Brasil decide não assinar carta da OEA contra guerra na Ucrânia
Nicarágua, Cuba, Argentina e Bolívia também não assinaram o documento, divulgado nessa sexta-feira (25/2). Leia-o na íntegra
atualizado
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O Brasil não assinou um documento publicado pela Organização dos Estados Americanos (OEA) que condena a investida russa em território ucraniano.
A Ucrânia vive o terceiro dia de bombardeios neste sábado (26/2) e assiste à presença de militares russos aumentar em seu território. O presidente da Rússia, Vladimir Putin, determinou que as tropas militares façam “ofensivas em todas as direções”. Em reação, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, apelou a “todos os amigos” do país e garantiu que as tropas sob seu comando não irão recuar.
Além do Brasil, países como Nicarágua, Cuba, Bolívia e Argentina decidiram não assinar a declaração divulgada pela OEA, segundo apurou o Metrópoles.
Na carta, a OEA condena “veementemente a invasão ilegal e injustificada” da Ucrânia pela Federação Russa e “apela à retirada imediata da presença militar e à cessação de qualquer nova ação militar naquele país”. Ainda, exorta ao presidente da Rússia “cessar imediatamente suas hostilidades, diminuir a escalada, retirar todas suas forças e equipamentos da Ucrânia e retornar ao caminho do diálogo e da diplomacia para a solução de controvérsias”.
Confira a íntegra da carta:
CP45586S03 by Tacio Lorran Silva on Scribd
Ao jornal O Globo, um interlocutor envolvido com o assunto explicou que a delegação brasileira pode não ter assinado a carta pois: 1) a Ucrânia fica no continente europeu e; 2) a posição do Brasil foi expressa no Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU).
Durante a reunião do Conselho de Segurança da ONU, realizada nessa sexta-feira (25/2), o embaixador do Brasil na organização, Ronaldo Costa Silva, condenou os ataques russos e disse que o mundo “precisa se livrar da guerra e que a paz e a lei internacional precisam prevalecer”. Ele acrescentou que o Brasil apoia a busca do “equilíbrio” e chamou de “inaceitável” a invasão do território ucraniano.
Por sua vez, o embaixador do Brasil junto à OEA, Otávio Brandelli, em seu discurso, destacou que o Conselho de Segurança das Nações Unidas é o órgão que “possui a responsabilidade primordial pela manutenção da paz e da segurança internacional”.
Pré-candidato à presidência da República, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou que, ao não assinar carta da OEA condenando invasão russa à Ucrânia, o “Brasil fica ao lado de ditaduras como Cuba e Nicarágua, que também se recusaram a ratificar o documento”. O tucano destacou que 500 brasileiros esperam por ajuda na Ucrânia. “Este governo ficará ao lado da democracia ou do autoritarismo?”, provocou o ex-aliado do presidente Jair Bolsonaro (PL).
Ao não assinar carta da OEA condenando invasão russa à Ucrânia, Brasil fica ao lado de ditaduras como Cuba e Nicarágua, que tb se recusaram a ratificar o documento. 500 brasileiros esperam por ajuda na Ucrânia. Este governo ficará ao lado da democracia ou do autoritarismo?
— João Doria (@jdoriajr) February 26, 2022
A reportagem do Metrópoles procurou o Itamaraty, mas o órgão preferiu não se manifestar sobre o assunto. O espaço segue aberto.
Confira a íntegra do discurso de Otávio Brandelli na OEA:
“Na condição de membro não permanente, o Brasil participa ativamente das discussões sobre a situação da Ucrânia no Conselho de Segurança das Nações Unidas, o órgão que possui a responsabilidade primordial pela manutenção da paz e da segurança internacional.
O Brasil está seriamente preocupado com as operações militares russas contra alvos em território ucraniano. Atuamos no Conselho de Segurança das Nações Unidas, orientados para a busca de soluções diplomáticas para a crise ucraniana. Estamos profundamente preocupados com a decisão da Federação Russa de virar tropas para o terreno, e com a perda de vidas e com o perigo para a população civil. De outro ângulo, igualmente as preocupações de segurança manifestada pela Federação Russa nos últimos anos devem ser levadas em consideração, principalmente porque diz respeito ao equilíbrio de tropas e de armas estratégicas no contexto europeu. Isso não dá à Federação Russa o direito de usar a força e ameaçar a integridade territorial e a soberania de outro Estado.
O Conselho de Segurança das Nações Unidas tem legitimidade para debater e adotar as medidas necessárias para garantir a paz sustentável. O Brasil segue empenhando em apoiar iniciativas que busquem a suspensão imediata de hostilidades e a restauração da paz em toda a região, nosso objetivo principal.
Nossos esforços também estão concentrados em evitar uma catástrofe humanitária, incluindo a intensificação dos fluxos de refugiados. Os princípios do Direito Humanitário devem prevalecer. As vidas dos civis e as necessidades das pessoas, especialmente as mais vulneráveis, devem ser a nossa prioridade nesse momento.
Renovamos o nosso apelo pela cessação total das hostilidades, a retirada de tropas de território ucraniano e a retomada imediata do diálogo diplomático. Não há alternativa à negociação para resolver a crise atual.
Os temas de segurança coletiva repousam em última análise no respeito ao direito internacional e nos princípios e normas da carta das Nações Unidas. No plano hemisférico é importante que recordemos que a promoção e manutenção da paz também são objetivos refletidos na carta da OEA, que constitui um organismo regional dentro das Nações Unidas em conformidade com o artigo 1º de nosso documento constitutivo. Nesse sentido, devemos ter presentes que alguns dos propósitos essenciais da nossa organização são precisamente garantir a paz e a segurança continentais, prevenir as possíveis causas de dificuldades e assegurar a solução pacífica de controversas que surgem entre os seus membros; procurar a solução de problemas políticos e econômicos que surgirem entre os Estados membros da organização, e alcançar uma efetiva limitação de armamento convencionais que permita dedicar a maior soma de recursos ao desenvolvimento social e econômico dos Estados membros.
De conformidade com a carta da OEA, ademais, os Estados americanos reafirmam como princípios, entre outros, que o direito internacional é a norma de conduta dos Estados em suas relações recíprocas.
A ordem internacional é constituída essencialmente pelo respeito à personalidade, soberania e independência dos Estados, e pelo cumprimento fiel das obrigações emanadas dos tratados e outras fontes do direito internacional. Os Estados americanos condenam a guerra de agressão e as controversas de caráter internacional que surgirem entre dois ou mais Estados americanos deverão ser resolvidos por meio de processos pacíficos.
Devemos ter presentes os importantes esforços desta organização na prevenção de conflitos e na solução de disputas no hemisfério por meio de uma variedade de mecanismos de resolução de conflitos, como a negociação direta, a mediação e a resolução judicial e a arbitragem.
Cumpre realçar, ainda, a atuação da nossa organização e dos Estados membros na defesa e na promoção da democracia representativa dos direitos humanos, na segurança multidimensional e no desenvolvimento integral, elementos que podem contribuir para a promoção e manutenção da paz.”