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Atitudes incompreendidas: mães falam do desafio de criar superdotados

Segundo elas, o comportamento que acompanha uma criança com altas habilidades pode ser confundido com TDAH. Confira histórias e dicas

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Criança montando brinquedo
1 de 1 Criança montando brinquedo - Foto: GettyImages

A superdotação é, geralmente, carregada de estereótipos, principalmente em relação às crianças, imaginadas apenas como pessoas sérias com aptidão à lógica e à matemática. Apesar de serem áreas de interesse comum nesse grupo, existem outras vertentes  a serem consideradas, como a criatividade e o potencial para liderança.

Foi isso que descobriram mães como Malu Guedes, Katia Rodrigues e Raquel de Morais. Os filhos, mais do que super habilidosos, ainda são crianças, que possuem as próprias dificuldades e não dispensam um bom momento de diversão.

Katia Rodrigues, mãe de Cristal, conta que teve dificuldades em oferecer à filha os recursos que ela necessitava, por muitas vezes ser desacreditada pelos professores e outros pais. “Minha filha começou a ler aos 3 anos. Hoje, com 9, ela fala inglês muito bem e desenha maravilhosamente.

Cristal sempre frequentou escola da rede pública. A mãe, desde cedo, comparou o desenvolvimento dela com o de crianças da mesma idade que frequentavam escolas particulares e com mais estrutura. Assim, notou que a criança parecia sestar alguns anos na frente.

“Fui a algumas psicólogas que suspeitaram de uma possível superdotação, mas as professoras costumavam ignorar, e indicar que ela talvez tivesse autismo ou algo parecido. Quando finalmente recebi o laudo da avaliação de Cristal, ela pôde frequentar a sala de recurso. Fiquei muito feliz”, diz.

A sala de recursos, mencionada por Katia, é um espaço que possui mobiliário, materiais didáticos e pedagógicos específicos destinados ao desenvolvimento do Atendimento Educacional Especializado. As aulas ocorrem no contraturno escolar. O objetivo é elaborar recursos pedagógicos e de acessibilidade, que eliminem as barreiras para a plena participação dos alunos considerando suas necessidades específicas.

Desafios semelhantes

Raquel de Morais, mãe de Miguel, compartilha o desafio. As professoras do filho, diagnosticado com superdotação aos 6 anos, diziam suspeitar que o menino possuía dislexia, TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade), TOD (Transtorno Opositor Desafiador) e autismo.

A mãe lembra de ter sido frequentemente chamada na escola. “Algumas atitudes dele eram incompreendidas”, conta.

A suspeita de TDAH por uma das professoras ocorreu em razão de Miguel copiar as tarefas muito rápido e gostar de ficar correndo pela sala de aula. Às vezes, o menino nem escrevia: respondia tudo o que era perguntado correta e oralmente.

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Além de sua aptidão para problemas lógicos, Miguel se interessa por arte e projetos de montagem/artesanato
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Miguel de Morais, 9 anos de idade

Arquivo Pessoal
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Além de sua aptidão para problemas lógicos, Miguel se interessa por arte e projetos de montagem/artesanato

Arquivo pessoal

Aí vem a quebra de alguns estereótipos construídos para crianças superdotadas. “Miguel não é um menino ansioso. Mas é muito independente. É criativo, produtivo, lógico, matématico”, aponta Raquel. Assim, ao mesmo tempo que tem afinidade com lógica, ele gosta de arte. “No contexto social, ele interage melhor com pessoas mais velhas, adolescentes e pré-adolescentes”, afirma.

No caso de Malu Guedes e João, hoje com 3 anos e 6 meses, pelo menos a identificação veio de forma mais natural. Afinal, a mãe é neuropsicóloga e logo viu os traços de altas habilidades no filho.

E os indícios foram vários e certeiros: com 11 meses, João aprendeu o alfabeto. Com 1 ano, as sílabas. E com 2 já estava plenamente alfabetizado e fazia alguns cálculos matemáticos.

“Ele começou a ficar muito avançado para a turma na escola que frequentava. Então, aos 2 anos, o dono da instituição permitiu que ele avançasse um ano em um período de adaptação e, posteriormente, permanecesse desse jeito, com a adição de atividades extracurriculares. Foi muito bom e produtivo. Agora, estamos com uma liminar para fazer a aceleração curricular dele”, conta.

Em vídeos divulgados na sua rede social, a neuropsicóloga de João acompanha o seu desenvolvimento. Confira, abaixo, o vídeo em que ele aprende francês com o uso de figuras:

 

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Como saber se meu filho é superdotado?

A Associação Brasileira para Altas Habilidades/Superdotados define esses indivíduos como “pessoas com talentos especiais”. “Talento entendido como a capacidade para o desempenho superior ao da média comparável, aliado à criatividade e ao envolvimento persistente com o que se gosta de fazer. Talento que pode manifestar-se em áreas diferentes (acadêmica, psicomotora, intelectual, lideranças, artes… ), isoladas ou combinadas”.

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A Teoria dos Três Anéis (Renzulli, 1986) compreende a superdotação como resultado da interação de três componentes: habilidade acima da média, criatividade e envolvimento na tarefa

Reprodução/Gov

A associação aponta algumas características de crianças que podem estar relacionadas à superdotação:

  • Rapidez e facilidade para aprender, abstrair ou fazer associações;
  • Criatividade;
  • Capacidade para analisar e resolver problemas;
  • Independência de pensamento;
  • Habilidade excepcional para esportes, música, artes, dança, informática ou outros talentos
  • Curiosidade e senso crítico exagerados;
  • Senso de humor;
  • Investimento nas atividades de interesse e descuido com as demais;
  • Bom relacionamento social e liderança;
  • Aborrecimento com a rotina;
  • Hipersensibilidade.

É bom também ficar ligado nas habilidades e comportamentos mais específicos de crianças com superdotação:

  • Muitos aprendem a ler mais cedo do que as crianças de sua idade, apresentando uma melhor compreencão das nuances da linguagem… é frequente que leiam com maior rapidez, mais intensidade e apresentam vocabulários amplos;
  • Geralmente aprendem habilidades básicas melhor mais rapidamente, e com menor número de exercícios práticos;
  • Frequentemente são capazes de identificar e interpretar dicas não verbais, elaborando interferências que outras crianças dependem de adultos para fazer;
  • Têm menor aceitação de “verdades prontas”, buscando “os comos” e os “por ques”;
  • Apresentam melhor habilidades de trabalho independente, mais cedo e por períodos de tempo mais longos que outras crianças;
  • Podem manter períodos de concentração e atenção longos do que seus;
  • Seus interesses são, frequentemente, tanto amplamente ecléticos como intensamente focalizados;
  • Frequentemente apresentam energia interminável, que as vezes conduz a um diagnóstico errôneo de “hiperatividade”’;
  • São geralmente capazes de responder e de se relacionar bem com os pais, professores e outros adultos. Eles podem preferir a companhia de crianças mais velhas e de adultos. Ao invés da companhia de seus colegas da mesma idade;
  • Eles são sempre motivados a examinar aquilo que é bem comum, sendo altamente inquisitivos (fazem muitas perguntas, buscando compreensão do fenômeno).

Direitos reservados aos superdotados

A Constituição Federal reserva direitos específicos para indivíduos com altas habilidades. De acordo com o advogado Fabrício Posocco, a legislação brasileira assegura ao estudante superdotado o direito ao enriquecimento curricular, aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar e o acesso a professores com especialização adequada para atendimento e integração.

“Quando essas regras não são cumpridas, os pais ou responsáveis podem recorrer ao Poder Judiciário. Grande parte das ações que tramitam na Justiça são para aceleração de série ou matricular estudantes aprovados em universidades antes de concluir o ensino médio”, afirmou ao Metrópoles.

Os demais direitos são majoritariamente previstos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que regulamenta o ensino no Brasil. “Ela garante, em seu artigo 4º, inciso III, atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, transversal a todos os níveis, etapas e modalidades, preferencialmente na rede regular de ensino”, comenta.

Posocco aponta a Lei 13.234/2015 como fundamental, uma vez que torna obrigatória identificação identifiquem, cadastro e oferecimento de apoio aos superdotados. O advogado destaca também a meta do Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/2014), que é “oferecer até 2024 um atendimento especializado, inclusivo, e com salas com recursos multifuncionais, públicos ou conveniados para estudantes de 4 a 17 anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação”.

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