Após polêmica, Saúde recua de mudança no registro de mortes por Covid
Horas após governos de SP e MS denunciarem mudanças, conselhos de secretários pediram ao governo que desistisse da alteração
atualizado
Compartilhar notícia
Após polêmica causada pela mudança na forma que o Ministério da Saúde registra as mortes por Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, a pasta recuou da medida.
Nesta quarta-feira (24/3), depois que estados reclamaram das alterações, os conselhos nacionais das Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) e de Secretários de Saúde (Conass) afirmaram que o governo federal desistiu da modificação.
“O que ocorreu foi uma falta de comunicação adequada no momento em que foi colocada a funcionalidade em produção no referido sistema e, por este motivo, solicitamos a retirada desses campos como obrigatórios por enquanto”, afirma o Conasems em nota.
Segundo a entidade, a nova forma de registrar estes óbitos já estava em discussão, por causa da “necessidade de aprimoramento nas informações coletadas”.
Em nota, o Conass destacou que a medida pegou gestores de surpresa. “Isso viabilizaria um período de transição para adequação do registro destas informações nos serviços de saúde”, destaca trecho do texto.
O documento salienta: “A solicitação ocorreu pela ausência de comunicado aos estados e municípios em tempo oportuno. Houve o compromisso do ministério de que a solicitação será atendida ainda hoje [quarta-feira]”.
A modificação, na prática, poderia impactar na notificação os óbitos por Covid-19. Passaram a ser exigidos o Cadastro de Pessoas Físicas (CPF), o número do Cartão Nacional de Saúde (CNS) e um registro sobre se a pessoa havia sido vacinada contra a doença.
O Metrópoles questionou o Ministério da Saúde sobre as mudanças e o recuo, mas não obteve resposta. O espaço continua aberto a esclarecimentos.
Veja a nota do Conasems e do Conass sobre o recuo da mudança:
O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) esclarecem que solicitaram ao Ministério da Saúde a retirada temporária da obrigatoriedade do preenchimento dos campos CPF ou Cartão Nacional de Saúde (CNS), nacionalidade e imunização do paciente internado no sistema Sivep Gripe (Sistema de Informação de Vigilância de Gripe), onde são inseridos dados de casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave – SRAG e óbitos provocados por Covid-19.
Isso viabilizaria um período de transição para adequação do registro destas informações nos serviços de saúde.
A solicitação ocorreu pela ausência de comunicado aos estados e municípios em tempo oportuno. Houve o compromisso do ministério de que a solicitação será atendida ainda hoje.
As mudanças
A mudança, que agora não mais vai acontecer, chegou a ser feita nas fichas cadastrais que o Ministério da Saúde repassa às secretarias estaduais de Saúde. Lá, os agentes de vigilância em saúde preenchem o formulário, que posteriormente é digitalizado. A mais recente mudança na ficha ocorreu em julho de 2020.
A exigência das informações ocorreu um dia após o país registrar o dia mais letal da pandemia. Em 24 horas, 3.251 pessoas morreram por causa da Covid-19.
O Brasil tem mais de 12,1 milhões de casos confirmados do novo coronavírus e 298 mil óbitos em decorrência da doença. O Ministério da Saúde aplicou 15,2 milhões de doses da vacina (entre primeira e segunda doses).
“Retardo”
Uma fonte da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) do Ministério da Saúde afirmou ao Metrópoles que o preenchimento das informações pode “retardar” o registro de mortes.
“Nem sempre o paciente está com o CPF ou o CNS. Em alguns casos, a pessoa nem tem o cadastro. Isso fará com que o profissional leve mais tempo para efetuar o registro. Isso em um momento que as internações e mortes estão ocorrendo em volume acelerado”, ponderou.
O que mudaria para o registro:
- Será exigido o CPF do paciente.
- O preenchimento do número do CNS passa a ser obrigatório.
- A ficha terá que ter a notificação de vacinação do paciente.
- Se o paciente for estrangeiro, o profissional deverá fazer a ressalva.
Segundo a fonte, o atraso no preenchimento da ficha tem impacto direto na contagem de óbitos pelas secretarias estaduais de Saúde, o que deixa inconsistente a atualização diária do boletim da Covid-19 produzido pela pasta.
Os governos de São Paulo e de Mato Grosso do Sul reclamaram publicamente das alterações. No caso de São Paulo, por exemplo, o número de mortes registradas na terça-feira (23/3) foi de 1.021, recorde de toda a pandemia até agora. Nas últimas 24 horas, com a troca no sistema, contudo, os registros desabaram e ficaram em 281.
O Sivep-Gripe é o sistema oficial onde todas as novas hospitalizações por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) devem ser compulsoriamente notificadas desde 2009. Com a pandemia de Covid-19, a plataforma passou a ser usada como a fonte oficial das mortes confirmadas pela doença.
Essa é a segunda vez que o governo federal anuncia mudanças na forma de contabilizar mortes por Covid-19. Em junho do ano passado, o Ministério da Saúde passou a analisar casos e mortes por data de ocorrência.
A mudança provocou uma série de reações da comunidade médico-científica. A medida foi entendida como uma tentativa do governo de “maquiar” os números referentes à pandemia.