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Armar a população não causou queda na violência, dizem especialistas

Pandemia, conscientização e trabalho da polícia foram mais importantes para diminuição em 7% no número de assassinatos em 2021

atualizado

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Rod Waddington
armas revolver
1 de 1 armas revolver - Foto: Rod Waddington

A queda no número de mortes violentas intencionais de 2020 para 2021 é algo a ser comemorado. E também explicado porque é o menor índice de toda a série histórica do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com dados desde 2007. Encontra-se a razão e, a partir daí, pode-se tentar repetir o cenário para que os assassinatos continuem em baixa.

O problema, dizem especialistas ouvidos pelo Metrópoles, é fazer uma conexão muito rápida entre essa queda e a abertura para a concessão de armamentos entre os brasileiros. Sim, pode ter uma certa influência, eles apontam, mas não estão nem de longe entre as principais razões.

Grande incentivador das armas de fogo, o presidente Jair Bolsonaro (PL) relacionou o aumento de armas de fogo com a redução nos assassinatos. Foram 41,1 mil mortes violentas intencionais no país em 2021, ou seja, 3 mil a menos que em 2020. Bolsonaro citou especificamente um levantamento feito pelo G1, que aponta uma queda de 7%.

A própria pesquisa do G1 aponta que a profissionalização do mercado de drogas brasileiro; o maior controle e influência dos governos sobre os criminosos; o apaziguamento de conflitos entre facções; as políticas públicas de segurança e sociais; e a redução do número de jovens na população tiveram muito mais influência na diminuição de mortes violentas intencionais.

E há mais: a pandemia, a conscientização dos novos portadores de armas e o trabalho da polícia.

Bolsonaro, no entanto, acredita que a queda vem do medo dos bandidos. Em um vídeo gravado e divulgado por um canal simpatizante ao presidente, ele fala sobre isso. “Vocês viram que os homicídios com armas de fogo caíram. Menor número histórico. A imprensa não fala que caiu. Entre outras coisas, com a liberação das armas para o pessoal de bem, o cara pensa duas vezes antes de fazer besteira”, pontuou o chefe do Executivo federal.

“Agora, se tivesse aumentado, quem seria o culpado?”, completou Bolsonaro, em conversa com os apoiadores que o aguardavam no Palácio da Alvorada.

O que dizem os especialistas

O Metrópoles procurou pesquisadores para detalhar a situação. Um deles, o especialista em segurança pública e privada Leonardo Sant’Anna, lembrou primeiro da quantidade de colecionares, atiradores e caçadores no Brasil, de quase 400 mil. Segundo ele, configura quase o mesmo número de policiais no país, que são cerca de 415 mil.

“O controle desse público, portanto, chega como um desafio e carece de uma revisão e melhoria por parte do Exército Brasileiro”, diz Sant’Anna. Ainda assim, o especialista defende que o aumento de armas pode sim ter afetado a redução da violência, já que as pessosas que cometem crimes violentos “avaliam o risco como um dos pontos de construção de suas ações”.

Para Leonardo, porém, existem outras variáveis que influenciaram a respectiva redução, sendo a principal, segundo ele, a pandemia de Covid-19. Ela trouxe a redução de interações sociais, “com menos eventos de lazer públicos e privados, menor circulação de veículos e o fechamento dos bares”.

Há também a conscientização daqueles que conseguem a licença para portar armas. É a opinião da advogada especialista em direito penal Jessica Marques, do Kolbe Advogados e Associados. Para ela, essas pessoas sabem as consequências administrativas e penais decorrentes da má utilização da arma de fogo.

Isso é verdade, porque precisam preencher todos os requisitos previstos na legislação e nos regulamentos da Polícia Federal e do Exército, além de passar por testes de capacidade técnica e psicológica. “Sempre estaremos diante de uma via de dois sentidos, pois o armamento do cidadão repele a ocorrência contínua de crimes externos, como roubo, homicídios, furtos, entre outros. Contudo, poderá ser o estopim para o agravamento das situações decorrentes das relações interpessoais”, salienta.
Já Moisés Martins advogado criminal, ex-delegado da Polícia Civil do Distrito Federal e especialista em segurança pública, explica que uma análise qualitativa explicaria melhor os fatores que levaram à redução, segundo ele. De acordo com o especialista, o fator que mais colaborou para a redução, foi a elucidação rápida dos crimes, e consequentemente, a prisão de seus autores.
“Analisando o número, ainda ficamos em choque, porque comemoramos uma redução de 3 mil mortes em um universo de 41 mil mortes. O Brasil é um país violento, no qual se mata gratuitamente”, refletiu.

As armas em números

É importante destacar que o levantamento não considerou as mortes em decorrência de intervenção policial. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2020 foram 6,4 mil pessoas mortas pelas forças de segurança no país, o maior número da série histórica.

Atualmente, segundo dados do institutos Sou da Paz e Igarapé, a quantidade de licenças para usar armas no Brasil cresceu 325% nos últimos três anos. Além disso, o país atingiu a marca de mais de 1,85 milhão de CACs (colecionadores, atiradores esportivos e caçadores), licenças específicas concendida pelo Exército Brasileiro.

A quantidade de armas que atiradores esportivos e caçadores podem adquirir, de acordo com a lei, varia de 30 a 60 armas e até 180 mil balas. Para colecionadores, o limite de armas não é explicito, mas limita a compra de até cinco peças do mesmo modelo.

As flexibilizações governamentais na legisação de importação de armas representou um aumento de 33% se comparados os anos de 2020 e 2021. Segundo levantamento do BBC Brasil, foram importados cerca de US$ 51,9 milhões, em 2021, contra US$ 38,9 milhões, em 2020

Ainda segundo o Instituo Sou da Paz, as lesões por arma de fogo representaram, em 2020, um prejuízo de R$ 33,3 milhões à saúde pública, já que naquele ano, as armas de fogo foram responsáveis por mais de 14,9 mil internações em decorrência de ferimentos dessa natureza.

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