Criptomoedas viram investimento da moda, mas golpes minam mercado
Promessas de ganhos altos e fixos e empresas “de fundo de quintal” são principais riscos para os investidores desse novo nicho
atualizado
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Com a economia estagnada no Brasil e opções tradicionais de investimento, como a Bolsa de Valores, registrando perdas históricas, investidores brasileiros estão se sentindo cada vez mais atraídos para um mercado em rápido crescimento: o das criptomoedas. A esperança de ganhos vultosos com moedas digitais que chegam a valorizar mais de 100% em algumas horas, porém, pode se transformar no pesadelo de perder as economias nas mãos de golpistas se o investidor não tomar certos cuidados. O principal deles é saber se a corretora escolhida é uma empresa idônea.
Os valores que circulam no mercado das criptomoedas são expressivos. Em agosto, o Banco Central anunciou que os brasileiros já haviam investido, nos primeiros oito meses do ano, o equivalente a R$ 23,3 bilhões em moedas como o Bitcoin, a mais famosa delas.
O número corresponde a uma fatia do mercado, já que boa parte dos valores circula em ambientes que não são regulados pelas autoridades financeiras – e é aí que mora o perigo.
Em um relatório divulgado em julho deste ano, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) informou que golpes envolvendo criptomoedas correspondiam a 43% dos crimes financeiros relatados por investidores em 2020 e que esses crimes haviam subido 75% em relação ao ano anterior.
No mundo, golpes em investidores de criptomoedas roubaram US$ 7,7 bilhões neste ano, segundo relatório recente da empresa Chainalysis, especializada em dados em blockchain [tecnologia que registra as transações virtuais dos usuários]. O valor é 81% maior do que o que foi roubado dos investidores em 2020, segundo o mesmo relatório, chamado “Crypto Crime Report“.
O que são e como funcionam as criptomoedas?
São ativos digitais criptografados com base na tecnologia blockchain (cadeia de blocos), que é um sistema de registro de transações compartilhado pelos investidores. Cada bloco novo se conecta ao anterior em uma cadeia de validação, que é o que garante a existência real do dado.
Essas moedas foram pensadas para ser opções independentes de Estados nacionais para fazer transações financeiras. Seus enormes potenciais de aumento do valor, porém, fizeram com que essas moedas deixassem de ser usadas em lojas e serviços e se tornassem ativos voltados a investimentos, como são as ações negociadas nas bolsas.
Com o crescimento do mercado cripto, autoridades nacionais têm se apressado em tentar regular o que os criadores desse universo sonhavam em ver eternamente desregulado.
Este mês, por exemplo, a Câmara dos Deputados brasileira aprovou o Projeto de Lei 2303/15, que cria regras para o setor no Brasil e cria um órgão fiscalizador a ser implementado pelo Poder Executivo Federal, além de acrescentar no Código Penal um novo tipo de estelionato, atribuindo penas de quatro a oito anos de cadeia e multa para quem “organizar, gerir, ofertar ou distribuir carteiras ou intermediar operações envolvendo ativos virtuais, valores mobiliários ou quaisquer ativos financeiros com o fim de obter vantagem ilícita em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento”.
O PL ainda precisa ser apreciado pelo Senado, o que deve ocorrer no início de 2022.
As fraudes
Assim como o mercado de ações, o das criptomoedas é volátil e cada uma delas pode variar enormemente de cotação em poucos dias – ou até horas. Um dos golpes mais comuns que espreitam os investidores são corretoras que ignoram essa regra e oferecem ganhos fixos – e altos – aos investidores.
É o que ocorria, segundo as autoridades, com a empresa GAS Consultoria, que tem sede em Cabo Frio, na Região dos Lagos do Rio de Janeiro. A corretora oferecia ganhos fixos de 10% ao mês do valor investido e prometia devolver integralmente, depois de dois anos, o capital investido.
Para a polícia, tratava-se de um golpe do tipo pirâmide financeira, o que levou o fundador, o ex-garçom Glaidson Acácio dos Santos, conhecido como Faraó dos Bitcoins, a ser preso em 25 de agosto deste ano. Ele e mais 16 pessoas são réus por organização criminosa; operação de instituição financeira sem autorização; gestão fraudulenta; e emissão, oferecimento ou negociação irregular de valores mobiliários. Milhares de pessoas foram prejudicadas e não sabem se vão conseguir recuperar o que investiram.
As promessas de ganhos fáceis e, sobretudo, fixos, são enormes motivos para o investidor desconfiar, explica o advogado e economista Alessandro Azzoni, professor de Direito na Universidade Nove de Julho (Uninove) e Conselheiro Deliberativo da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
Empresas de fundo de quintal
“As criptomoedas podem sim produzir grandes ganhos aos investidores, mas não é simples e nem fácil. É preciso entender o mercado para conseguir se movimentar nele”, explica Azzoni em entrevista ao Metrópoles. “A minha principal dica é o investidor buscar empresas especializadas, idôneas e certificadas. Não dá para sair acreditando em empresas de fundo de quintal, aplicativos de companhias sem sede no Brasil, promessas vazias em geral”, completa ele.
As empresas idôneas, segundo Azzoni, são corretoras já estabelecidas no mercado, inscritas nos órgãos reguladores, como a CMV e o Banco Central. São, por exemplo, corretoras dos grandes bancos de varejos ou que já são conhecidas por intermediar investimentos na Bolsa de Valores.
“É preciso saber se a empresa tem CNPJ, se tem um capital social compatível com os valores que movimenta, se dá garantias. Essas empresas também são o melhor caminho porque elas têm profissionais preparados para interpretar o mercado e investir os recursos dos clientes em moedas mais sólidas. Esse tipo de investimento não pode ser uma aventura”, conclui o advogado.