Após morte de Carlos Alberto Filgueiras, vida segue no hotel Emiliano
Um dia após a queda do avião que matou o dono da rede, o ministro Zavascki e outras 3 pessoas, a rotina no hotel de luxo seguia inabalável
atualizado
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Enviada especial a São Paulo – Quem chega ao hotel Emiliano, na rua Oscar Freire, em São Paulo, não imagina que o fundador, Carlos Alberto Fernandes Filgueiras, morreu, na última quinta-feira (19/1), em uma tragédia de repercussão internacional.
Ao menos, é essa a sensação que os funcionários, rigorosamente treinados, passam para os hóspedes. Uma das poucas coisas que indicam o luto é uma nota que aparece nos computadores do Business Center, elaborada pelos assessores da rede, lamentando o falecimento do empresário e afirmando que o atendimento vai continuar da forma como ele ensinou.
O serviço cinco estrelas fez com que o Emiliano virasse o queridinho de artistas, empresários e casais em lua de mel. Os visitantes são paparicados com cortesias e brindes exclusivos. Ao andar pelo hall imponente do lugar, o hóspede é chamado pelo nome como se todos os funcionários o conhecessem.
Na suíte luxo, o cliente é recepcionado com uma garrafa de vinho espanhol Viñamalea e um vale para tomar uma taça de espumante nacional no bar localizado perto da recepção. Há ainda um prato de frutas da estação cortadas em finas tiras e sandálias Havaianas personalizadas com o nome “Emiliano”.
Também é parte do pacote de qualquer pessoa que faça o check-in uma massagem de 15 minutos no SPA Santapele. E, por fim, um café da manhã colonial, servido no quarto ou no restaurante.
A cesta de pães doces e croissants não deixa a desejar às boulangeries mais refinadas de Paris. Para acompanhar os quitutes: queijos, presunto, manteiga e três variedades de geleia apresentadas em elegantes louças brancas.
O Metrópoles se hospedou no Emiliano um dia após o acidente aéreo, que também tirou a vida do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki e de outras três pessoas. Não há no hotel de Filgueiras choros baixinhos ou cochichos de hóspedes curiosos. Funcionários evitam falar sobre como reagiram à notícia do desastre, nem mesmo quando questionados por alguém mais interessado.
“Filgueiras era muito alegre, bastante engraçado e criterioso. Ficamos abalados, mas a forma de homenageá-lo é continuar trabalhando da maneira como ele sempre pediu. Vamos seguir sorrindo e dando o nosso melhor”, comentou uma das poucas funcionárias que se atreve a tocar no assunto. Afinal, a instrução da gerência é manter a rotina como se nada tivesse acontecido.
Também não houve alteração no fluxo de turistas. Os estrangeiros ocupam a maior parte dos 56 quartos — há três suítes em cada andar. E são eles que ajudam a manter a normalidade. A maioria desconhece a maneira trágica como morreu o dono do local, que circulava ali quase diariamente.Assim, apesar da comoção nacional com a queda do avião vitimando cinco pessoas, no reduto de luxo criado por Filgueiras, que iniciou a vida no garimpo de Serra Pelada, o ambiente de prosperidade segue seu curso. Quem pretende desfrutar das instalações do hotel Emiliano precisa desembolsar, pelo menos, R$ 1.450, por diária. Mas para se hospedar na suíte que fica dentro de um cubo de vidro, com dois andares e uma área de 135m², terá de se programar para investir R$ 8 mil por noite.
Os hóspedes mais exigentes podem comprar travesseiros novos por R$ 1.400. Os acessórios, que dariam para bancar estada de uma semana em muitos hotéis por aí, ficam expostos na cama do hotel Emiliano vestida com lençóis de algodão egípcio que levam a marca própria do lugar.
O luxo aparece onde menos se imagina. O vaso sanitário, por exemplo, tem um sistema japonês que aquece o assento, controla o fluxo da água e o transforma em bidê. É preciso de orientação do concierge para usá-lo.
O funcionário também explica que a luz da suíte acende devagar para não causar um impacto aos olhos. Ensina como abrir a cortina eletrônica e indica os passos para a Apple TV disponível. As cadeiras do lugar são feitas de cordas douradas e levam a assinatura dos irmãos Fernando e Humberto Campana.
Com 80 opções de espumantes, o Champagne Bar e Caviar, no Emiliano, era um dos locais preferidos do ministro Teori Zavascki, que desde 2012 se hospedava frequentemente no hotel. Foi nesse ambiente que ele e o empresário iniciaram uma estreita amizade. Apreciadores de vinhos, charutos e arte, os dois já trocaram muitas ideias saboreando o tinto chileno Almaviva.
Um dia após a morte dos amigos, próximo da mesa onde costumavam se sentar, um pai, acompanhado da mulher e dos dois filhos, pediu o prato da casa, o robalo pescado em Paraty (RJ).
Um garçom comentou com a reportagem que o avião no qual as cinco pessoas morreram era usado com frequência para abastecer de peixes frescos os hotéis da rede Emiliano.
Ali perto da família, entre um drinque e outro no Lobby Bar, instalado no térreo do hotel, um casal se beijava entusiasmadamente. A cena era emoldurada por um sofisticado jardim de orquídeas suspensas. No mundo de luxo e de beleza, a morte de Filgueiras e do ministro relator da maior investigação sobre corrupção do país parecia mesmo um acidente de percurso.