Cerrado perdeu 53% da superfície de água natural em 65 anos

A área de superfície de água natural no Cerrado registrada em 2023 foi de 696 mil hectares, representando 53% a menos do que o observado em 1985. Os dados, divulgados na terceira coleção do MapBiomas Água pelo Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), destacam uma crise que se agrava a cada ano.

Atualmente, embora o bioma possua 1,6 milhão de hectares cobertos por água – o maior valor registrado nos últimos 39 anos –, apenas 37% estão em áreas naturais, enquanto 51% são destinados a hidrelétricas.

No panorama nacional, a área total de superfície de água em 2023 foi de 18,3 milhões de hectares, marcando uma redução de 2,6% em relação ao ano anterior.

Essa diminuição contínua tem sido observada desde os anos 2000, com todos os meses de 2023 registrando áreas de água inferiores às de 2022 e nove meses abaixo de suas médias históricas.

Hidrelétricas e agropecuária são vilãs

Dhemerson Conciani, pesquisador do Ipam que trabalhou na elaboração dos dados, destaca o papel central do Cerrado para a agropecuária brasileira e a produção de energia elétrica, levando a um aumento de 390 mil hectares (89%) na superfície de água destinada aos reservatórios de hidrelétricas nos últimos 38 anos.

“Esse aumento afeta diretamente a ecologia dos ecossistemas aquáticos”, observa Conciani.

Perdas em outros biomas

A perda de superfície de água natural não é exclusiva do Cerrado. Em todo o Brasil, mais de 6 milhões de hectares de água em rios, lagos e veredas desapareceram, uma queda de 30% desde 1985.

 

 

Ver essa foto no Instagram

 

Uma publicação compartilhada por Metrópoles (@metropoles)

A bacia do Rio Paraguai, vital para o Pantanal, perdeu 565 mil hectares de sua área aquática média, aproximadamente 55% de sua extensão total.

“A redução severa na superfície de água da bacia do Paraguai resulta de um complexo conjunto de fatores, incluindo desmatamento, uso desordenado dos recursos hídricos, mudanças climáticas, erosão, sedimentação e crescimento urbano”, alerta Joaquim Pereira, outro pesquisador do Ipam.

Ele enfatiza a necessidade de uma abordagem integrada que inclua a conservação e recuperação da vegetação nativa, práticas agrícolas sustentáveis e uma melhor gestão dos recursos hídricos.

Outras cinco regiões hidrográficas brasileiras também registraram perdas significativas em 2023, somando 625 mil hectares ressecados, o equivalente a 1,08 vezes a área de Brasília.

Pantanal e Amazônia

O Pantanal, conhecido por suas extensas áreas alagadas, viu sua superfície de água reduzir para 381 mil hectares em 2023, 61% abaixo da média histórica.

A região, que costumava ter mais de 1 milhão de hectares de superfície aquática em 2001, agora enfrenta um ciclo natural prejudicado, com alagamentos ocorrendo por apenas dois meses ao ano, facilitando incêndios e afetando a fauna e flora locais.

Na Amazônia, a situação não é menos grave. Com 62% da superfície de água do Brasil, a seca severa de 2023 reduziu a área aquática em 5,2% em relação a 2022, resultando na perda de 3,3 milhões de hectares.

Além disso, a maior área hídrica destinada à mineração também se concentra na Amazônia, com cerca de 6 mil hectares de água represados pelo setor.

Estados e municípios afetados

O balanço de 2023 revelou que 10 estados brasileiros registraram superfície de água abaixo das suas médias históricas. Mato Grosso e Mato Grosso do Sul foram os mais afetados, com perdas de 274 mil e 263 mil hectares, respectivamente.

Em contrapartida, Goiás e Minas Gerais tiveram aumentos significativos, principalmente devido aos reservatórios de hidrelétricas. Entre os municípios, Corumbá, no Mato Grosso do Sul, foi o mais afetado, perdendo 261 mil hectares de água, 53% abaixo do esperado.

Nos últimos 40 anos, a cidade também sofreu com incêndios, perdendo cerca de 3,6 milhões de hectares para o fogo.