Autora de livro sobre operações militares: “Forças Armadas não punem”
Natalia Viana fala sobre a obra Dano Colateral, que discorre sobre a morte de civis em ações com participação de militares
atualizado
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Durante a pesquisa e a composição do livro Dano Colateral, que fala sobre danos causados durante ações das Forças Armadas em operações de segurança pública, a autora Natalia Viana percebeu um dado em comum: a falta de punição dentro dos processos contra militares.
“O que impera é a impunidade, mesmo com crime em flagrante”, apontou, em entrevista ao Metrópoles, sobre as investigações que faz desde 2018. “As Forças Armadas não punem, principalmente as camadas superiores, e nos casos que consideram politicamente relevantes.”
Jornalista há 20 anos e diretora e cofundadora da Agência Pública de Jornalismo Investigativo, Natalia Viana lançou o livro em 19 de julho, pela Objetiva, selo da Companhia das Letras.
Dano Colateral nasceu a partir da série de reportagens Efeito Colateral, feita entre 2018 e 2020.
Na obra, Viana conta a história de 35 civis mortos por militares, principalmente por integrantes do Exército. A partir disso, ela explica o avanço das Forças Armadas na vida pública brasileira até a gestão atual, que ela define como “governo de militares”.
“Meu livro ajuda a entender como viemos parar em um governo de militares – não uma ditadura ou um governo militar. Ele ajuda a entender esse momento de crise institucional, e é importante para se ler neste momento”, afirma.
Para ela, “como o livro contextualiza um momento grande da vida política atual, também insere o leitor no contexto dessas mortes pelas operações de Garantia de Lei e da Ordem (GLO) e consegue dar visibilidade a esses casos”.
Militares na vida pública
Viana aponta que houve um avanço dos militares na vida pública do país durante a última década, e avalia que isso foi resultado da participação das Forças Armadas nas ações de segurança pública: “Começou com a segurança pública e foi migrando para outras áreas”.
A jornalista menciona que isso se iniciou no governo de Michel Temer, mas que o presidente Jair Bolsonaro “deu um passo além”. “É possível perceber esse cenário a partir de um levantamento feito pelo TCU, que constatou a existência de mais de 6,1 mil militares no governo atual.”
Ela cita também reportagem da Folha de S.Paulo sobre a falta de punição nas Forças Armadas: 41 inquéritos policiais militares (IPMs) abertos por indício de crimes cometidos por oficiais-generais foram arquivados entre 2011 e 2020.
A autora afirma também que o governo atual “segurou um pouco o freio nas operações de GLO”, uma vez que o último grande caso aconteceu em 2019, quando o músico Evaldo Rosa morreu após ter seu carro atingido por 80 tiros.
Viana pontua que um dos motivos desse recuo partiu dos próprios integrantes das Forças Armadas, que “não querem estar ligados às mortes e serem levados a julgamento”.
Repercussão
A série de reportagens feita por Natalia Viana trouxe, de acordo com a autora, “visibilidade para essas mortes e para a discussão”.
A escritora também relata que continua em contato periódico com muitos dos entrevistados e que suas reportagens auxiliaram nesses casos.
Vitor Borges, uma das vítimas que teve seu caso apresentado pela jornalista, ficou paraplégico e teve de amputar uma das pernas depois de ser atingido durante ação militar no Complexo da Maré. O promotor do caso pediu que o soldado que atirou em Vitor fosse “absolvido por legítima defesa imaginária”.
Natalia trouxe essa informação em uma reportagem feita em janeiro deste ano. “A matéria com esse título gerou repercussão e, junto com a opinião pública, gerou um tema importante no julgamento”, pondera.