Conselho indígena questiona Funai sobre adoção de crianças Yanomamis
Representantes jurídicos enviaram ofício após receber denúncias de que crianças de origem indígena estariam sendo retiradas dos pais
atualizado
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O Conselho Indígena de Roraima (CIR) enviou um ofício a autoridades ligadas aos direitos de povos indígenas após receber denúncias de que crianças da etnia Yanomami estariam sendo retiradas dos pais e encaminhadas para adoção. A organização questiona como esses processos estão sendo realizados, e pede providências em caso de irregularidades.
No texto, o CIR o aponta que recebeu informações de que crianças indígenas da comunidade, ao chegarem às cidades em busca de atendimento médico, estariam sendo encaminhadas para processos de adoção, e questiona se essa decisão está ocorrendo em conformidade com a lei.
O documento foi enviado nessa segunda-feira (30) para Funai, Ministério Público, Vara da Infância, secretarias de Saúde e do Trabalho de Roraima, ao Conselho Tutelar do estado, a um hospital e abrigos infantis.
Segundo Junior Nicacio, coordenador do departamento jurídico do CIR, a associação foi informada de que meninas e meninos da etnia Yanomami estariam sendo retiradas das famílias e abandonadas em abrigos, aguardando uma família adotante.
“Nós últimos quatro anos, recebemos denúncias de que crianças indígenas foram retiradas das suas famílias para adoção. Entre eles, o caso de uma menina indígena, que os pais estão há 4 meses em Roraima tentando entender porque ela foi retirada da aldeia e do vínculo familiar”, explica Nicacio ao Metrópoles.
De acordo com ele, o CIR foi informado que, no momento, duas crianças estão em processo de adoção, e cinco se encontram em acolhimento em instituições de Boa Vista. “Queremos entender se esse processo de adoção levou em consideração o direito de povos indígenas, e se o processo respeitou as normas para ocorrer legalmente”, explica.
Respeito à legislação
A Lei 2.010 de 2009, que dispõe sobre a adoção no país, inclui obrigatoriedades específicas no caso de crianças indígenas ou descendentes de quilombolas.
São eles: o respeito à identidade cultural e social; a priorização de colocação do menor no seio de sua comunidade, ou que a adoção ocorra por membros da mesma etnia da criança. Também é necessário o acompanhamento da Funai e de antropólogos da equipe judicial.
“Muitas dessas crianças não falam bem português, assim como as famílias. A denúncia que chegou para nós é que crianças Yanomamis chegaram nos abrigos, e não estão recebendo atendimento adequado. Porque essas crianças foram adotadas? A comunidade e os pais têm conhecimento disso?”, frisa Nicácio.
No texto, o CIR solicita “informações sobre projetos, medidas e ações tomadas pelos órgãos para atendimento às crianças dos povos Yanomamis, separadas ou desacompanhadas, e quais são os procedimentos adotados quando é constatado que uma criança está em situação de vulnerabilidade”.
Abrigo definitivo
Procurado pelo Metrópoles o governo do estado informou, em nota, que “todas as crianças e adolescentes que dão entrada nas unidades de acolhimento seguem o protocolo e são encaminhadas pelo Conselho Tutelar, via Vara da Infância”.
O governo de Roraima informa que no abrigo Infantil, no momento, há seis crianças indígenas Yanomamis, com idades de 6, 7 e 12 anos, além de três bebês: de 1 ano e 3 meses, 1 ano e outro de 6 meses. Quatro delas estão no abrigo de forma definitiva e duas chegaram recentemente. Segundo o governo, nenhuma criança aguarda o processo de adoção.
“Quando se trata de abandono, maus-tratos e vulnerabilidade, o Conselho Tutelar junto a Justiça, após análise do caso, expede uma guia de acolhimento Institucional para dar entrada nas Unidades de Acolhimento com a devida determinação Judicial. Após isto, segue os protocolos normais nas unidades de acolhimento e, caso ocorra a adoção, esta é feita via autorização judicial”, diz o comunicado.
Em nota, o ministério Público de Roraima (MP-RR) confirmou ter recebido a informação, mas explicou que a “questão da adoção de crianças é assunto do MP do estado, sendo o processo tratado no Tribunal de Justiça. “No entanto, o MPF estuda as informações e analisará se cabe alguma atuação complementar”.
A reportagem entrou em contato com a Funai, mas não obteve resposta até a publicação. A Coordenadoria da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça de Roraima informou que identificou cinco indígenas Yanomami em acolhimento institucional “e dois processos de adoção em tramitação”.