Bolsonaristas querem barrar PL que deixa R$ 15 bi com Congresso
Deputados se articulam contra texto que repassa ao Congresso o controle de montante de R$ 15 bilhões a R$ 17 bilhões do Orçamento
atualizado
Compartilhar notícia
Deputados aliados ao presidente Jair Bolsonaro se articulam para votar contra o projeto de lei enviado pelo próprio governo repassando ao Congresso o controle de um montante de R$ 15 bilhões a R$ 17 bilhões do Orçamento. O texto foi remetido ao Legislativo na semana passada, junto com outros dois projetos, como parte do acordo para manter o veto presidencial sobre a proposta que entregava ao relator o direito de definir a aplicação de R$ 30,1 bilhões dos recursos federais. A tentativa de derrubar o texto tem o respaldo de parte do Executivo.
O movimento entre os bolsonaristas põe em xeque a atuação do ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, responsável pela articulação política e expõe uma disputa interna dentro do governo. A Ramos é atribuída a responsabilidade de ter fechado o acordo com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). A narrativa que o grupo de apoio do presidente quer emplacar é que Bolsonaro não sabia do conteúdo do acordo e que foi induzido ao erro ao autorizar o envio do projeto ao Congresso.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, se recusou a assinar o texto na última hora, apesar de ter participado das tratativas desde o fim do ano passado. Na véspera do envio do projeto, segundo o Estado apurou, auxiliares de Guedes estiveram na casa de Alcolumbre e também por WhatsApp discutindo os detalhes do acordo.
Diante do aumento da pressão nas redes sociais, Guedes optou por não colocar suas digitais no texto, embora em reuniões privadas, segundo interlocutores, tivesse defendido um entendimento com o Congresso visando à aprovação das reformas tributária e administrativa. Dos três projetos orçamentários enviados pelo governo, Guedes assinou dois. Ficou sem assinatura justamente o que tratava do poder do relator.
Se não for apreciado no plenário nesta semana, o projeto deve ser incluído nas pautas das manifestações marcadas para o próximo domingo, dia 15, pedindo que os parlamentares votem contra o texto. No sábado, Bolsonaro fez uma convocação para os atos durante discurso em Boa Vista (RR), em uma parada a caminho dos Estados Unidos. Na ocasião, o presidente sugeriu ser chantageado, dizendo que já levou “facada no pescoço dentro do gabinete por pessoas que não pensam no Brasil, pensam neles apenas”.
A relação de Guedes e Ramos, que participaram de reuniões junto com Maia e Alcolumbre, azedou ao longo da negociação envolvendo o controle do Orçamento. Além disso, segundo auxiliares de Guedes, houve a recomendação do Ministério da Economia para que o presidente vetasse o trecho que passava o controle de R$ 30,1 bilhões. Há uma preocupação de questionamentos futuros em relação ao projeto já que área econômica tinha recomendado o veto.
Oficialmente, porém, a assessoria de Guedes informou que o ministro não assinou porque o projeto era de autoria do ministério de Ramos. No Planalto, a versão é que Ramos não entendia os detalhes do Orçamento e se concentrou apenas em buscar um bom relacionamento com os presidentes da Câmara e do Senado.
Em grupos de WhatsApp, já começaram a ser disparados vídeos e textos contra a aprovação do projeto que entrega parte do Orçamento ao relator, o deputado Domingos Neto (PSD-CE). Durante a semana, o tema deve ganhar força nas redes sociais.
Um vídeo feito pelo Movimento Vem pra Rua destaca que o relator é uma indicação do presidente a Câmara. “Tente imaginar em um ano eleitoral todo esse dinheiro nas mãos de um aliado de Rodrigo Maia. E esses destinos certamente vão privilegiar os aliados políticos.” O mesmo vídeo diz que os projetos beneficiam diretamente Davi Alcolumbre. O grupo também criou um site apenas para acompanhar como os deputados e senadores devem votar.
Uma publicação do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), nas redes sociais ontem, foi entendida por aliados do presidente como um recado contra Ramos, que negociou com Maia e Alcolumbre. “Tenho atuado como posso, entretanto, é visível que o presidente está sendo propositalmente isolado e blindado por imbecis com ego maior que a cara”, postou o filho do presidente, que tem uma relação cordial com Guedes.
A deputada Carla Zambelli (PSL-SP) disse que votará contra o projeto que garante recursos para o relator (PLN4) por convicção, mas votará a favor do projeto (PLN2) que regulamenta o orçamento impositivo e o outro (PLN 3), que redireciona R$ 9,5 bilhões para gastos discricionários do Executivo. “Eu sou contra qualquer tipo de emenda parlamentar”, disse a deputada.
A deputada Bia Kicis (PSL-DF) também confirmou que a tendência é votar contra o projeto que devolve recursos para as mãos do relator. Segundo ela, haverá uma reunião entre os deputados que fazem parte do apoio ao governo. “Temos uma reunião amanhã, mas a princípio a ideia é votarmos contra”, disse ao Estado.
A expectativa inicial é que o PLN 4 seja colocado em votação no Congresso nesta terça-feira, 10. Entretanto, segundo o Estado apurou, o texto só irá a plenário se Alcolumbre tiver certeza que passa no Senado, onde o projeto há resistência.
Tensão na equipe econômica
No último domingo (08/03), o senador Renan Calheiros (MDB-PE) usou as redes sociais e se posicionou contra os projetos. “O Congresso Nacional erra feio ao aceitar espécie de suborno de Bolsonaro de R$ 20 bi por meio de PLNs. Facada no pescoço, como ele (Bolsonaro) próprio chamou. O parlamento só recobrará legitimidade se devolvê-los. Caso contrário, a democracia pagará caro mais uma vez.” O senador Major Olímpio (PSL-SP) também usou a internet para dizer que o PLN é um “acordão para enganar o povão”.
A equipe econômica está tensa com o desfecho da votação, porque depende desse resultado para investir na pauta da agenda econômica. Não se sabe ainda como o imbróglio vai terminar, o que torna o cenário ainda mais incerto para o envio das propostas de reforma tributária e administrativa.
Um integrante da equipe econômica admitiu que o quadro ainda está confuso, que só será possível saber se o entendimento pavimentou o caminho para as propostas estruturais, que serão encaminhadas, depois do resultado da votação. A esperança é que ao longo da semana volte a se ter um ambiente mais propício.
A retirada da delegação de poder de Paulo Guedes na gestão orçamentária pelo presidente Bolsonaro ainda não foi assimilada por lideranças do Congresso. Nos bastidores, os líderes avaliam que, se o governo quer aprovar as reformas, não pode “sabotar a política”.