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Brancos recebem quase 2 vezes do Fundo Eleitoral mais que os negros

Em agosto de 2020, o TSE decidiu pela distribuição proporcional para negros e brancos, do FEFC e do tempo de propaganda na TV e no rádio

atualizado

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Exatamente um mês antes do início da campanha das Eleições 2020, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou a reserva proporcional do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e do tempo de propaganda na TV e no rádio, para candidatos(as) negros(as) que desejam concorrer a cargos políticos, contudo, a medida só começaria a valer em 2022. O PSol (Partido Socialismo e Liberdade) e a ONG Educafro deram entrada em ação no Superior Tribunal Federal (STF) solicitando que a decisão fosse aplicada, já a partir do pleito de 2020.

Apesar da aprovação da ação de aplicação imediata, nem se os percentuais repassados a candidatos pretos (8%), pardos (28,6%), indígenas (0,2%) e amarelos (0,3%), fossem somados, o valor não seria proporcional ao que os postulantes brancos (62,7%) receberam. As informações são do portal 72 horas, que rastreia o repasse do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, das eleições municipais de 2020:

Reprodução - Portal 72 horas
Total do valor repassado, por etnia. Eleições Municipais de 2020

Para Irapuã Santana, advogado voluntário da ONG Educafro na ação que requereu ao STF a aplicação imediata, os partidos políticos poderiam ter feito valer a determinação aprovada, já nas eleições municipais. “Não acredito que a decisão tenha sido em cima da hora a ponto de inviabilizar a possibilidade de um investimento. Houve má vontade dos dirigentes da sigla em modificar o modus operandi e se acertar de acordo com a Constituição. Agora, vamos brigar pela reprovação das contas dos partidos que não cumpriram a meta do financiamento proporcional das campanhas de candidaturas negras e fiscalizar isso de uma maneira mais forte para 2022”, sugeriu.

Para Valéria Paes Landin, mestre em direito constitucional e especialista em direito eleitoral, apesar do número de candidaturas negras ter crescido de forma expressiva, isso não teve reflexão nas urnas. “A pauta demandará mais tempo para evoluir. Por isso, é imprescindível que normas editadas sobre o tema tenham resposta enérgica e não meramente retórica”, disse.

“A decisão do TSE reconhece que o racismo político é presente e que foram necessárias medidas judiciais para começar a corrigir tais exclusões. Boa parte dos negros e negras filiados aos partidos políticos, tem rendas comparativamente menores em relação aos brancos. O postulante negro precisa avaliar a possibilidade de afastar-se para dedicar-se aos atos de campanha sem que haja o prejuízo financeiro ou do seu sustento, se acolhida adequadamente na estrutura interna de cada sigla, pode fazer a diferença em uma candidatura negra.”

Bruno Costa do Nascimento (PSB) concorreu em 2020 ao cargo de vereador do município de São João de Meriti (RJ), ele acredita que a decisão pode melhorar o cenário das candidaturas negras para 2022. “É inegável que nós negros somos os principais prejudicados com a falta de recurso para campanha eleitoral. É um reflexo social. A massa pobre deste país é formada por negros e se quisermos ocupar algum espaço nos poderes, precisamos de ajuda para que nossas candidaturas sejam realmente competitivas, financeiramente falando”, disse.

Para o candidato, se há cotas para negros em universidades por correção social, também é preciso defender a medida no processo eleitoral. “Quantos negros e negras temos nas câmaras municipais? Na Câmara Federal? No Senado? Nas prefeituras? O repasse de ajuda aos negros dentro das agremiações partidárias é extremamente necessária. Eu apoio e vou lutar pela permanência”, finalizou.

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Bruno Nascimento, candidato a vereador do município de São João de Meriti, RJ
Irapuã Santana, advogado voluntário da ONG Educafro na ação do STF
Jhonata Rodrigues Martins, cientista social
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Valéria Paes Landin, mestre em Direito Constitucional e especialista em Direito Eleitoral

Valéria Paes Landin - Reprodução
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Bruno Nascimento, candidato a vereador do município de São João de Meriti, RJ

Bruno Costa Nascimento - Reprodução
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Irapuã Santana, advogado voluntário da ONG Educafro na ação do STF

Irapuã Santana - Reprodução
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Jhonata Rodrigues Martins, cientista social

Jhonata Rodrigues Martins - Reprodução

 

Realidade
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE, 56,10% de cidadãos se declararam negros no Brasil. Esse percentual é contado pela soma dos 19,2 milhões que se assumem como pretos mais os 89,7 milhões que se declaram pardos.  Um total de 108,9 milhões, na demografia de 209,5 milhões de brasileiros. A Pnad, também revelou que o analfabetismo entre pessoas negras é quase três vezes maior do que entre brancos, entre os jovens de 14 a 29 anos que não completaram o ensino médio, 71,7% são pretos ou pardos.

Em questão de ocupação de cargos representativos no mercado de trabalho, uma pesquisa de 2016, feita pelo Instituto Ethos em parceria com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) , mostrou que dentro das empresas, pessoas negras costumam ocupar, majoritariamente, baixos cargos hierárquicos. Segundo a pesquisa “Perfil Social, Racial e de Gênero das 500 maiores empresas do Brasil e suas ações afirmativas”, os gestores dessas empresas atrelaram esses índices, principalmente, à falta de qualificação profissional de negros para os cargos. Veja os índices:

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Tabela - Composição dos Cargos Hierárquicos
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Gráfico - Percepção dos Gestores

Reprodução - Pesquisa Ethos
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Tabela - Composição dos Cargos Hierárquicos

Reprodução - Pesquisa Ethos

 

Já na esfera política, que é onde se pode mudar, por meio de políticas públicas, a realidade educacional do país, o Brasil nunca teve um presidente negro, exceto Nilo Peçanha em 1909, que ficou no poder por pouco mais de um ano. Depois de 111 anos, o índice de representatividade racial na política continua baixo, em comparação à demografia do país. Observe os dados:

– Na legislatura atual, nenhum dos governadores dos 27 estados do país, é negro.

– 77 dos 1.790 políticos eleitos em 2018 se autodeclararam pretos, no registro da candidatura. Um total de 4,3% de todos os eleitos para cargos nos poderes Executivo e Legislativo nas esferas estadual, distrital e nacional. (Dados obtidos conforme designação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE)

Jhonata Rodrigues Martins, cientista social, atribui a falta de representatividade negra nos espaços de poder ao fato do Brasil ser uma nação que ainda tem a marca da colônia escravocrata

“Apesar de não sermos mais colônia nem a escravidão ser mais a forma de organização da sociedade brasileira, nossas instituições ainda operam sob a lógica, também, da discriminação racial, produzindo e reproduzindo vantagens e privilégios com base na cor da pele. Mas isso não significa que o país parou no tempo com as mesmas instituições, ao contrário, sofreu transformações resultando inclusive em mecanismo mais complexos de discriminação racial. Em um país onde o Estado e a sociedade tem a raça como um marcador que hierarquiza socialmente, temos como consequência o distância de pessoas negras dos espaços de poder e tomada de decisão. É tão naturalizado que nosso espanto é sempre quando cogitamos, por exemplo, a possibilidade de uma pessoa preta ocupar a presidência do país e não o fato da maioria da população se declarar negra e nunca ter tido um representante de pele preta. Essa naturalização encucada nas nossas cabeças cumpre o papel de adormecimento da nossa percepção sobre o racismo.”

 

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