Com Bolsonaro, disparam concessões de passaportes diplomáticos
Governo federal já liberou 67% do volume total de documentos do tipo em relação a 2018. Neste ano, foram mais de 800 concessões
atualizado
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Em menos de quatro meses de governo, a atual gestão do Ministério das Relações Exteriores (MRE) já concedeu 67% de todo o volume de passaportes diplomáticos registrados ao longo do ano passado. Levantamento realizado pelo Palácio do Itamaraty, a pedido do Metrópoles, revela que, até 17 de abril, 849 documentos especiais foram emitidos nestes quatro primeiros meses. Em todo o ano de 2018, o total chegou a 1.267.
No clã Bolsonaro (veja abaixo), somente o filho vereador do presidente, Carlos (PSC-RJ), não possui esse passaporte. Ele chegou a pedir o documento, mesmo sem atender aos pré-requisitos. Já o filho senador, Flávio (PSL-RJ), e o filho deputado, Eduardo (PSL-SP), receberam a autorização para o uso. O presidente e a primeira-dama, Michelle, tiveram os seus passaportes especiais emitidos em 21 e 27 de fevereiro, respectivamente. O vice-presidente da República, general Hamilton Mourão (PRTB), recebeu o dele em 17 de janeiro.
A reportagem teve acesso à lista completa dos beneficiados. Sob o comando do presidente Jair Bolsonaro (PSL), o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, autorizou a emissão de passaportes para deputados, senadores, ministros, governadores, ex-integrantes do alto escalão do governo e até religiosos (veja artes abaixo). A validade dos documentos é de cinco anos.
Nomes conhecidos dos brasileiros, como os dos parlamentares Aécio Neves (PSDB-MG), Alessandro Molon (PSB-RJ), Bia Kicis (PSL-DF), Erika Kokay (PT-DF), Kim Kataguiri (DEM-SP) e Carla Zambelli (PSL-SP), entre outros, aparecem entre os agraciados.
No rol de governadores, conseguiram o documento Ibaneis Rocha (MDB-DF), Rui Costa (PT-BA), Reinaldo Azambuja (PSDB-MS), Ronaldo Caiado (DEM-GO), Renan Filho (MDB-AL) e Eduardo Leite (PSDB-RS).
Ibaneis Rocha justificou, em nota, o uso do documento. “Todo governador tem direito a passaporte diplomático. Todos”, resume o texto, enviado pela assessoria de imprensa do Governo do Distrito Federal. O chefe do Palácio do Buriti esteve em Portugal no último mês. O passaporte diplomático dele foi emitido antes disso, em 13 de fevereiro, segundo o Itamaraty.
No Senado, além de Flávio Bolsonaro – que acompanhou o pai na missão oficial a Israel, em março (foto do embarque em Brasília em destaque) –, os senadores Marcos do Val (Cidadania-ES), Ciro Nogueira (PP-PI), Humberto Costa (PT-PE), Cid Gomes (PDT-CE), Paulo Paim (PT-RS), Jaques Wagner (PT-BA) e Jean-Paul Prates (PT-RN) tiveram o documento de viagem especial emitido neste ano.
Crescimento é normal, diz Itamaraty
O alto volume de emissões, segundo o Palácio do Itamaraty, é normal. Em nota, o órgão da diplomacia brasileira justificou os números. “Em início de governo, é normal haver incremento na emissão”, destaca o texto. A título de exemplo, em 2017 foram concedidos 1.312 passaportes diplomáticos, contra os 849 só nos primeiros quatro meses deste ano.
Integrantes do segundo escalão do governo também receberam o documento. São exemplos: Marcos Prado Troyjo, secretário especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais; Maurício Leite Valeixo, diretor-geral da Polícia Federal; o comandante do Exército, general Edson Leal Pujol; Joaquim Levy, presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); e Luiz Antonio Nabhan Garcia, secretário de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura.
Os ex-ministros Gustavo Bebianno, da Secretaria-Geral da Presidência da República, e Ricardo Vélez Rodríguez, da Educação, também tiveram o uso desse passaporte autorizado. Assim como: o ex-ministro das Relações Institucionais e da Saúde, e atual deputado federal, Alexandre Padilha (PT); o ex-presidente do Banco Central Ilan Goldfajn; e o advogado José Paulo Sepúlveda Pertence, que defendeu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A reportagem questionou o Palácio do Planalto e o Itamaraty, sem ainda ter recebido respostas, sobre a continuação da validade dos passaportes dos ex-ministros Bebianno e Vélez Rodríguez. Por telefone, Bebianno não quis dar entrevista. A reportagem não localizou Vélez.
Edir Macedo no centro da polêmica
Recentemente, a concessão de passaportes diplomáticos para do líder da Igreja Universal do Reino de Deus, bispo Edir Macedo (foto abaixo), e sua esposa, causou polêmica. O caso foi parar na Justiça. Para o Itamaraty, a atividade religiosa justifica o uso do passaporte. O documento, no entanto, acabou suspenso.
O passaporte diplomático, de cor vermelha, é dado a pessoas que representam o “interesse do país” em missão no exterior. Dá ao portador privilégios, como atendimento preferencial nos postos de imigração e isenção de visto em alguns países. Diferentemente do documento comum, emitido pela própria Polícia Federal, o diplomático é confeccionado diretamente pelo Palácio do Itamaraty.
O decreto que estabelece as normas e as diretrizes para concessão de passaportes diplomáticos permite a liberação do documento para 12 tipos de autoridades, como presidente, vice e ex-presidentes, ministros, governadores, parlamentares, diplomatas, militares em missões, entre outros.
Dilma mudou regras
Em 2011, o Ministério das Relações Exteriores vivenciou uma crise após passaportes diplomáticos serem expedidos para dois filhos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e para o bispo evangélico Romualdo Panceiro, da Igreja Universal do Reino de Deus, a pedido do então senador e hoje prefeito do Rio, Marcelo Crivella (PRB).
Na época, a então presidente Dilma Rousseff (PT) endureceu as normas para evitar a concessão abusiva do benefício e publicou uma nota normativa. Desde então, o passaporte diplomático só é expedido depois que “a autoridade máxima do órgão competente do requerente encaminhe solicitação formal e fundamentada”.
Entre as exigências para a autorização estão a explicação do objetivo da missão e seu período, cidade para a qual o requerente viajará e tipo de vínculo com a administração pública, se é ocupante de cargo comissionado ou sem tem outro vinculação com o serviço público.