Versões sobre ingerência de Bolsonaro na PF aumentam expectativa por vídeo
Ministro Celso de Mello, do STF, deu 48h para envolvidos no inquérito que investiga acusações de Moro a Bolsonaro opinarem sobre sigilo
atualizado
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Investigadores presentes na sessão que apresentou a íntegra do vídeo da reunião em que o presidente Jair Bolsonaro pressionou o então ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro para trocar o comando da PF no Rio de Janeiro viram no conteúdo fatos que consideraram muito graves. Segundo relatos que chegaram à imprensa, Bolsonaro deixou claro que queria mexer na PF para coibir o que chamou de “cerco” a seus familiares no estado. No entanto, ministros palacianos ouvidos nessa terça-feira (12/05) no inquérito que investiga as acusações de Moro sustentaram não se lembrar da pressão e citaram o que foi adiantado por Bolsonaro como defesa prévia: não estava falando da PF, mas da segurança de sua família.
As divergências aumentam a expectativa sobre a liberação ou não pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), da íntegra do vídeo. Na noite dessa terça-feira (12/05), ele intimou todos os envolvidos a opinarem sobre a manutenção ou não do sigilo em um prazo de 48 horas.
A fase de tomada de depoimentos no inquérito que tramita no Supremo deve terminar hoje, com a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) sendo ouvida pelos investigadores em Brasília. Ela foi envolvida no caso após Moro divulgar uma conversa na qual a parlamentar pede que ele aceite a substituição desejada por Bolsonaro na PF e espere uma indicação para vaga no STF.
Ao longo dessa terça-feira (12/05), após o vídeo ser apresentado pela manhã a investigadores e representantes da Advogacia-Geral da União, Procuradoria-Geral da União e ao próprio Moro, três ministros palacianos prestaram depoimento.
Todos minimizaram as falas de Bolsonaro na reunião de 22 de abril. O ministro Braga Netto (Casa Civil) disse que não ouviu o presidente mencionar a possível troca de superintendente na Polícia Federal do Rio durante a reunião.
“Que na reunião do conselho de ministro, ocorrida em 22 de abril de 2020, quando apresentado o Pró-Brasil, o presidente Jair Bolsonaro não chegou a se expressar sobre a substituição do superintendente da Polícia Federal do Rio de Janeiro, reservando-se a expressar a sua inquietude, como já dito, sobre os dados de inteligência”, registra o extrato do depoimento dele.
O ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, avaliou ser “natural” que o presidente queira uma pessoa “próxima” para estar à frente da Diretoria-Geral da PF.
“É fake news”, diz Bolsonaro
Em conversa com jornalistas, Bolsonaro adiantou a tese de sua defesa no episódio. Segundo ele, no vídeo não há, em momento algum, as palavras “Polícia Federal”, “investigação” ou “superintendência”. “Não tenho preocupação nenhuma com a PF. Não tenho família sendo investigada”, disse o presidente.
Investigadores presentes na sessão, porém, entenderam que, apesar de usar as palavras “segurança no Rio”, o presidente se referia à superintendência da PF. “Não vou esperar foder alguém da minha família. Troco todo mundo da segurança. Troco o chefe, troco o ministro”, teria dito Bolsonaro ao então ministro da Justiça Sergio Moro, na frente de todos os outros ministros.
Outros assuntos
O presidente também teria, segundo relatos, afirmado que não iria divulgar a “porcaria” de um exame de novo coronavírus que poderia eventualmente levar a um processo de impeachment.
O presidente se referia, provavelmente, à ação judicial movida pelo jornal O Estado de São Paulo para ter acesso aos laudos dos exames de coronavírus que o presidente fez e, segundo ele, deram negativo. Na noite dessa terça-feira (12/05), a AGU comunicou que entregou ao ministro Ricardo Lewandowski, do STF, os laudos – todos negativos, segundo o órgão.
Por causa desses outros assuntos, o próprio presidente tem defendido que seja liberado o sigilo parcial do vídeo do encontro com os ministros, apenas com as passagens que digam respeito ao inquérito.
Esperando o vídeo
Ao decretar o sigilo do vídeo em um inquérito que tramita aberto, o ministro Celso de Mello destacou que a proteção era “pontual e temporária”, cuidado tomado após a AGU alegar que havia assuntos sensíveis no arquivo, que poderiam colocar em risco a segurança nacional. O vídeo, afinal, registra mais de duas horas de reunião de Bolsonaro com seus ministros.
O ex-ministro Sergio Moro advoga pela divulgação da íntegra do vídeo. A pressão social também é grande e parte até de um colega de Celso de Mello, o ministro Marco Aurélio, que disse ao Metrópoles desconhecer o conteúdo, mas, que “como todos os brasileiros, estou curioso para saber o que está nele”.
Para decidir, porém, Celso de Mello deve esperar um posicionamento do procurador-geral da República, Augusto Aras, sobre o tema e, possivelmente, a conclusão de uma perícia que ele pediu à PF para fazer no arquivo do vídeo, para garantir que não está editado.