Aval da Anvisa, dados de eficácia e logística: os entraves para a Coronavac
Anúncio do governador de SP, João Doria, de que começará a vacinação no estado em 25 de janeiro é visto com cautela por especialistas
atualizado
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São Paulo – O plano do governador de São Paulo, João Doria, de iniciar a vacinação em 25 de janeiro, data do aniversário da capital do estado, esbarra em uma série de pré-requisitos que precisam ser cumpridos até lá. O fundamental é o detalhamento da eficácia da vacina, que ainda está pendente.
O Instituto Butantan, ligado ao governo de SP, ainda não apresentou os dados da fase 3 de testes da Coronavac, imunizante que está sendo desenvolvido em parceria com o laboratório chinês Sinovac.
A expectativa é de que esses resultados sejam apresentados até 15 de dezembro. São esses os dados que apontam a dimensão da eficácia da vacina. A depender desse percentual pode ocorrer alteração no cronograma. Estudo publicado em novembro na revista científica The Lancet aponta que a Coronavac é segura e foi capaz de criar anticorpos em 97% dos voluntários das fases de teste 1 e 2 na China.
De acordo com o infectologista Leonardo Weissmann, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia, o governo não pode prometer data de divulgação da conclusão da fase final dos testes. “Esses dados de eficácia e segurança dependem de submeter os estudos a uma revista científica e eles publicarem. Não dá para prometer a data. Ou seja, dizer que tem resposta imune em 97% dos casos é um dado de fase 2; eficácia é responder o quão boa é essa vacina, o quanto ela protege. Isso é dado de fase 3 que não foi publicado até o momento, assim como o dado de segurança em um número alto de pessoas testadas.”
Segundo Weissmann, é preciso avaliar de acordo com cada situação, como a probabilidade de a vacina ser mais apropriada para determinada faixa etária. “Não adianta soltar um calendário sem aprovação da Anvisa e sem detalhamento dos dados de eficácia e segurança. Não tem nenhum nexo científico aí. Falta evidência para soltar um calendário desses.”
Registro na Anvisa
De acordo com o governo de São Paulo, assim que os estudos forem finalizados, o Instituto Butantan vai pedir o registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Esse aval é outro obstáculo. Em nota, a agência informou que ainda está analisando os documentos que recebeu em 30 de novembro. Destacou também que o relatório da inspeção da fábrica da Sinovac na China deve ficar pronto entre 30 de dezembro e 11 de janeiro – e reforçou a necessidade dos dados da fase 3.
Ao Metrópoles, o governador de São Paulo, João Doria, afirmou que a vacina poderá ser aplicada mesmo que não obtenha o registro da agência reguladora. A legislação que dá amparo à política de enfrentamento da Covid-19, aprovada pelo Congresso em fevereiro e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, permite uma autorização excepcional, desde que o imunizante seja “registrado por pelo menos 1 (uma) das seguintes autoridades sanitárias estrangeiras: FDA (EUA), EMA (União Europeia), PMDA (Japão) ou NMPA (China)”.
A Anvisa, porém, questiona essa possibilidade e afirma que “eventual aprovação de uma vacina pela autoridade regulatória da China não implica aprovação automática para o Brasil”.
Mesmo considerando o aval da Anvisa dispensável, o governador diz que pedirá o registro e que aguarda resultado positivo. “Não há outro caminho que não liberar (a Coronavac) dentro dos critérios que a Anvisa tem, que são os mesmos critérios de protocolos internacionais de outras agências de vigilância sanitária que também estão avaliando a vacina Coronavac, nos Estados Unidos, na Europa, sobretudo na Ásia. Essas agências, se validarem a vacina, ela estará validade independentemente da própria Anvisa”, disse.
Depois de passar por essa etapa, há ainda obstáculos relativos a logística, insumos e ferramentas. São fatores que, segundo o especialista, ainda não são possíveis de dimensionar, porque não há informação suficiente.
“Isso é outra coisa que não foi divulgada em detalhes. Não podemos falar qualquer coisa porque não sabemos do que precisaremos. Parece que algumas etapas foram puladas com essa divulgação. Existem coisas mais importantes a serem divulgadas antes.”
O infectologista considera o empenho em relação à vacina positivo, mas ressalta à população a necessidade de manter o isolamento social, usar corretamente a máscara e higienizar as mãos com frequência. Ele diz que, mesmo após a vacinação, esses cuidados deverão permanecer por um período.