Após vacinação em massa, Serrana vê mortes e casos por Covid desabarem
Em Serrana, queda de 85,7% no número de óbitos em relação aos primeiros 10 dias de março indica poder da Coronavac contra a variante P1
atualizado
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Serrana (SP) – Um mês após o fim da fase de vacinação do Projeto S, a cidade de Serrana (SP) vê os registros de casos, internações e mortes por Covid-19 desabarem. O número mais significativo é o da queda de óbitos.
Em março, no auge da segunda onda de Covid-19, sem pessoas plenamente imunizadas, 19 morreram de Covid-19 em Serrana. Em abril, foram seis óbitos. E agora, nos primeiros 10 dias de maio, uma pessoa morreu por causa da doença.
A imunização plena com a Coronavac ocorre, em média, duas semanas após a aplicação da segunda dose da vacina.
Quando comparados os 10 primeiros dias de maio e o mesmo período de março, verifica-se que o número de óbitos caiu de sete para um, isto é, houve queda de 85,7%.
O Metrópoles apurou que atualmente a variante P.1, também conhecida como variante brasileira e com origem em Manaus, é a que predomina nos diagnósticos de Covid-19 em Serrana, o que pode indicar a capacidade da Coronavac em combater essa linhagem de vírus que provocou a onda mais letal da pandemia no país.
As primeiras conclusões oficiais do estudo do Projeto S só serão divulgadas pelo Instituto Butantan a partir do dia 30 de maio.
Um dos pesquisadores do Projeto S e diretor de Atenção à Saúde do Hospital Estadual de Serrana, Gustavo Jardim Volpe afirma que, apesar da queda expressiva de internações e óbitos, o Projeto S ainda está trabalhando nas análises. “Um estudo clínico precisa de dados consolidados. Cada evento no estudo demanda uma análise de muitas variáveis em cadeias de informação. Isso demanda tempo e rigor”, afirma.
Entre essas variáveis, estão desde rotinas de exposição ao vírus até a identificação de outras patologias que podem afetar o sistema imune, como câncer.
Evidências
A vice-prefeita e secretária de Saúde de Serrana, Leila Gusmão, recebeu o Metrópoles na Unidade de Pronto Atendimento (UPA), que é a porta de entrada da rede pública de saúde da cidade.
“Menos pessoas estão desenvolvendo sintomas graves da Covid-19, precisamos ainda fechar o mês, mas hoje estimamos uma queda de 60% nos casos. Não é um número definitivo, há uma semana, essa taxa era de 50%. À medida que vai aumentando, vamos ficando mais otimistas”, declara Leila. A pasta também notou menos disseminação do vírus em pessoas mais jovens. Veja vídeo:
Para a vice-prefeita, a diminuição de casos com sintomas é evidente também na quantidade de pessoas que estão buscando os testes para a doença. “Em março, a cidade fazia até 150 exames para Covid-19 diariamente; hoje registramos entre 30 a 40 coletas.”
Serrana, em conjunto com o Projeto S, estabeleceu uma rede de testagem de fácil acesso. Qualquer pessoa pode se dirigir aos vários laboratórios da cidade e se submeter ao exame RT-PCR gratuitamente, com resultado em menos de 24 horas.
A interventora administrativa da Santa Casa de Serrana (cargo equivalente ao de direção), Ângela Maria Reis Antero, afirma que neste mês o hospital registrou apenas duas internações – ante sete em abril e 33 em março.
“Desde abril não temos casos que necessitam de intubação aqui na Santa Casa. Os casos internados foram de pessoas que apresentaram uma Covid amena, mas preferimos deixá-las em observação por outros fatores, como idade avançada ou um sistema cardiorrespiratório que já era comprometido antes da doença”, declarou Ângela.
Segundo a Secretaria de Saúde de Serrana, atualmente há nove serranenses internados na cidade; eram 14 no dia 21 de abril. Tanto as circunstâncias do óbito de maio quanto as desses internados estão sendo estudadas pelo Projeto S.
Gustavo Volpe afirma que as internações, ainda mais de casos amenos, não significam uma suposta má eficiência da vacina. “Uma analogia legal para a vacina é a do bom goleiro. O vírus vai chutar muitas vezes para o gol, mas a vacina vai segurar. Uma vez ou outra, esse goleiro pode acabar deixando algo passar. Isso é natural. O que queremos é que, ao fim da partida, o jogo esteja ganho”, diz o pesquisador do Projeto S.
Com a diminuição do número de casos graves, o sistema de saúde da cidade ficou desafogado e passou a tratar mais pacientes com Covid de localidades vizinhas.
O Metrópoles acompanhou a alta médica do lavrador Valdeci da Silva no Hospital Estadual de Serrana. “Estou bem, graças a Deus, agora estou voltando pra família, obrigado”, disse ele, que é morador de um acampamento do Movimento Sem-Terra nos arredores de Jaboticabal.
Efeito da vacina ou da restrição de circulação?
Apesar das boas notícias, dúvidas ainda pairam sobre os moradores de Serrana. Gestantes e mulheres que tinham acabado de dar à luz não puderam receber a vacina pelo Projeto S, e agora esperam a imunização por meio do Programa Nacional de Imunização. No entanto, a vacinação desse segmento da população ficou prejudicada depois da divulgação do registro da morte por trombose de uma gestante após ter recebido a vacina AstraZeneca.
Outra questão muito indagada pelos moradores da cidade ouvidos pela reportagem foi sobre a volta à vida normal: aquela sem máscara, com passeios e abraços.
“Pergunta lá para os médicos se a doença acalmou porque a vacina é boa mesmo ou porque ficamos aqui quietinhos na nossa toca”, pede o comerciante Valdemar Martins, de 73 anos, que diz que foi o vacinado “número 10” de sua região.
Gustavo Jardim Volpe, médico pesquisador do Projeto S, afirma que a resposta para Martins não é simples, mas que o desenho do estudo do Projeto S poderá responder a essa questão em breve.
“Nós dividimos a cidade em regiões que chamamos de cluster ou conglomerado. Por meio de um inquérito sorológico [testagem em massa], nós sabemos a incidência do vírus em cada conglomerado, sabemos a taxa de vacinação e agora também estamos analisando a taxa de infecções e as características das internações.”
“Como a imunização de cada cluster ocorreu em períodos distintos, com uma semana de diferença, o que esperamos é que haja uma queda de casos escalonada no tempo e proporcional à quantidade de pessoas vacinadas. Se isso acontecer, poderemos dizer que houve um efeito da vacina”, segue o médico.
“Para saber se o efeito foi influenciado pelas medidas de restrição de circulação, estamos analisando também os dados epidemiológicos das cidades vizinhas. Só depois de cruzar todas essas informações poderemos dar uma resposta consistente a essa questão do senhor Valdemar”, finaliza.
Sobre o Projeto S
Serrana é uma cidade da região metropolitana de Ribeirão Preto e tem 45.644 mil habitantes, dos quais 27.150 foram vacinados pelo Projeto S, pesquisa científica do Instituto Butantan que busca medir a efetividade da vacina Coronavac “na vida real”.
Somando as pessoas que foram vacinadas pelos programas públicos de vacinação, a taxa de imunização geral na cidade é de 65,3%, o que torna Serrana o município mais vacinado do estado de São Paulo. A taxa ideal de vacinação de uma população para o combate de doenças como a Covid-19 é acima de 70%.