Ceará suspende devolução de terras em Jericoacoara a empresária
Procuradoria fará novas diligências para dar segurança jurídica ao procedimento. Suposta dona de 80% da vila receberia 4,9 hectares de volta
atualizado
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A Procuradoria-Geral do Ceará (PGE-CE) decidiu suspender, por tempo indeterminado, o acordo extrajudicial firmado com a empresária Iracema Correia São Tiago, que previa a devolução de terras no interior da vila de Jericoacoara, no litoral cearense, até que sejam feitas novas consultas e confirmações da documentação apresentada.
Após questionamentos de representantes da comunidade local, a PGE decidiu fazer novas diligências, ouvir outros órgãos e aprofundar a análise. O acordo extrajudicial previa a devolução de 4,9 hectares em áreas desocupadas no interior da vila.
Iracema passou a ser dona de três fazendas na região de Jericoacoara após se divorciar do marido, o industrial José Maria de Morais Machado. Documentações apresentadas por ela sugerem que a maior parte da vila fica dentro de uma dessas fazendas, mas o governo do Ceará arrecadou o terreno para promover a regularização fundiária, nos anos 1990, ignorando o caráter privado da propriedade.
Os advogados de Iracema alegam que houve uma sobreposição de títulos de propriedade, de forma que Iracema saiu prejudicada. Em julho do ano passado, ela entrou com requerimento junto ao governo do estado para obter o reconhecimento da propriedade e tentar recuperar, pelo menos, parte dos terrenos.
Ao final, após análise e reconhecimento inicial da autenticidade dos documentos, a PGE-CE propôs o acordo de devolver, apenas, terrenos desocupados, sem uso ou sem interesse público, equivalentes a 5% do total sobreposto. Iracema, que diz não querer prejudicar nenhum morador da região, aceitou a proposta.
Novas diligências
A decisão de suspensão do acordo pelo procurador-geral do Ceará ocorreu após despacho do procurador-chefe da Procuradoria do Patrimônio e Meio Ambiente (Propama), Marcus Claudius Saboia Rattacaso. No texto, ele aponta que o relatório do Núcleo de Engenharia da PGE sugeriu a adoção de novas providências, como:
– notificar o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para auxiliar na perícia cartorária sobre o registro do imóvel;
– oficiar a Superintendência do Patrimônio da União no Ceará (SPU) para se manifestar sobre o caso;
– oficiar o Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio) para se manifestar sobre o parecer referente à análise da cadeia dominial do imóvel, atestando se corrobora ou não com as conclusões apresentadas;
– e oficiar o Instituto de Desenvolvimento Agrário do Ceará (Idace) para reavaliar a cadeia dominial do imóvel.
Em nota divulgada nesta sexta-feira (1º/11), a PGE-CE explicou que o objetivo da suspensão “é garantir a segurança jurídica com relação ao andamento e conclusão do acordo extrajudicial”. A procuradoria antecipou, ainda, que já notificou os órgãos mencionados, assim como o Ministério Público Estadual (MP-CE) e o Ministério Público Federal (MPF).
O que diz a “dona” das terras?
Iracema já foi comunicada da suspensão do acordo. O Metrópoles entrou em contato com a defesa dela, que informou que a empresária está tranquila, diante da decisão, e que ela entende que tudo que for feito será para ratificar os direitos dela. Veja a íntegra da nota:
“A Sra. Iracema Correia São Tiago informa que está tranquila em relação a decisão da PGE de manter suspenso o acordo para novas verificações junto aos órgãos competentes, que já se manifestaram antes favoravelmente ao seu direito. Entende que tudo o que for feito para esclarecer os fatos ratificará seus direitos e dará mais segurança e transparência ao processo, independente do prazo para a finalização do acordo. Iracema salienta mais uma vez, que o acordo garante a manutenção de todos aqueles que já habitam e ocupam a Vila regularmente.”
“Acordo silencioso”, diz presidente do conselho comunitário
A presidente do Conselho Comunitário de Jericoacoara, Lucimar Marques, alega que o acordo foi firmado de “forma silenciosa”, sem a participação e conhecimento de todos os envolvidos ou atingidos por qualquer decisão. Os moradores defendem uma apuração completa e transparente do caso, com o devido mapeamento das terras pelos órgãos competentes.
“O Conselho foi peça fundamental para questionar as informações inconsistentes e assegurar que um processo mais transparente e participativo fosse instaurado. Nosso objetivo é garantir transparência e a retificação de qualquer irregularidade, sabe-se que as terras da família ficam no Córrego da Forquilha. Importante ressaltar que a comunidade de Jericoacoara possui uma história e uma relação estabelecida com o território, e o Conselho reitera seu compromisso em preservar esses laços e proteger os interesses legítimos dos moradores”, afirma ela.