Análise: se o Enem foi neutro, o ministro preferiu polarizar
Se a prova conseguiu evitar posturas ideológicas, o que é positivo, o ministro não se aguenta. A sua fala é mais uma teoria da conspiração
atualizado
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O primeiro Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) do governo de Jair Bolsonaro (PSL) trouxe boas novas. Foi uma prova considerada “neutra” por muitos especialistas. O tema da redação, “Democratização do acesso ao cinema no Brasil” surpreendeu. Quem esperava uma prova ideológica, acabou não encontrando.
O mesmo não pode ser dito do ministro Abraham Weintraub. Tão logo assumiu os microfones na coletiva de imprensa feita após o exame, Weintraub destilou ideologia.
Um trecho da prova acabou vazando, o que foi confirmado pelo Ministério da Educação (MEC). O ministro, antes mesmo de qualquer apuração da polícia, chegou a uma conclusão própria: trata-se de alguém que quis prejudicar o governo. A razão? Não, sobre isso ele não falou.
“Ninguém foi lesado, mas houve a tentativa de colocar em xeque o Enem”, afirmou o ministro, acrescentando que “agora, ele [culpado] vai ter que responder na Justiça”.
Quem, e qual o interesse, de alguma pessoa em colocar em xeque o Enem ou qualquer outro aspecto do atual governo?
O interesse pelos últimos movimentos é do próprio governo. Com o estilo caótico-brigão, Bolsonaro e seus ministros apostam no conflito constante como forma de governar e manter a tropa arregimentada.
Não é a primeira acusação que o ministro faz sem muitas bases. Como mostrou o repórter Otávio Augusto, em reportagem publicada pelo Metrópoles no fim de semana, Weintraub fez denúncias no passado que, na hora de ser investigada, revelou que “a montanha pariu um rato”.
Foi assim com a suposta “invasão de hackers” dos sites ligados ao MEC. Iniciada a investigação e passados três meses, nada foi revelado. O conflito, porém, estava lá. Era como se bastasse. A verdade fica em segundo plano. A narrativa para manter a tropa a postos vale mais.
Com a busca pela neutralidade no Enem, o ministro poderia ter comemorado um gol de sua administração. Mas um gol não basta. Ele quer cabecear, fazer gol, e ser líder de torcida ao mesmo tempo. Na guerra de narrativas, quem perdeu foi o compromisso com a verdade.