Caminhoneiros desafiam o governo e tentam parar o país nesta segunda
Ministério da Infraestrutura foi à Justiça e conseguiu liminares para impedir bloqueios de rodovias em 20 estados
atualizado
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Enfurecidos pelos constantes reajustes no preço do diesel e insatisfeitos pela falta de diálogo com o governo federal, caminhoneiros autônomos de todo o Brasil tentam promover, a partir desta segunda-feira (1°/11), greve que traga consequências palpáveis à economia do país e obrigue as autoridades a ceder aos apelos da categoria.
A maioria das lideranças rechaça publicamente eventual bloqueio das rodovias por parte dos grevistas, mas essa possibilidade é o que mais preocupa o Ministério da Infraestrutura, que foi à Justiça e obteve liminares em 20 estados para impedir a prática.
Apesar da ofensiva do governo federal, o movimento mantém a pretensão de paralisar nesta segunda e demonstra irritação com o ministro Tarcísio de Freitas. O chefe da pasta da Infraestrutura tem dado várias declarações minimizando os riscos da greve – e causando ainda mais revolta nos profissionais estradeiros.
Em uma palestra pública, o ministro criticou “meia dúzia de lideranças” que convocam greves frequentemente, disse que os autônomos são minoria no setor e pontuou que a falta de apoio das transportadoras condenaria o movimento a ser diminuto. “Eles tentam aproveitar o que aconteceu em 2018 [uma grande greve de caminhoneiros que realmente parou o país], mas o que aconteceu em 2018 não vai acontecer tão cedo. A turma que financiou 2018 tá fora. Nosso único desafio é não deixar bloquear rodovia”, disse Tarcísio de Freitas, em posição confirmada oficialmente pelo ministério.
A mobilização dos profissionais, porém, ganhou força desde então. Uma das vitórias mais expressivas dos autônomos nos últimos dias foi a adesão ao movimento das principais centrais sindicais do país, incluindo a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Força Sindical. Uma nota conjunta em apoio às pautas dos caminhoneiros, como a redução do preço do diesel e a revisão da política de preços da Petrobras, foi divulgada pelas entidades sindicais no início da tarde de quinta (28/10).
Na sexta (29/10), o presidente da Central dos Sindicatos do Brasil (CSB), Antonio Neto, previu que a paralisação terá grandes proporções. Ele disse que se reuniu com lideranças de caminhoneiros e de sindicatos de transporte e logística para conversar sobre detalhes do protesto. “A greve vai acontecer à 0h do dia 1º de novembro. O Brasil vai começar a parar. Estamos apoiando esta greve. Esses excessos de preços causam revolta em todos os trabalhadores brasileiros”, afirma Neto, que também é presidente do PDT em São Paulo.
“Esta greve é de todo o povo brasileiro. É de quem está tendo de comprar gás e não consegue pagar, a energia está subindo… o povo brasileiro não aguenta mais pagar os lucros bilionários de meia dúzia de acionistas”, acrescenta o sindicalista.
O que esperar
Ainda que não seja de grandes proporções, a greve que começa nesta segunda traz ameaças reais para vários segmentos do setor produtivo, segundo o analista líder para o Brasil da consultoria internacional Control Risks, Mário Braga. “O provável fechamento de trechos de rodovias pelo país, mesmo que a paralização não conte com o apoio integral da categoria, pode resultar em dificuldades para cadeias de suprimentos, afetando desde linhas de produção até o abastecimento de produtos para os consumidores finais”, enfatiza Braga em entrevista ao Metrópoles.
O analista de riscos lembra que o modal rodoviário é onde circula a maioria da carga no país. “Esta realidade é estrutural e faz com que protestos de caminhoneiros tenham o potencial de gerar impactos significativos para empresas de diversos setores – desde o escoamento de grãos e transporte de peças à indústria e bens de consumo e pequenos comércios, por exemplo.”
Riscos fiscais
A resposta do governo federal a essa pressão dos caminhoneiros é fonte de outro tipo de riscos, afirma ainda o analista Mário Braga.
“Em meio ao contexto da corrida eleitoral de 2022, o presidente Jair Bolsonaro deve seguir tentando adotar medidas pontuais para conter o impacto do alto preço dos combustíveis sobre a inflação e sua popularidade. Esse cenário deve levar a um alto grau de volatilidade nas políticas públicas focadas neste tema, já que, em vez de solução estruturais, o governo tem historicamente optado por atalhos e soluções de curto prazo em razão das dificuldades de coordenação junto ao Congresso para a aprovação de pautas complexas, sobremaneira as de cunho econômico”, ressalta o especialista.
“Essa instabilidade deve seguir gerando preocupações quanto ao rumo da política fiscal, além de abalar a confiança de investidores e empresários. Como consequência, o relativamente alto grau de incerteza deve adiar decisões de investimento, tendo um efeito negativo para a recuperação do país ao longo do próximo ano”, completa.
As negociações
A principal medida anunciada pelo governo federal para tentar mitigar os problemas dos caminhoneiros é um “auxílio-diesel” mensal de R$ 400 por um ano. A ajuda, porém, não foi bem recebida pelas lideranças da categoria, que acharam que a colaboração é muito pequena em um contexto no qual o combustível subiu 65,3% apenas em 2021.
O que a classe sugere é uma mudança na política de preços da Petrobras. Para lideranças, é necessário adotar a política de preço de paridade de exportação (PPE) e passar a uma baseada exclusivamente em custos nacionais. De acordo com Carlos Alberto Litti, diretor da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes e Logística (CNTTL), essa proposta tem sido ventilada entre integrantes da categoria e “pode melhorar a condição” dos caminhoneiros.
Eles também propõem acerto de contas anual entre a Petrobras e o governo. Com essas e outras medidas, os caminhoneiros calculam que haveria retração no preço da gasolina de 45%, de 27% no óleo diesel e de 23% no gás liquefeito de petróleo (GLP), o gás de cozinha.
Como essas negociações não estão andando, a ideia das lideranças é forçá-las. De acordo com representantes da categoria, um dos principais alvos de mobilização é o Porto de Santos, que depende do modal rodoviário em 55% das cargas movimentadas.
Em um vídeo obtido pelo Metrópoles, dezenas de caminhoneiros reunidos em assembleia na semana passada gritam palavras de ordem a favor da greve, dizendo que “chegou a hora” de lutarem por seus direitos. Alguns, mais exaltados, respondem que a situação virou uma “guerra”.
Esta segunda-feira de feriadão vai mostrar se o governo acertou em minimizar o movimento ou se as lideranças mais radicalizadas vão conseguir promover greve de grandes proporções.