Áudio sexista de Mamãe Falei é suficiente para cassação, diz OAB-SP
“A fala nos mostra o quanto as ações do Dia da Mulher ainda são necessárias”, diz Patrícia Vanzolini, primeira mulher a presidir a OAB-SP
atualizado
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São Paulo – Para Patrícia Vanzolini, primeira mulher a presidir a Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP), as falas machistas do deputado Arthur do Val (Podemos) são “graves e ofensivas” e “incitam a exploração sexual de mulheres”. Por isso, ela defende a cassação do mandato do parlamentar na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).
Vanzolini afirma que esse tipo de conduta, que veio à tona às vésperas do Dia Internacional da Mulher, mostra o quão longe as mulheres estão de serem vistas como cidadãs de primeira linha, “como portadoras de dignidade e dos mesmos direitos que os homens”.
“A naturalidade da fala é o que mais impressiona, a falta de compreensão do que é uma mulher em situação de vulnerabilidade, em meio a uma guerra. Eu acho que essa fala nos mostra o quanto as ações do Dia da Mulher ainda são necessárias”, afirmou, em conversa com o Metrópoles.
A presidente avalia ser difícil alguma punição para Arthur do Val na esfera judicial, mas confia na punição administrativa.
Em relação à sua gestão na OAB, Vanzolini diz que a luta por igualdade, não só para mulheres mas também para negros e a população LGBTQI+, deve ser uma pauta forte, porque proteger essas populações é promover o fortalecimento da cidadania, um dever institucional do órgão. Leia abaixo a entrevista:
Como você avalia a fala do deputado Arthur do Val? É motivo para cassação?
A OAB-SP entende que a fala é incompatível com o exercício do mandato, então entendemos que é motivo de cassação por falta de decoro parlamentar. O decoro parlamentar não se limita às atividades dentro do Parlamento. O parlamentar sempre representa seus eleitores, o país, sua casa legislativa. Ainda que uma viagem privada, não era uma viagem de lazer. Ele tem o dever de decoro que transcende a sua ação na Alesp. A fala é muito grave. Além de ser ofensiva e grosseira com as mulheres, é uma fala conivente com o turismo sexual. É uma fala que incita a exploração sexual de mulheres em situação de vulnerabilidade.
Poderia haver alguma repercussão judicial, nas esferas penal ou cível?
Na esfera penal, a conduta foi praticada no exterior, e não há uma vítima brasileira determinada. É mais complicado de haver uma punição criminal ou cível, então o mais adequado seria a punição administrativa.
O que esse tipo de fala diz sobre como as mulheres são tratadas por parcela da classe política e da sociedade?
Mostra o quão longe nós estamos de sermos vistas como pessoas, cidadãs de primeira linha, como portadoras de dignidade e dos mesmos direitos que os homens. A naturalidade da fala é o que mais impressiona, a falta de compreensão do que é uma mulher em situação de vulnerabilidade, em meio a uma guerra. Acho que essa fala nos mostra o quanto as ações do Dia da Mulher ainda são necessárias, porque estamos muito longe de um tratamento equânime entre homens e mulheres.
Por que demorou tanto tempo para ter uma presidente mulher na OAB-SP, mesmo elas representando boa parte da advocacia?
As mulheres enfrentam muitos desafios e obstáculos para chegar a cargos de liderança, que vêm de muitos fatores. A tripla jornada de trabalho, o assédio sexual e moral que sofrem no trabalho, a falta de credibilidade que têm por parte da população e dos eleitores nos processos eletivos, a consideração de serem menos competitivas. O que é inquestionável é que esta realidade existe, que há de fato uma dificuldade de mulheres chegarem a cargos de liderança mesmo sendo a maioria na base. É um compromisso de todos remover estes obstáculos.
Em sua gestão, você pretende priorizar a pauta das mulheres?
Priorizar parece que não vamos dar importância a outras pautas, mas a pauta da igualdade para nós é fundamental, porque é a pauta da democracia. Não existe democracia só para alguns, que funcione só para os homens, ou só para os brancos ou só para a população heterossexual. Quando se fala em democracia e cidadania, pressupõe-se que todos tenham os mesmos direitos e oportunidades. Como a OAB é uma guardiã da cidadania, ela precisa se preocupar com isso, sob pena de não estar cumprindo seu papel institucional, que é o de fortalecimento e proteção da cidadania.