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Amazônia e Pantanal: como fumaça de queimadas se espalha pelo Brasil

Sistema complexo permite fumaça viajar pelo Brasil e levar poluentes. Fenômeno se repete anualmente e é motivo de preocupação

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Marizilda Cruppe/Anistia Internacional
Imagem colorida mostra queimada de vegetação - Metrópoles
1 de 1 Imagem colorida mostra queimada de vegetação - Metrópoles - Foto: Marizilda Cruppe/Anistia Internacional

As nuvens de fumaça, que se avolumam com a elevação do número de queimadas no Brasil nesta época do ano, têm chamado a atenção da população em geral. O fenômeno impressiona por causa da complexidade do sistema que faz com que o resultado do fogo no Norte do país viaje tantos quilômetros rumo ao Sul e Sudeste.

Embora complexo, o fenômeno acontece por meio de um mecanismo semelhante ao que faz chegar umidade da Amazônia nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. O aspecto mais popular do sistema é conhecido por “rios voadores”.

A doutora em física e pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) Karla Longo explica que a ocorrência do fenômeno começa com a seca. “Durante a estação seca, essa Zona de Convergência Intertropical (ZCit) se posiciona ao norte. No momento, está fora do continente. Quando este sistema se move, você cria uma situação de baixa precipitação na região que favorece a ocorrência queimadas”, detalha.

Além da seca, a Alta Subtropical do Atlântico Sul (Asas) tende a se deslocar e se firmar no centro do Brasil. É uma conjuntura que favorece as queimadas, mas também dificulta a dispersão dos poluentes.

Karla explica que quando o fogo queima a vegetação na Amazônia, o calor pode criar uma “coluna de convecção”. É como se fosse um canal que faz a fumaça se deslocar para o alto. Em casos mais severos, a altura pode chegar a até 3 ou 4 quilômetros.

“Aqui na região Nordeste do Brasil se queima muito, mas quando você olha fumaça, não tem nesta região (…). O que acontece é que você tem os ventos alíseos, que nesta época são tipicamente de Leste e de Sudeste. É uma massa de ar limpa, que entra rapidamente limpando essa região e empurra esta fumaça em direção ao Oeste”, explica Karla Longo.

Paredão

Os ventos alíseos que partiram do Oceano Atlântico fazem com que a fumaça chegue até a barreira dos Andes. Na região, há atuação dos jatos de baixos níveis. Eles ficam em uma altitude menor do que a que pode chegar a “coluna de convecção”.

São estes jatos que levam, fora do período seco, a umidade para as regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste. O mecanismo é importante para a formação de chuvas nestas regiões. Neste momento, a fumaça causada pelas queimadas do Pantanal também acaba se deslocando por meio dos jatos de baixos níveis.

Imagem colorida do deslocamento da fumaça

Quando há a atuação de uma frente fria, esta funciona como uma barreira e desloca a fumaça para o Oceano Atlântico, passando pela região Sudeste. Sem a frente fria, as partículas resultantes do fogo chegam mais facilmente ao Sul do País. “Tem um fenômeno que o pessoal da meteorologia chama de friagem. Você tem um vento aqui em direção ao Norte, empurrando também esta fumaça em direção ao Norte”, completa Karla Longo, ao ressalvar que há uma variabilidade como um todo no deslocamento da fumaça.

Os jatos de baixos níveis viajam a velocidades de até 20 metros por segundo, o que equivale a 72 quilômetros por hora, conforme explica a doutora em ciências atmosféricas, pela Universidade de São Paulo (USP), Taciana Toledo de Almeida Albuquerque.

“A velocidade mais alta dos jatos de baixos níveis é a 1.500 metros de altura. Então, mesmo transportando poluentes na atmosfera oriundos das queimadas, não necessariamente esses poluentes vão atingir a gente aqui na superfície”, explica Taciana.

A especialista acrescenta que esta poluição na atmosfera altera outros fenômenos porque ela bloqueia a radiação solar. “Isto nos afeta diretamente quando tem uma chuva”, diz, ao explicar que a precipitação carrega estas partículas até a superfície.

Karla Longo enfatiza que o fato de ser uma repetição anual, o fenômeno das queimadas e da poluição não deve ser normalizado, e sim motivar mais preocupação, inclusive para a saúde. “Com a combustão, você tem a emissão de CO2, água, CO em menor quantidade, hidrocarbonetos, NO2 e a fumaça preta”. Além disso, os produtos das queimadas podem interagir e proporcionar a formação do gás ozônio (O3).

“O ozônio é um poluente formado na atmosfera. Isto eu estou falando do ozônio troposférico. Então, as queimadas da Amazônia também influenciam a formação de poluentes secundários. O ozônio é formado na atmosfera através de reações fotoquímicas de elementos que podem ser emitidos também nas queimadas”, explica Taciana, que também é professora do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Federal de Minas Gerais (UF-MG).

Em chamas

Os números de queimadas até esta sexta-feira (23/8) dão conta de 47.409 queimadas na Amazônia neste ano. O resultado é 78% maior do que o verificado no mesmo período de 2023, quando houve 26.616 ocorrências do tipo.

No Pantanal, bioma menor que a Amazônia, a situação é proporcionalmente mais dramática. O fogo aumentou 2.126% neste ano. Até 23 de agosto de 2023, foram 381 queimadas, mas no mesmo período deste ano já são 8.484.

Karla Longo afirma que a variação do fogo tem relação com várias circunstâncias. “Depende de vários fatores, do quanto a política de combate ao desmatamento é eficiente naquele ano, do preço da terra, de quanto o clima está mais seco naquele ano.”

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