Coronel Marcos, o super-herói dos animais que chegam em águas cariocas
Conhecido como “Coronel Pinguim”, bombeiro de 75 anos é famoso pelo resgate de aves e bichos marinhos que chegam ao litoral do Rio
atualizado
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Rio de Janeiro – O sonho de ser militar e dar mais segurança pra a família esbarrou em quatro reprovações no Exército brasileiro e em duas dispensas da Marinha do Brasil. Desistir, entretanto, é palavra desconhecida para Marcos Aurélio da Silva, o coronel Marcos, do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro, aquele que transformou determinação e a disciplina em 9,2 mil salvamentos humanos e mais de 5 mil pinguins nas praias da cidade, entre outros seres marinhos – como focas, leões do mar, golfinhos e baleias.
Famoso pelo resgate das aves, o oficial está aposentado e vê no filho, Marquinhos, a continuidade de seu legado. O herdeiro do coronel Marcos é subcomandante do Grupamento Marítimo de Botafogo, bairro da zona sul carioca, do qual o pai foi chefe durante 20 anos – e coordena todos os guarda-vidas da orla do Rio.
Personagem de mais de 3 mil matérias de jornal, todas catalogadas (recortadas, coladas em um caderno e fotografadas para serem arquivadas em um pen drive), “Coronel Pinguim”, como é carinhosamente conhecido no Rio de Janeiro, carrega com ele seu próprio museu. Nas lembranças, as emocionantes histórias de salvamentos difíceis.
“O pior deles é aquele em que há duas vítimas e vai cada uma para um lado diferente. Chamamos a situação de “a difícil escolha”. Uma vez, um rapaz que não sabia nadar se jogou no mar para tentar salvar uma mulher. Foi cada um pra um lado e tive que escolher. Salvei ele pela coragem dele. Quando cheguei na areia, Deus ajudou e um surfista tinha feito o salvamento da mulher. Alívio e emoção intensa”, lembra.
Para o coronel Marcos, marcam as situações em que, infelizmente, não é possível salvar todos os que estão em situação de risco. “Teve uma situação com três pessoas, todos novos. Consegui segurar duas delas. Me dói lembrar da cena daquele terceiro jovem afundando, sem ter como salvá-lo”, diz, emocionado, o militar.
Dos seus 75 anos, Marcos Aurélio Silva dedicou 33 anos de sua vida ao Corpo de Bombeiros. Depois, decidiu trocar o uniforme da corporação por um par de chinelos e pijamas, mas o amor pela natureza e pela profissão prevaleceu. Para manter seu elo, atualmente dirige o Clube dos Oficiais dos Bombeiros, na Barra da Tijuca, zona oeste da capital. Ao Metrópoles, coronel Marcos contou sobre a saudade dos tempos em que resgatava os animais.
“Não era tão fácil, mas foram mais de 5 mil pinguins resgatados. As aves chegavam às praias do Rio cansadas, vindas da Patagônia (na Argentina e no Chile), e acabavam se alimentando daquilo que encontravam. Em muitos casos, chegavam com espinhas de bagre na goela. Tratávamos com soro caseiro e levávamos os pinguins para o Zoológico de Niterói, na Região Metropolitana do Rio. De lá, conseguíamos que fossem transportados de carona, em contêineres, nos aviões da Força Aérea Brasileira, para o Rio Grande do Sul, de onde seguiam de navios da Petrobras para seus países de origem”, conta.
De acordo com o “comandante”, como é chamado por todos os vizinhos e amigos, todos os bichos receberam anéis numerados de identificação nas patas. “E nenhum deles voltou pra cá. Pelo menos, nunca resgatamos qualquer um que já estivesse com a identificação. Fico feliz”, revela.
De prontidão até durante o sono
Na madrugada de 22 de fevereiro de 1998, o oficial sentiu o edifício onde morava, o Palace II, na Barra da Tijuca, tremer e estalar enquanto dormia. Nesse momento, começava um dos episódios mais dramáticos de sua carreira e de sua vida. Naquela noite, a profissão encontrou sua vida pessoal e, mesmo com medo, foi ele quem percorreu os apartamentos do edifício de 22 andares alertando aos vizinhos que o prédio ia desabar.
A ação heroica durou uma hora e meia e, durante a evacuação do prédio, o comandante só desceu quando um engenheiro da Defesa Civil do Rio de Janeiro exigiu que ele saísse para dar as informações sobre as condições da construção.
“Ele mesmo sabia que não ia demorar. Me mandou sair. Eu tomei a situação nas mãos e dei missão a todos os vizinhos. Uma pena termos alguns que morreram, mas a maioria está viva. E ainda teve gente que achou que eu as estava agredindo, quando as impedi de entrar no condomínio. Logo em seguida, caiu tudo”, lamenta. Na tragédia, quatro pessoas dormindo no 20º andar e outras quatro que voltaram aos apartamentos para pegar pertences morreram.
Para o militar, sua história de dedicação e luta tem uma razão de ser: “Fui acolhido pela corporação no momento em que mais precisei na vida, e trabalhei muito para tentar, de alguma forma, retribuir o que ganhei. Hoje, vejo a mesma dedicação no meu filho, e sinto só orgulho. Mas tenho pena da minha esposa, que vai continuar com o coração apertado, agora por causa dele”, conclui.