Cartões de vacina: PF aponta esquema em Caxias e pede nova apuração
A PF pediu ao ministro Alexandre de Moraes que seja aberto novo procedimento, além do que já investiga o cartão de vacinas de Bolsonaro
atualizado
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A Polícia Federal (PF) apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) nova parte das investigações sobre o suposto esquema de fraude em cartões de vacinas que teria beneficiado o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Nas conclusões, a PF apontou ter indícios de uma “grande estrutura na Prefeitura de Duque de Caxias (RJ) para prática de crimes” de inserção de dados falsos de vacinação no sistema do Ministério da Saúde.
Assim, a PF pediu ao ministro Alexandre de Moraes que seja aberto novo procedimento de investigação para apurar esses fatos, de uma maneira isolada daqueles já em andamento. A complementação da análise de dados armazenados em telefones celulares apreendidos “evidenciou novos elementos de prova que revelaram a constituição de uma grande estrutura na Prefeitura de Duques de Caxias/RJ para a prática de crimes de inserção de dados falsos de vacinação em benefícios de diversas pessoas, diverso do grupo criminoso investigado nos autos da Pet. 10.405/DF (Inq. 4874/DF)”, argumentam os investigadores da PF no pedido.
Até o momento, as apurações corriam no âmbito da PET 10.045. Nesse caso, a investigação visa identificar se Bolsonaro e outros 15 foram beneficiados no esquema. O mesmo caso está conectado com o inquérito das milícias digitais. A PF, porém, quer uma investigação somente para a existência dessa estrutura em Duque de Caxias, supostamente articulada para beneficiar outras pessoas que queriam dados falsos de vacinação.
A suposta fraude no cartão de vacina de Jair Bolsonaro (PL), sua filha e pessoas próximas começou a ser investigada em 3 de maio de 2023.
A operação da Polícia Federal denominada “Venire” teve sua segunda fase deflagrada em 4 de julho. Na ocasião, mirou-se em Washington Reis (MDB), secretário estadual de Transportes do Rio e ex-prefeito de Duque de Caxias, e Célia Serrano, secretária de Saúde de Caxias.
Washington Reis e a Célia Serrano seriam responsáveis por viabilizar a inserção dos dados falsos de vacinação nos sistemas do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI) e na Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS), ambos do Ministério da Saúde.
Elementos
Os elementos de prova colhidos pela Polícia Federal demonstraram que o grupo investigado usou a estrutura da Secretaria de Saúde de Duque de Caxias (RJ) para viabilizar a inserção de dados falsos de vacinação contra a Covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde. “Para isso, contaram com a aderência consciente e voluntária do então secretário municipal João Carlos de Sousa Brecha, e das servidoras da Prefeitura de Duque de Caxias, Camila Paulino e Cláudia Helena”, diz documento da PF.
Início do suposto esquema
O suposto esquema teve início em novembro de 2021, quando Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, teria pedido ao sargento do Exército Luis Marcos dos Reis para conseguir um cartão de vacinação falsificado para sua esposa, Gabriela Santiago Cid.
Reis, por sua vez, contatou seu sobrinho, o médico Farley Vinicius de Alcântara. Este obteve um cartão de vacinação da Secretaria de Saúde do Estado de Goiás, preenchido com duas doses da vacina contra a Covid-19 em nome de Gabriela.
As informações das vacinas, incluindo data, lote, fabricante e aplicador, foram copiadas de um cartão de imunização verdadeiro, pertencente a uma enfermeira que havia recebido a aplicação do fármaco em Cabeceiras (GO).
O primeiro cartão falsificado continha anotações manuscritas e assinatura de Alcântara. A PF demonstrou a fraude por meio de dados de geolocalização, que mostraram que o celular de Gabriela estava em Brasília nas datas em que supostamente tomou as vacinas em Cabeceiras.
Tentativas frustradas
Após obter o cartão falsificado, Cid procurou o segundo-sargento do Exército Eduardo Crespo Alves, em 23 de novembro de 2021, para que ele inserisse os dados falsos no sistema ConecteSUS.
A tentativa falhou, porque os lotes de vacina registrados no cartão falso estavam associados a Goiás, enquanto a inserção foi feita no Rio de Janeiro. Crespo, segundo a PF, não sabia da falsidade dos documentos.
Paulo Sérgio da Costa Ferreira, outro militar, também tentou inserir os dados falsos, sem sucesso. O oficial realizou o procedimento via Prefeitura de São Gonçalo (RJ), usando o cadastro de uma pessoa chamada Sonia. No entanto, ela hesitou ao perceber a ilegalidade.
Após a intervenção do ex-major do Exército Ailton Gonçalves Moraes Barros, a inserção foi bem-sucedida. Barros conseguiu inserir os dados falsos no sistema em Duque de Caxias (RJ), com novos dados provenientes de outro cartão falso.
Segundo a PF, o registro foi feito pelo secretário de Governo de Duque de Caxias, João Carlos Brecha, que nega qualquer envolvimento. A PF conseguiu rastrear o login no sistema até seu computador pessoal, em Niterói.
Expansão do esquema do cartão de vacina
Com o sucesso na suposta falsificação para Gabriela Cid, o esquema expandiu-se para incluir registros falsos de vacinação para as três filhas de Mauro Cid, bem como para Jair Bolsonaro e sua filha, Laura.
Além disso, auxiliares próximos ao ex-presidente, como Max Guilherme Machado de Moura e Sergio Rocha Cordeiro, também se beneficiaram. O último a ter seus dados inseridos no ConecteSUS foi o deputado Gutemberg Reis (MDB-RJ).
Em acordo de delação premiada, Mauro Cid admitiu seu envolvimento no esquema e detalhou como entregou pessoalmente os certificados falsos a Bolsonaro. A PF rastreou a impressão dos documentos até uma impressora no Palácio do Alvorada, usada por Cid em 22 de dezembro de 2022.
Objetivo e consequências
O objetivo do suposto esquema era emitir certificados de vacinação para facilitar a entrada nos Estados Unidos em viagens de lazer. O ex-presidente Bolsonaro teria supostamente recebido a primeira dose da vacina Pfizer em 13 de agosto de 2022, do lote PCA0084, e a segunda em 14 de outubro de 2022, do lote FP7082, no Centro Municipal de Saúde de Duque de Caxias.
Com base nas provas coletadas, incluindo depoimentos, mensagens de WhatsApp e registros de geolocalização, a PF indiciou Bolsonaro, Cid e mais 15 pessoas por diversos crimes relacionados à falsificação de certificados de vacinação.