Comércio espera Black Friday melhor, mesmo com inflação e pandemia
A data de promoções costuma gerar grande movimentação da economia. Expectativa para este ano, mesmo com efeitos da pandemia, é alta
atualizado
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Faltam poucas semanas para uma das datas mais esperadas por quem adora fazer compras: a Black Friday. A sexta-feira de descontos, concentrada inicialmente em ofertas on-line, foi realizada no Brasil pela primeira vez em 2010. Desde então, o evento comercial nascido nos Estados Unidos segue ganhando popularidade no país. Em 2021, o evento promocional está marcado para 26 de novembro.
Nem a inflação nem os efeitos da pandemia, que seguem impactando o cotidiano do país, impedem otimismo do comércio com a data neste ano.
Presidente da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB), George Teixeira Pinheiro acredita que, mesmo com a alta na inflação, os empresários conseguirão proporcionar preços dignos de Black Friday e que consumidores aproveitarão as promoções. “A nossa expectativa é de que as vendas em 2021 superem os números alcançados no ano passado, e isso não apenas na Black Friday, mas também no Natal, que é uma das principais datas para o comércio brasileiro”, diz.
“É fato que a alta nos preços e todos as consequências econômicas que a pandemia nos trouxe vão ainda causar, sim, algum impacto no comércio por alguns meses. Mas mesmo diante disso as empresas têm se mostrado muito mais otimistas este ano do que ano passado, quando ainda existiam muitas incertezas sobre quando a pandemia seria controlada e o comércio poderia voltar a funcionar normalmente”, explica Pinheiro.
“É evidente que os descontos, seja por qual motivo for, talvez não sejam tão generosos como acontecia em anos anteriores, mas eles certamente não deixarão de existir. E a população, hoje muito mais segura de sair às ruas em função do avanço na vacinação contra a Covid-19, não deve deixar passar boas oportunidades para a compra de itens que já estejam no seu radar”, salienta o presidente da CACB.
O Relatório de Mercado Focus mais recente previu o oitavo aumento seguido da projeção sobre a inflação do país para 2021. De janeiro a setembro deste ano, o indicador cresceu 6,9%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e deve se aproximar dos dois dígitos no fim do ano. Ou seja, os produtos que estão no radar dos consumidores estarão mais caros em comparação com o ano passado.
A coluna mBuzz revelou, segundo dados da consultoria Ebit|Nielsen, que apenas o e-commerce foi responsável pela movimentação de R$ 3,1 bilhões no dia da Black Friday de 2020. Este ano, segundo pesquisa da agência brasileira especializada em experiência do usuário e marketing de performance Conversion, cerca de 87% dos entrevistados devem aderir às promoções.
A forma mais fácil para encontrar descontos, para 65% dos entrevistados pela Conversion, será acessar sites de suas marcas prediletas. Os consumidores pretendem investir entre R$ 500 e R$ 1.000 para comprar, prioritariamente, presentes de Natal, como celulares, eletrônicos e eletrodomésticos, itens de moda e calçados.
A assessora de imprensa Victória Fernandes, de 26 anos, diz que está ansiosa para adquirir um produto que deixou de comprar na Black Friday do ano passado. “Já separei um limite extra no cartão para conseguir aproveitar bem. No ano passado, consegui um bom desconto na compra de um Kindle, na internet, e lembro que o Echo Dot da Alexa também estava com um preço bom, mas acabei não comprando na época e me arrependi. Desde então espero a próxima Black Friday para fazer a compra, e espero obter bons descontos novamente”, conta.
Temor
Existem, no entanto, consumidores que, por toda a situação relacionada à pandemia e à inflação, não se sentem confortáveis para ir às compras no próximo dia 26 de novembro. É o caso da jornalista Laísa Lopes, que almejava um produto, no entanto, não acredita que as promoções compensarão.
“Esse ano eu queria comprar uma Air Fryer durante a Black Friday, mas observando a alta na inflação e em produtos eletrodomésticos, acredito que não vai ter desconto nesse produto e não valerá a pena adquirir. Outro fator que me fez desistir, é porque quando chega próximo a Black Friday, as empresas encarecem os produtos e no dia da ação elas reduzem o preço para o valor original, enganando o consumidor. Ano passado eu adquiri roupas na Black Friday, mas de um site internacional, porque não achei que estava valendo a pena as promoções no Brasil”, conta a jovem.
O economista Benito Salomão avalia que, sem dúvida, a Black Friday será afetada pela alta dos preços. Segundo ele, a inflação está duplamente acima da meta. “É preocupante que ela esteja nesse nível, extremamente elevado, e o que a gente vê é que o país está sem âncora para poder domar essa alta. O descontrole das políticas macroeconômicas, tanto a fiscal quanto a monetária, impõe uma situação absolutamente disfuncional”, detalha.
“A inflação funciona na renda das famílias como um imposto indireto, atua diminuindo a renda disponível das famílias e isso vai afetar, sem dúvida nenhuma, o consumo. Aquele orçamento que as famílias dedicariam para o consumo estará comprometido com itens básicos, como alimentação e aluguel”, completa.
Não apenas o Índice de Preços no Consumidor (IPCA) cresceu, mas também houve alta no Índice Geral de Preços do Mercado (IGPM), imposto que baliza os aluguéis. “Isso também acaba afetando o poder de compra das famílias. Além da Black Friday, a inflação também afetará o Natal e todo o consumo de fim de ano, que geralmente responde ao varejo como 20% a 25% das vendas anuais”, finaliza o economista.
Atenção às fraudes
O especialista em segurança pública e privada Leonardo Sant’Anna explica que os riscos de fraudes aumentam na Black Friday, tanto por comportamento desatento dos consumidores em relação a itens quanto devido à baixa qualidade de informação em sites, que é onde ocorre a maioria das compras, ou mesmo de descuido com medidas básicas de proteção contra fraudes.
“Existe a ausência de uma cultura de segurança das pessoas, que passaram a comprar muito mais na internet. Ou seja, eu compro muito mais e me protejo muito menos e, nessa linha, é como se eu passasse a andar muito mais no meu carro, mas não investisse na manutenção dele. Então, o mesmo comportamento acaba ingressando nesse meio digital, mas os riscos são maiores”, diz o especialista.
Sant’Anna defende que haja um comportamento preventivo de quem pretende fazer compras on-line, porque é fácil ser vítima de clonagem de sites e páginas de compra. “Depois do crime acontecido, existe uma pena muito branda e uma flexibilização muito grande do cumprimento [das obrigações]. Isso tem a ver com aquela pessoa que pensa que vale a pena cometer o crime, mesmo que seja pega em qualquer momento, porque ela pensa que a pena não será tão alta e não terá tanta perturbação”, explica.
“Hoje isso é uma realidade, e por quê? A gente tem uma profissionalização do criminosos digitais, e não é fácil rastrear pessoas quando esse tipo de delito é cometido, e muitas vezes nem se sabe onde esses sites estão hospedados”, finaliza.
O psiquiatra e pesquisador da Universidade de Brasília (UnB) Luan Diego Marques afirma que o cuidado deve ser redobrado em épocas de alto consumismo, porque as pessoas ficam muito vulneráveis.
“As pessoas podem interpretar a Black Friday, frente a um país que tem custos elevados, como uma grande oportunidade para ter um melhor investimento das suas rendas. Isso configura um perigo, porque as pessoas ficam mais vulneráveis a serem enganadas”, diz o psiquiatra.
De acordo com o especialista, também, pode-se dizer que a pandemia e a situação de privação que o país foi exposto ao longo de quase dois anos em decorrência da pandemia da Covid-19 são fatores determinantes para o aumento do consumismo. “O consumismo aumentou porque o contato com os meios digitais colocam esse indivíduo numa maior conexão com as ofertas. A gente sabe que existe toda uma neurociência ligada ao desejo, então as pessoas tentam compensar suas angústias através de desejos, e se tornam mais vulneráveis nesse processo”, finaliza Marques.