Metrópoles.
Articulação não depende só da Câmara
Apesar da importância do papel desempenhado por um líder de governo na Câmara, a atribuição também precisa do trabalho de outros personagens, como os líderes de governo no Senado (Jaques Wagner) e no Congresso (Randolfe Rodrigues).
“O papel do líder é muito importante nas votações, nas definições do placar nas votações no Congresso Nacional. Os líderes que orientam as posições de bancada e determinam como o partido deve votar. É fundamental que o presidente tenha uma articulação muito próxima junto às lideranças “, explicou Galvão.
Além disso, o papel dos ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Rui Costa (Casa Civil) é imprescindível para a governabilidade do presidente da República. Os ministros cuidam, respectivamente, da relação entre Executivo e Legislativo e da liberação de verbas a parlamentares.
Base instável e liberação de emendas
A pressão feita por deputados é motivada pela troca de favores: para garantir apoio em votações, parlamentares querem cargos no governo e agilidade na liberação de emendas parlamentares.
Em 2022, o país elegeu um grande número de deputados que se opõem ao atual governo. Com 99 deputados, o PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, tem a maior bancada na Casa Baixa. Além disso, siglas do Centrão não têm entregado votos, apesar de terem cargos no governo.
“A gente tem o bloco formado por partidos como União, PP, PCdoB, partidos de centro, com 174 parlamentares. Enquanto isso, a federação do atual governo tem 81 deputados. O que a gente vê é, não só pela oposição, é a dificuldade do governo de conseguir consolidar sua base”, explica a cientista política Camila Santos, da Universidade de Brasília.
Para tentar garantir a votação da MP da Esplanada, Lula autorizou, em um dia, a liberação R$ 1,7 bilhão em emendas. É o maior valor liberado pelo Palácio do Planalto em apenas um dia desde o início do terceiro mandato do presidente.
“Atualmente, a forma de dar cargos em ministérios não está adiantando. Isso não está se revertendo em votos na Câmara. O governo tem que rever a trajetória”, avaliou a especialista.