Bolsonaro debateu blindar Flávio, mas aliados minimizam áudio
Durante reunião gravada por Ramagem e divulgadas por Moraes, são debatidas maneiras de encontrar meios para pressionar a Receita Federal
atualizado
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O áudio de uma hora e 8 minutos de reunião do então presidente Jair Bolsonaro (PL), em 2020, com subordinados para tratar das investigações sobre suposta prática de rachadinha no gabinete de seu filho Flávio foi divulgado no final da tarde de segunda-feira (15/7), colocando fim a uma semana de especulações.
A deflagração da última fase da operação Última Milha, da Polícia Federal, no último dia 7 de julho, revelou a existência do áudio, que teria sido gravado pelo então chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem, hoje deputado federal pelo PL do Rio.
As revelações sobre a “Abin paralela”, que teria espionado adversários políticos, magistrados e jornalistas durante o governo Bolsonaro têm sido usadas pela esquerda para tentar desgastar a imagem do ex-presidente e de seus aliados, que serão candidatos nas eleições municipais de outubro. Os aliados de Bolsonaro, porém, apostam em minimizar o conteúdo do áudio e insistir que não há nada de errado no que foi tratado.
“Mais uma vez, a montanha pariu um rato. O áudio mostra apenas minhas advogadas comunicando as suspeitas de que um grupo agia com interesses políticos dentro da Receita Federal e com objetivo de prejudicar a mim e a minha família”, reagiu Flávio. Ele estava com Covid-19 e não participou da reunião, em 20 de agosto de 2020.
A reunião
Participaram do encontro o ex-presidente Bolsonaro, o então chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno, Ramagem, e duas advogadas do senador Flávio Bolsonaro. Eles debateram as investigações contra o filho do ex-presidente pela suspeita da prática de rachadinhas.
No encontro, Bolsonaro diz que pode conversar sobre o assunto com o então chefe da Receita Federal. Depois, as advogadas sugerem que seja usado o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) para obter informações. “Olha, em tese, com um clique você consegue saber se um funcionário da Receita… esses acessos lá”, diz uma das advogadas de Flávio.
Na gravação, Heleno alerta: “Tem que manter esse troço fechadíssimo. Pegar de gente de confianga dele. Se vazar…”. E Bolsonaro complementa: “Tudo certo. E, deixar bem claro, a gente nunca sabe se alguém tá gravando alguma coisa. Que não estamos procurando favorecimento de ninguém”, completa o então presidente da República.
Ouça na íntegra:
A reação dos aliados
Além do próprio Flávio, outros aliados do ex-presidente saíram em sua defesa após a divulgação do áudio. “Só evidencia o quanto o presidente Bolsonaro ama o Brasil e o seu povo”, escreveu o advogado Fábio Wajngarten, que foi chefe da Secom na gestão passada. “Vamos para a próxima”, completou ele, em caixa alta.
E o próprio Ramagem foi a público dizer que Bolsonaro estava ciente da gravação e que ela foi feita porque havia informação de que uma pessoa que iria para a reunião “poderia vir com uma proposta nada republicana”. “A gravação, portanto, seria para registrar um crime, um crime contra o Presidente da República”, seguiu ele, sem dar detalhes do crime.
A suposta rachadinha
Essa investigação teve início em 2018, quando surgiram suspeitas de movimentações financeiras atípicas na conta de um ex-assessor de Flávio, Fabrício Queiroz. Fabrício foi preso em junho de 2020 em um sítio em Atibaia, São Paulo.
Áudio
Na mesma gravação, o ex-presidente Bolsonaro disse que o ex-governador do Rio de Janeiro Wilson Witzel pediu uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) para “resolver o caso do Flávio”. Também referindo-se à investigação de rachadinhas contra o filho.
“Ele falou, [que] resolve o caso do Flávio: ‘Me dá uma vaga no Supremo’. […] Sede de poder”, afirmou Bolsonaro em um trecho. Ouça:
Quebra de sigilo
O ministro Alexandre de Moraes levantou sigilo de áudio dentro da investigação do monitoramento ilegal de pessoas e autoridades públicas pela “Abin paralela”. Também determinou a retirada de sigilo de informações prestadas pela Polícia Federal, bem como de gravação realizada.
Para o ministro, eventual divulgação parcial de trechos do documento ou da gravação poderia causar prejuízos à correta informação da sociedade. No caso do acesso aos autos pelas defesas, os advogados poderão obter os documentos que venham a ser juntados futuramente ao processo.
A decisão foi tomada nos autos da PET 12.732, que investiga o uso do sistema de inteligência First Mile, da Abin, por delegados, agentes e servidores públicos.
Segundo a Polícia Federal, foram constatados elementos concretos de uma organização criminosa que atuava em núcleos para elaboração de dossiês contra ministros, parlamentares e outras pessoas a fim de divulgar narrativas falsas e incitar, direta ou indiretamente, tentativa de golpe de estado e enfraquecimento das instituições.