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“Chance de me reconhecer”: mutirão opera pessoas trans e muda vidas

Hospital realizou 12 cirurgias: 8 mastectomias para homens trans e 4 mamoplastias, com colocação de prótese mamária, para mulheres trans

atualizado

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Divulgação/HGG
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1 de 1 imagem colorida pacientes cirugia trans hgg goias - Foto: Divulgação/HGG

Goiânia – No último dia 28 de junho o mundo celebrou o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+. Para enaltecer a data, o Hospital Geral de Goiânia (HGG), por meio do Serviço Transexualizador – Ambulatório TX, realizou um mutirão de cirurgias para que pacientes realizassem o desejo de se identificarem com a sua real essência.

A unidade de saúde promoveu 12 cirurgias, sendo oito mastectomias para homens trans e quatro mamoplastias, com colocação de prótese mamária, para mulheres trans. Conforme dados do próprio hospital, atualmente, 37 usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) aguardam procedimento de mamoplastia, e 35, mastectomias.

Além das cirurgias em si, o compromisso do hospital também envolve a promoção de saúde, igualdade e respeito entre todas as pessoas.

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Para ele, a realização da cirurgia foi a realização de um sonho
Eduardo Araújo, de 36 anos, foi operado durante o mutirão de cirurgias no último dia 28 de junho
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John Maia foi o primeiro paciente operado no programa TX

Arquivo pessoal/John Maia
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Para ele, a realização da cirurgia foi a realização de um sonho

Arquivo pessoal/Eduardo Araújo
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Eduardo Araújo, de 36 anos, foi operado durante o mutirão de cirurgias no último dia 28 de junho

Divulgação/HGG

“Chance de me reconhecer”

O vendedor Eduardo Araújo de Jesus, de 36 anos, foi um dos pacientes operados durante o mutirão realizado pelo HGG. Segundo ele, a cirurgia foi a realização de um sonho. “Estou recém-operado, me recuperando em casa. Ter conseguido fazer a cirurgia foi a realização de um sonho. Faço tratamento no Ambulatório TX há três anos e foi nesse lugar que encontrei o acolhimento necessário para me conectar com quem eu sou verdadeiramente”, disse ele ao Metrópoles.

“Desde muito novo, sempre me identifiquei como um homem trans, apesar disso entrei no processo transexualizador muito tarde. Aguardei por mais de um ano, em uma fila de espera, para ser chamado para o programa, porque estava na época da pandemia. Nesse período eu busquei conhecimento, pesquisei muito, ouvi histórias de outras pessoas que já haviam passado pelo processo. Eu queria me sentir seguro, queria que o processo fosse confiável”, ressaltou.

Segundo Eduardo, ele nunca se reconheceu em um corpo feminino e, por isso, a busca era constante para se encontrar. “Eu recebi apoio da minha esposa, dos meus familiares e fui me reconhecendo como Eduardo cada vez mais, para além da alma, que já era masculina. Tive a chance de me reconhecer”, lembrou.

Mesmo após a cirurgia de mastectomia, ele conta que deve seguir em tratamento na unidade de saúde. “O acompanhamento é bem completo e continua depois da cirurgia, porque temos demandas psicológicas, psiquiátricas, ginecológicas. O ambulatório se tornou uma segunda família para mim. Tenho acompanhamento com uma psicóloga maravilhosa, que ajuda a gente a ser fortalecer para passar por esse processo, para enfrentar os medos e traumas da sociedade, temos uma grande rede de apoio, com pessoas de excelência”, reforçou o paciente.

“O TX é um projeto maravilhoso, que atende as demanda das pessoas trans e resgata vidas. Nós somos acompanhados por ótimos profissionais, lá é um local de escuta. No começo do tratamento a gente se sente muito perdido e lá encontramos suporte. A gente pode ser o que a gente realmente é”, finalizou.

Ato de liberdade

O produtor cultural e estudante de Serviço Social John Maia, de 41 anos, foi a primeira pessoa operada pelo TX, em 2017. Para ele, a cirurgia representou liberdade. “A cirurgia foi um ato de liberdade, eu nunca tive um momento feminino, sempre me vi como sou hoje: esse homem barbado. Quando passei pela mastectomia, realizei o meu sonho de ser eu! Afinal, eu sempre fui assim, essa sempre foi a imagem que eu tinha de mim mesmo. É libertador ser eu mesmo”, destacou.

Apesar da dificuldade de ingressar no projeto, o local se tornou referência para ele. “Esse é o local de referência para as pessoas trans em Goiás, seguro para a transição, com acompanhamento completo e correto. Até hoje me consulto com psicólogo, psiquiatra, ginecologista, além de outras especialidades. É um processo longo e difícil, porém, vale a pena. Hoje eu consigo me olhar no espelho e estar feliz comigo mesmo”, completou ele.

Centro formador

De acordo com o diretor técnico do Serviço Transexualizador do HGG – Ambulatório TX, Guilherme Carvalho de Sousa, o programa teve início em setembro de 2017 e, desde então, já foram realizadas mais de 140 cirurgias, sendo que 47 delas foram de redesignação sexual.

Segundo ele, atualmente, 717 pacientes estão em acompanhamento clínico na unidade de saúde e cerca de 387 pessoas aguardam em uma fila por uma consulta inicial. Até o final do mês de maio, o programa já havia realizado mais de 13 mil atendimentos.

Guilherme reforça que o serviço oferecido pelo programa inclui atendimento clínico multiprofissional, além das cirurgias. Para ter acesso o paciente tem que se consultar em uma unidade básica de saúde (UBS), demonstrar o interesse pelo programa e ser cadastrado na Central Estadual de Regulação.

A partir disso, ele pode ser chamado para uma primeira consulta no TX.

Ele explica que, antes de passar pela cirurgia, o paciente tem que cumprir ao menos dois anos no programa. “Nem todos que participam têm desejo de cirurgia, alguns mudam de ideia quando ganham empoderamento, tratamento clínico com hormonioterapia, por exemplo”, detalha.

“O Ambulatório TX tem uma importante relevância, porque a gente trata o ser humano no seu aspecto como um todo, saúde é um direito de todos. No caso do programa, estamos falando de pessoas que não se reconhecem no corpo em que nasceram e, por isso, vão precisar passar por algumas mudanças corporais para que consigam o reconhecimento de si mesmos e tenham o empoderamento necessário. O bem-estar precisa ser físico e psicossocial. Aqui, a gente reconhece as minorias, com o potencial de cuidado dado às maiorias, para que sejam tratadas igualmente em todos os aspectos”, enfatiza Guilherme.

Para ele, o programa tem evoluído ao longo dos anos. “Estamos evoluindo. Hoje, o HGG está se tornando um centro formador, que vai passar a receber equipes externas para que haja capacitações e a formação de novos centros. Acho que atualmente nós temos 5 centros no país que fazem isso, o HGG é um deles. Com isso, a gente consegue atender um número maior de pessoas que precisam desse tipo de tratamento”, completou o diretor.

População cada vez maior

Apesar da falta de dados oficiais, uma pesquisa realizada em 2021 pela Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (FMB/Unesp) mostrou que 2% da população adulta brasileira é formada por pessoas transgênero ou não binárias. Em números absolutos, isso significa cerca de 3 milhões de indivíduos.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) deve divulgar, no último trimestre deste ano, as primeiras estatísticas sobre a população trans, travesti e não binária no país, resultado da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS), que começou no ano passado.

Até 2022, a população trans não havia sido considerada nos levantamentos oficiais. O levantamento divulgado naquele ano, inclusive, foi considerado o primeiro a trazer oficialmente o tema da sexualidade à tona. Porém, recebeu diversas críticas de especialistas, por não abordar identidade de gênero.

A ausência de dados impacta diretamente na criação de políticas públicas e nas ações afirmativas que contemplem essas pessoas, por isso há a demanda da sociedade civil e das organizações e iniciativas que atendem e dão auxílio a essa parte da população.

Transgênero (trans) é o indivíduo que não se identifica com o gênero que lhe foi atribuído ao nascer. É importante lembrar que a transgeneridade não é doença ou distúrbio psicológico.

Conforme as convenções sociais tradicionais, existiriam dois gêneros: masculino e feminino, e a identidade de gênero estaria ligada exclusivamente ao sexo biológico das pessoas.

 

 

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