Chacina de família de ambientalistas no Pará completa 6 meses impune
Zé do Lago, Márcia e Joana Nunes foram mortos a tiros no mês de janeiro em São Félix do Xingu. Ribeirinho protegia tartarugas da região
atualizado
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Um crime brutal acabou com uma família inteira no interior do Pará no início de janeiro deste ano. O ativismo ambiental de José Gomes, de 61 anos, o Zé do Lago, foi apontado como um dos possíveis motivos para a violência, que também ceifou a vida de sua companheira, Márcia Nunes Lisboa, de 39, e da filha dela, Joane Lisboa, de apenas 17 anos (imagem em destaque).
Quase seis meses após o triplo homicídio, porém, ninguém foi preso ou indiciado, o inquérito policial não foi concluído e quase nada se sabe sobre o caso.
“Esse caso é exemplo de uma impunidade que é um dos principais combustíveis do quadro de violência que vemos na Amazônia hoje”, avalia Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, entidade que representa 73 organizações de defesa do meio ambiente.
“A impunidade impulsiona a pessoa que liga a motosserra, a pessoa que puxa o gatilho. E é impulsionada pela omissão do Poder Público, que se acentuou no governo Bolsonaro e deixou o crime mais poderoso do que nunca na Amazônia”, declara o ambientalista.
Crime sem castigo
Os corpos das três vítimas da chacina foram encontrados em 9 de janeiro na propriedade da família, na zona rural de São Félix do Xingu, município do sudeste paraense. De acordo com a Polícia Civil, eles já estavam mortos há pelo menos três dias quando foram encontrados. Foram achadas 18 cápsulas de munição na cena do crime.
A investigação foi assumida pela Polícia Civil do Pará e se mostrou complicada desde o início. As vítimas chegaram a ser sepultadas sem realização de perícia, o que só ocorreu em 16 de janeiro, ao menos 10 dias após as mortes, depois da exumação dos corpos ser determinada pela Justiça.
Os responsáveis pela investigação pouco falaram sobre o assunto. Semanas após os assassinatos, o delegado Cláudio Galeno Filho, da Delegacia de Homicídios de Belém, disse em uma entrevista que trabalhava com uma linha de investigação indicando para conflitos fundiários nos quais Zé do Lago teria se envolvido duas décadas antes de sua morte.
As declarações revoltaram parentes das vítimas, que chamaram a atenção, na época, para possíveis inimigos que o homem pode ter feito com suas atividades, muito mais recentes, de proteção a tartarugas que vivem na região, que o levava a fazer longas viagens para conscientizar ribeirinhos e povos indígenas das maneiras de proteger os animais aquáticos.
Procurada pelo Metrópoles nesta semana, a Polícia Civil do Pará foi econômica nas palavras e informou apenas que “o caso segue em investigação” e que “ressalta que está adotando todas as medidas cabíveis, dentro das suas atribuições, para elucidar o crime”, sem dar nenhuma previsão para o encerramento do caso.
A demora na apresentação de resultados chegou a motivar o Ministério Público Federal no Pará a cobrar informações da polícia local e ameaçar federalizar a investigação – o que jamais ocorreu. Procurado, o MPF informou à reportagem que segue acompanhando o caso, mas que não pode se pronunciar agora porque o procedimento é sigiloso.
Cobrança internacional
Ainda em janeiro deste ano, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e o Escritório Regional para a América do Sul de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) lamentaram os assassinatos de ativistas ambientais e defensores da terra no Brasil. Em documento, os órgãos convocaram o Estado brasileiro a “proteger” quem defende o meio ambiente e o território.
Os órgãos internacionais também pediram investigação “rápida, exaustiva e imparcial” de crimes ocorridos na região amazônica.
No comunicado divulgado à imprensa na época, a CIDH e o Escritório Regional da ONU avaliaram que casos recentes não representariam fatos isolados, mas um contexto de violência no Brasil contra as pessoas defensoras do meio ambiente e da terra. O conflito foi identificado no Relatório de País 2021, elaborado pela CIDH.
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