Após três meses, 61% dos profissionais de saúde não foram vacinados
Isso significa que três em cada cinco trabalhadores da área, considerada prioritária na fila da imunização, não estão protegidos
atualizado
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Perto de completar três meses desde a aplicação da primeira dose da vacina contra a Covid-19, o Brasil imunizou apenas 39% dos profissionais de saúde que atuam no país. Os dados, levantados até a última sexta-feira (9/4) são do Ministério da Saúde. Isso significa que três em cada cinco trabalhadores da área, considerada prioritária na fila da imunização, não estão protegidos contra o coronavírus.
Ao todo, 2,6 milhões dos 6,6 milhões de profissionais já tomaram a segunda dose de alguma das vacinas disponíveis contra a Covid-19 no país. Para estar devidamente imunizado contra o vírus, as fabricantes tanto da Coronavac quanto da Covishield recomendam duas doses. O problema, entretanto, está justamente na falta de imunizantes no país.
Segundo o Plano Nacional de Imunização (PNI), no grupo estão todos aqueles que atuam em espaços e estabelecimentos de assistência e vigilância à saúde, sejam eles hospitais, clínicas, ambulatórios, laboratórios, entre outros. Nele, estão contemplados tanto os profissionais da saúde quanto os trabalhadores de apoio (como recepcionistas e seguranças).
Na última semana, o Instituto Butantan, ligado ao governo de São Paulo, paralisou o envase da Coronavac enquanto espera a chegada de mais IFA (Ingrediente Farmacêutico Ativo), a matéria-prima da vacina contra Covid-19. Em alguns locais, como o Distrito Federal, a fila da vacinação sofre com interrupções de determinados grupos, uma vez que o estoque de imunizantes está acabando.
Carla*, 33 anos, é uma das profissionais que, mesmo com exposição contínua ao coronavírus, ainda não recebeu a vacina. Psicóloga na cidade de Macaé, a 180 km do Rio de Janeiro, a profissional atende crianças e jovens em risco de vida, um trabalho que não parou em nenhum momento durante a pandemia, ao contrário, só cresceu.
Portadora de três doenças autoimunes, Carla tem entre os pacientes crianças com tendências ou que já tentaram o suicídio. A profissional, que participou de um projeto do governo do estado para atender jovens que ficaram órfãos devido à Covid-19, diz viver em situação de insegurança.
“De vez em quando eu preciso atender crianças com autismo que não podem usar máscara. Várias vezes eu já tive que dar um tempo no atendimento porque algum paciente deu positivo para a Covid. É horrível ver uma criança como uma possível ameaça”, lamenta.
No último dia 27, uma denúncia feita por vereadores de Macaé mostrou que profissionais de apoio da unidade hospitalar da Unimed teriam tomado doses da vacina. Entre eles, estariam recepcionistas, chefes de comunicação e um pintor.
Em nota, a Unimed alegou que os profissionais fazem parte do grupo de apoio do hospital e que receberam apenas o excedente das doses naquele dia.
A Prefeitura de Macaé abriu uma sindicância para apurar o caso. Segundo o município, apenas profissionais de saúde com mais de 40 anos e idosos com 65 anos estão sendo imunizados.
Em todo país, relatos de fura-filas da vacinação foram denunciados. Em janeiro, o caso de duas irmãs que tomaram vacina contra a Covid-19 logo após serem nomeadas para trabalhar na área administrativa de uma Unidade Básica de Saúde de Manaus, ganhou destaque no noticiário. Médicas, as duas jovens são filhas do empresário Nilton Lins, que atua no ramo da educação no estado. O Ministério Público do Amazonas chegou a pedir o afastamento e a prisão do prefeito de Manaus, David Almeida (Avante). Ele segue no cargo.
Diante das inconstâncias na lista de vacinações no país, Marco Aurélio Sáfadi, médico infectologista da Santa Casa de São Paulo e um dos especialistas consultados pelo Ministério da Saúde para a elaboração do PNI, acredita que o grande problema está na falta de imunizantes em todo o país.
“É urgente a aquisição de mais vacinas, e é urgente que a gente negocie para obter mais imunizantes. Isso protege a população e cria obstáculos contra variantes”, defende.
Segundo o especialista, a velocidade da vacinação está muito baixa com relação à capacidade e o histórico que o país tem em programas de imunização nacional. Em março, a média de doses aplicadas foi de 361.404 ao dia.
Sáfadi afirma que nós já poderíamos estar muito mais avançados. Em 2017, o Brasil chegou a ancorar a listagem de países com maior cobertura de vacinas em todo o mundo, segundo dados do Instituto de Métricas e Avaliação de Saúde (IHME) da Universidade de Washington, publicados na revista científica The Lancet.
“Se nós tivessemos vacinando 1 milhão de pessoas por dia, nós já teríamos todos os profissionais de saúde imunizados”, conclui.