“Brasil não precisa de Constituição imposta”, diz Sindicato da PF
Na semana passada, o vice de Bolsonaro defendeu que o país precisa de nova Constituição elaborada por “notáveis” e aprovada em plebiscito
atualizado
Compartilhar notícia
A presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia Federal do Estado de São Paulo, Tania Prado, reagiu à declaração do candidato a vice-presidente na chapa de Jair Bolsonaro (PSL), General Mourão (PRTB) e disse que “tudo o que o Brasil não precisa é de uma Constituição outorgada, imposta, como a de 1937”.
Na semana passada, Mourão defendeu que o Brasil precisa de uma nova Constituição, mas elaborada por “notáveis” e aprovada em plebiscito pela população, sem a eleição de uma Assembleia Constituinte.
“É imprescindível saber o que se planeja para o conteúdo da nova Constituição, sugerida pelo general, e que essa proposta seja incluída com transparência e clareza no programa de governo da chapa, enviado ao TSE”, afirmou a delegada.
“Tudo o que o Brasil não precisa é de uma Constituição outorgada, imposta, como a de 1937, com supressão das estruturas que hoje estão funcionando no tocante à responsabilização de corruptos e organizações criminosas”, declarou Tania. “O processo de depuração pelo qual passa o País se deu graças ao sistema de freios e contrapesos previstos justamente na Constituição vigente.”
Mourão declarou que a elaboração da última Constituição, de 1988, por parlamentares eleitos, “foi um erro”, e defendeu que a nova Carta deveria ser criada por “grandes juristas e constitucionalistas”.
“Uma Constituição não precisa ser feita por eleitos pelo povo. Já tivemos vários tipos de Constituição que vigoraram sem ter passado pelo Congresso eleitos”, disse Mourão, defendendo que esse tipo de documento, sem a participação de eleitos, já esteve em vigor em períodos democráticos do País, não apenas durante a ditadura.
Tania Prado diz que a declaração do general vai de encontro à linha pregada por Bolsonaro. “Quando o general Hamilton Mourão declara que o Brasil precisa de uma nova Constituição enxuta, redigida por “notáveis não eleitos”, ratificada por plebiscito, em contraposição à de 1988, que foi elaborada por uma Assembleia Constituinte e promulgada pelo Congresso Nacional, ele vai de encontro ao que seu candidato à Presidência defende sobre o respeito à Constituição do país”, disse.
Tania destaca a página 11 da proposta do plano de governo da chapa Bolsonaro/Mourão. “Tudo será feito dentro da lei. Nossa Constituição precisa ser respeitada mesmo imperfeita, nossa Constituição foi feita por representantes eleitos pelo povo. Ela é a lei máxima e soberana da nação brasileira. Lamentavelmente, nossa Constituição foi rasgada nos últimos anos, inclusive por muitos que deveriam defendê-la. Nosso conjunto de leis serão o mapa e a bússola, serão os princípios liberais democratas para navegarmos no caminho da prosperidade. Enfrentaremos o viés totalitário do Foro de São Paulo, que desde 1990 tem enfraquecido nossas instituições democráticas.”
Em nota, a presidente do Sindicato dos Delegados da PF em São Paulo afirma que vê com extrema preocupação “a declaração vinda de um dos candidatos a vice-presidência do Brasil, sinalizando indesejável hipertrofia do Poder Executivo e promovendo desequilíbrio entre os Poderes da União”.
Tania questiona “os efeitos disso na estabilidade do país, nas relações jurídicas e, sobretudo, no funcionamento das instituições de Estado”.
“É imprescindível saber o que se planeja para o conteúdo da nova Constituição, sugerida pelo general, e que essa proposta seja incluída com transparência e clareza no programa de governo da chapa, enviado ao TSE”, cobra Tania Prado.
Na avaliação da delegada, foi a Constituição atual que “permitiu à nação, num processo notável de amadurecimento, atravessar tantos abalos sem que suas instituições sequer tremessem quando, por exemplo, personalidades importantes se viram condenadas pela Justiça de forma legítima, após inúmeras fases da Operação Lava Jato, da Polícia Federal, o que também ensejou a recuperação de capitais desviados e a necessária interrupção do funcionamento de organizações claramente criminosas”.
“No campo das ideias, todo debate é permitido mas, quando se fala de um processo eleitoral, é preciso que haja transparência sobre o que se está propondo.”
A delegada sustenta que o País precisa do “fortalecimento das instituições de Estado, uma Polícia Federal com autonomia, que possa trabalhar com tranquilidade, lista tríplice para eleição do diretor geral da Polícia Federal, mandato fixo, sem falar nas questões que dizem respeito à própria Polícia Judiciária”.
“Esses são temas que deveriam estar nas prioridades das discussões para se aprimorar alguns pontos da atual constituição, não sugerir o seu descarte sumário.”
A delegada assinala que “o Poder Legislativo é que tem a legitimidade de fazer as leis e as normas constitucionais, numa assembleia constituinte”. “Qualquer outro processo diferente desse não deve ser aceito pelo cidadão, sob risco de se submeter a um regime distante da democracia”, alerta a policial.
“Mais: há um passo muito longo para se chegar ao que foi dito pelo candidato. Primeiro, é preciso haver um ambiente de consolidação plena das instituições de Estado. Segundo, é preciso atentar para que a Constituição de um país, sob o Estado Democrático de Direito, não seja alterada quando há uma visível e grande divisão em sua sociedade.”