Canabidiol no esporte: saiba por que a substância deixou de ser doping
Enquanto o CBD passou a ser legal, o corticoide, um hormônio esteroide que possui ação anti-inflamatória, foi proibido pela Wada
atualizado
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Ansiedade, noites mal dormidas e dores no corpo fazem parte do dia a dia de diversos atletas de alta intensidade. A luta pela perfeição no esporte e uma vida sem sofrimento físico parece algo impossível de atingir, mas alguns competidores e médicos alertam que a solução está em uma substância ainda muito discriminada: o canabidiol (CBD).
Uma das inúmeras substâncias encontradas na planta Cannabis, corriqueiramente conhecida como maconha, o CBD promete não só ajudar na performance dos competidores, mas melhorar o cotidiano. A aposta nessa substância é tão grande que nos Jogos Olímpicos de Tóquio o CDB não será mais considerado doping .
A Agência Internacional Antidoping (Wada, sigla em inglês) deixa bem claro, contudo, que o CBD é o único elemento permitido. Os demais canabinoides da planta ainda estão fora de questão.
De acordo com Renato Anghinah, que é professor de neurologia da Faculdade de Medicina da USP e CMO da Hempmeds, a primeira empresa autorizada pela Agência Nacional de Vigiância Sanitária (Anvisa) a importar CBD no Brasil, o fato de contribuir para melhorar a condição física dos esportistas, incluindo as microlesões e lesões geradas pelos treinos intensos, fez com que o CBD fosse revisto pela Wada.
Agora ele é classificado como um medicamento, não mais como uma “droga alucinógena”, enquanto o corticoide, um hormônio esteroide que possui ação anti-inflamatória, tornou-se proibido nas Olimpíadas, por gerar aumento de desempenho dos atletas.
Quais são os benefícios e como age?
Segundo Anghinah, o canabidiol serve para inúmeros casos: “É prescrito para epilepsia, autismo, casos de dores crônicas, ansiedade, distúrbio de sono e espasmos”.
O neurologista também explica que o medicamento age como um ativo terapêutico: “O CBD não possui os efeitos psicotomiméticos descritos para quem realiza o uso adulto. É conhecido dentre os médicos prescritores com fins medicinais”. O médico também acrescenta que ela vai agir para “relaxar” quem faz o uso, melhorando os quadros de ansiedade, por exemplo.
Anghinah também destaca que o assunto ainda é um tabu para muitos pacientes e médicos: “É uma batalha para levar essa informação à população e aos profissionais, é preciso ter um entendimento sobre o assunto e um bom conhecimento. Muita gente acha que a medicina com Cannabis é uma panaceia”.
Quando o assunto é atletas de alta performance, o médico explica que geralmente eles convivem com a dor: “Imagina você representando o seu país em uma Olimpíada, além de o corpo ser levado ao limite, tem ansiedade e as noites mal dormidas. Isso resulta num pior desempenho”. Mas Anghinah também explica que, quando se entra com o medicamento adequado e as orientações certas, esse cenário pode mudar: “Uma das funções do CBD é entrar para combater esses exemplos”.
Um alívio para o competidor profissional
Italo Penarrubia, skatista e recordista do aéreo mais alto da história dos X-Games, de 30 anos, conta que começou a utilizar o CBD há 5 anos, após procurar diversos métodos: “Descobri lá na Califórnia (EUA). Ao longo desses anos já me quebrei muito, já bati três vezes a cabeça. Também sou muito ansioso e hiperativo”.
Italo conta que, quando começou o uso do CBD com acompanhamento médico, teve uma melhora de “100%”. “Mas é importante o acompanhamento de um profissional. Fiz vários testes antes de chegar na dosagem que uso hoje e posso dizer que foi um avanço na minha carreira”, diz.
O skatista ainda diz que lá fora há muitas informações sobre o produto. “Lá nos Estados Unidos tem muitos estudos sobre o CBD e a maconha em geral. Depois que passei a tomar acordei mais disposto, as dores também melhoraram muito”, destaca.
Italo mora no Brasil, mas viaja sempre por causa do esporte. Ele faz o uso do CBD duas vezes por dia. No Brasil, para ter o medicamento, foi necessária uma autorização da Anvisa, mas lá fora ele diz que é fácil encontrar, “em qualquer farmácia, tabacaria, qualquer esquina”.
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Resultado instantâneo
Nilo Peçanha, de 33 anos, também skatista profissional, começou a usar o CBD há 3 meses e mesmo nesse pouco tempo já viu uma grande diferença. “Também fiz acompanhamento com um médico e, além das doses, uso uma pasta e uma pomada, que tem o próprio canabidiol, para passar nos machucados. O impressionante é que o alívio é instantâneo”, diz.
O atleta ainda conta que, antes de fazer o acompanhamento com o médico, outros colegas também recomendaram o CBD: “Conheci lá na Califórnia há uns 5 anos, tinha o contato com algumas gotinhas e uns amigos me emprestaram a pomada para os meus machucados”.
“No meu caso, nunca tive tanta ansiedade nem problemas para dormir, era mais para os machucados, mas você percebe sim um certo relaxamento no corpo, e o bacana é que não tem a parte alucinógena”, ressalta Nilo.
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E acha em qualquer farmácia?
Como funciona para conseguir o medicamento? De acordo com Renato Anghinah, da Hempmeds, hoje qualquer médico pode prescrever, “desde que tenha seriedade e esteja ciente do quadro do paciente”.
“É preciso uma receita médica, e a partir disso o paciente vai fazer um cadastro na Anvisa. É importante que o médico prescreva também o produto, afinal, há diversas opções do CBD para ações e indicações diferentes”, ressalta.
O médico diz que no Brasil você só encontra um produto na farmácia. O neurologista ainda chama a atenção para o Projeto de Lei (PL) 399/15, que regulamenta o plantio da maconha para fins medicinais e a comercialização de medicamentos. “Se esse PL for aprovado, será ótimo, afinal o custo vai diminuir. No Brasil, hoje, temos tecnologia e mão de obra, dependemos agora do Congresso Nacional”, ressalta.
Anvisa
Em dezembro do ano passado, a Anvisa aprovou a criação de uma nova categoria de produtos derivados de Cannabis. “A resolução aprovada entrou em vigor no dia 10 de março deste ano. A partir dessa data, as empresas interessadas em fabricar e comercializar esses produtos puderam solicitar o pedido de autorização à agência”, afirma a Anvisa.
Em 22 de abril do ano passado, foi aprovado o primeiro produto de Cannabis pela Anvisa. Trata-se de produto à base de canabidiol com concentração de 200 mg/mL. No dia 22 de fevereiro deste ano, foram aprovadas duas novas concentrações para este produto à base de canabidiol, 20 mg/mL e 50 mg/mL.
O regulamento prevê que o comércio dos produtos de Cannabis será feito exclusivamente mediante receita médica de controle especial. As regras variam de acordo com a concentração de tetra-hidrocanabinol (THC). Nas formulações com concentração de THC de até 0,2%, o produto deverá ser prescrito por meio de receituário tipo B, com numeração fornecida pela Vigilância Sanitária local e renovação de receita em até 60 dias.
Por outro lado, os produtos com concentrações de THC superiores a 0,2% só poderão ser prescritos a pacientes terminais ou que tenham esgotado as alternativas terapêuticas de tratamento. “Nesse caso, o receituário para prescrição será do tipo A, com validade de 30 dias, fornecido pela Vigilância Sanitária local, padrão semelhante ao da morfina, por exemplo”, informa a Anvisa.
Como ficam as importações excepcionais?
As importações de produtos derivados de cannabis, como o canabidiol, continuam autorizadas de acordo com a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 335/2020. Para a solicitação dessa autorização, é necessário acessar a página de serviços do governo federal e preencher o formulário eletrônico para solicitar autorização para importação excepcional de canabidiol.
Como as pessoas fazem para importar? Existem locais licenciados para isso?
Ao Metrópoles, a Anvisa ainda disse que a Resolução RDC 335/2020 estabelece os procedimentos para a importação de Produto Derivado de Cannabis, por pessoa física, para uso próprio, mediante prescrição de profissional legalmente habilitado, para tratamento de saúde.
Para importação e uso de Produto Derivado de Cannabis, os pacientes devem se cadastrar na Anvisa, por meio do formulário eletrônico para a importação e uso, disponível no Portal de Serviços do Governo Federal.
Para o cadastro, é necessário apresentar a prescrição do produto por profissional legalmente habilitado, contendo obrigatoriamente nome do paciente e do produto, posologia, data, assinatura e número do registro do profissional prescritor em seu conselho de classe.
“Não há definição de concentração para a importação do Produto derivado de Cannabis, para uso próprio, nos termos da RDC 335/2020”, completa a Agência.