Com sistema sob pressão, Goiás chega a 9 mil mortes pela Covid-19
Em alguns momentos dessa segunda-feira (8/3), a rede estadual de saúde de Goiás operou com apenas dois leitos de UTI disponíveis
atualizado
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Goiânia – Na segunda-feira do que seria o feriado de Carnaval deste ano (15/2), Goiás atingiu 8 mil mortes por Covid-19. Naquele fim de semana, apesar do cancelamento do feriado e da folia em pontos turísticos do estado que costumam atrair grande público nessa época, muitas festas clandestinas, “encontrões” religiosos e aglomerações diversas foram registradas por equipes de fiscalização.
As unidades de terapia intensiva (UTIs) operavam em torno de 90% na rede estadual de saúde e oscilavam na casa dos 80% na rede municipal de Goiânia. Vinte e um dias depois, nessa segunda-feira (8/3), Goiás não só atingiu as 9 mil mortes por Covid-19 como viveu o pior momento da pandemia, com recordes dos índices de ocupação das UTIs, desde o registro da primeira morte, em 26 de março do ano passado.
Em alguns momentos, durante a tarde, apenas dois dos 429 leitos de UTI para tratar pacientes com Covid-19 estavam disponíveis nos hospitais regulados pelo estado. O índice de ocupação ultrapassou os 99%, situação semelhante a vivida pelos leitos da rede municipal de Goiânia na tarde de sábado (6/3) e, novamente, na tarde dessa segunda. Na mesma hora, chegava a confirmação: 9.012 mortes em Goiás.
Falar em ultrapassar a barreira das 9 mil mortes, no estado, é o mesmo que falar em um número maior que a população da maioria das cidades goianas. Dos 246 municípios que fazem parte de Goiás, 143 têm população menor que 9 mil, ou seja, 58,1% do total de cidades. Para cada uma delas, 9 mil mortes seriam como se toda a comunidade local fosse extinta.
Entre essas cidades, estão, por exemplo, Alto Paraíso de Goiás, na Chapada dos Veadeiros, que tem população estimada de 7.688 pessoas, e Rio Quente, nas imediações de Caldas Novas, cuja população é composta por 4.612 habitantes. Ou mesmo Abadia de Goiás, que fica na região metropolitana de Goiânia e tem 8.958 habitantes, de acordo com projeção do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Colapso
Entre a segunda-feira de Carnaval e a segunda-feira desta semana, a diferença significativa não se mostrou apenas nos números da pandemia. O discurso das autoridades goianas também mudou. A palavra “colapso” passou a ser utilizada, diante da falta de leitos, tanto de enfermaria quanto de UTI, que já colocam 300 pessoas em lista de espera no estado.
“Caminhamos para o colapso”, disse o secretário de Saúde de Goiânia, Durval Pedroso, na tarde dessa segunda. “Faltam profissionais (de UTI). Os que estão em campo estão estafados”, afirmou o governador Ronaldo Caiado (DEM), durante reunião com prefeitos no sábado (6/3), que decidiu pela continuidade do fechamento do comércio em Goiânia e região metropolitana.
“Estou desesperada”, expressou Wilsonete Rodrigues Ferreira ao Metrópoles. O marido dela está no aguardo de um leito de UTI há mais de uma semana, em Inhumas. Na sexta-feira (6/3), além dele, outros 10 em estado grave e que precisavam de UTI recebiam tratamento em leitos semi-intensivos e improvisados pelos profissionais de saúde locais. O promotor da cidade, Mário Caixeta, foi à Justiça para tentar resolver o caso.
Fosse hoje o colapso do sistema de saúde de Manaus (AM), por exemplo, como ocorreu em janeiro, Goiás não conseguiria prestar ajuda e oferecer leitos de UTI para pacientes do Amazonas como fez até o mês passado. Ao todo, 48 pessoas em estado grave foram transferidas de Manaus para hospitais de Goiânia e Aparecida de Goiânia.
Interiorização do vírus e transmissão comunitária
Cidades menores, sem leitos de UTI nas unidades locais de saúde, já sentem bem os efeitos da dificuldade para encaminhar pacientes, pois dependem de vagas em municípios maiores. Apesar da tentativa de regionalização do serviço e da abertura de Hospitais de Campanha (HCamp) em locais estratégicos, a lotação dos chamados polos de saúde já inviabiliza o tratamento adequado de alguns pacientes.
Em Goiânia, o principal HCamp do estado, com 100 vagas de UTIs, está com 100% das vagas ocupadas há semanas. Em Luziânia e Formosa, no Entorno do Distrito Federal, o mesmo se repete nas unidades de referência. E tem sido assim na maioria dos hospitais regulados pela Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO). É o tempo de abrir novos leitos, e eles logo são ocupados.
O temor expressado por Ronaldo Caiado no dia 15 de fevereiro, quando Goiás bateu as 8 mil mortes, mostra-se verossímil. A transmissão de novas variantes do vírus (inglesa, africana e brasileira) já ocorre de maneira comunitária no estado, numa velocidade maior do que a registrada durante a chamada primeira onda da pandemia.
Luto várias vezes por dia
Como consequência, as redes sociais acabam sendo um termômetro da situação. Notícias de luto e mortes de novas vítimas da Covid-19 não param de chegar. Nesse domingo (7/3), a Polícia Civil de Goiás (PCGO), que já registrou 554 casos da doença entre os policiais, sofreu a oitava perda do efetivo ocasionada pela pandemia.
A agente Sara Cardoso da Silva, de 40 anos, morreu na madrugada em um hospital particular de Goiânia, depois de passar dois dias intubada na UTI. Colegas organizaram cortejo em homenagem a ela nesse domingo. Antes, dois delegados e um agente morreram em um intervalo de três dias.
As notícias têm sido assim: em curto intervalo de tempo, várias mortes e, às vezes, numa mesma família. Foi o que aconteceu, por exemplo, na casa do vereador de Goiânia Nataniel de Senna Soares, o Cabo Senna (Patriota). Ele perdeu o pai, a mãe e o irmão mais velho em menos de 10 dias. Outras seis pessoas da família tiveram a doença.
“Em dado momento, achei que eu fosse perder toda a minha família”, disse o vereador em entrevista ao Metrópoles.
Veja o relato: