Alunas desenvolvem absorvente biodegradável com custo de R$ 0,02
Produto foi feito com resíduos da agroindústria. Alunas pretendem criar cooperativa de mulheres para a produção
atualizado
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As alunas Camily Pereira dos Santos e Laura Nedel Drebes, que cursam o ensino médio no Instituto Federal do Rio Grande do Sul, em Osório (RS), criaram um absorvente biodegradável com um custo de apenas R$ 0,02. O produto foi desenvolvido por Camily Pereira dos Santos, sob orientação da professora Flávia Twardowski, para a Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace), que é realizada até 26 de março.
A ideia surgiu quando Camily descobriu que sua mãe, quando adolescente, não tinha acesso a absorventes e precisava recorrer a outros métodos durante seu período menstrual. Incomodada por essa ser a situação de muitas mulheres até hoje, ela se juntou à colega Laura para criar um produto com baixo custo.
Esse, no entanto, era apenas um dos problemas que as adolescentes queriam resolver. “Mulheres usam uma média de 10 mil absorventes na vida, que demoram de 100 a 500 anos para se decompor em função dos componentes plástico e aditivos químicos. Mas a menstruação ecologicamente correta ainda é um luxo”, explica Camily.
A partir desse empurrão, elas começaram a procurar formas de colocar a ideia em prática. Com base em uma pesquisa bibliográfica, as jovens contam que encontraram materiais que eram desperdiçados pelas empresas e que tinham um alto grau de absorção.
Após um ano de estudo, elas chegaram a um protótipo. O algodão foi substituído por dois tipos resíduos da agroindústria, a fibra do caule da bananeira e do açaí de juçara. Envolvendo o algodão, há um bioplástico, feito com resíduos de cápsulas de medicamentos da indústria nutracêutica. Por fim, o invólucro do produto é costurado com retalhos de tecidos das costureiras locais.
Segundo testes feitos pelas estudantes, o produto final tem poder de absorção muito maior e um custo de R$ 0,02, 95% mais barato do que o comercial. Nesse valor, já incluídos os custos diretos e indiretos da fabricação.
Camily e Laura contam que não pretendem parar com aí. “Nossa meta é criar uma cooperativa para a produção do absorvente”, explica Camily. “Entramos em contato com empresas, que assim como a nossa comunidade também serão beneficiadas, verificamos que o investimento é de R$ 5 mil para as empresas. Isso contribui com a promoção de suas ações sociais.”
“Para as mulheres, essa iniciativa é de suma importância para promover o pertencimento na comunidade, a geração de empregos e o empreendedorismo sustentável”, finaliza.
Projeto barrado por Bolsonaro
De autoria da deputada federal Marília Arraes (PT-PE), o Projeto de Lei (PL) nº 4.968/19, que institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, foi aprovado na Câmara dos Deputados em agosto do ano passado. No Senado, a aprovação ocorreu em setembro. Em outubro, porém, o governo federal vetou parcialmente 12 trechos do projeto. Desde então, o Congresso tentava marcar, sem sucesso, uma sessão para derrubada do veto presidencial.
Na oportunidade, Bolsonaro alegou que a proposição legislativa “contraria o interesse público, uma vez que não há compatibilidade com a autonomia das redes e estabelecimentos de ensino”.
O chefe do Executivo defendeu ainda que a proposta “incorre em vício de inconstitucionalidade” por não indicar uma fonte de custeio para a medida legislativa – o que, segundo o governo, viola da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
O Congresso Nacional derrubou, em sessão conjunta realizada em 10 de março, o veto do presidente, no entanto. A matéria vai à promulgação.
Decreto presidencial
Em resposta ao veto do projeto inicial, Bolsonaro editou um decreto para regulamentar a distribuição dos itens de higiene às mulheres em situação de pobreza menstrual. O ato de assinatura ocorreu durante evento comemorativo em alusão ao Dia Internacional da Mulher.
Serão R$ 130 milhões alocados para a distribuição de absorventes, para um público de 3,6 milhões de pessoas. Os produtos poderão ser entregues aos seguintes grupos:
- Mulheres de 12 a 21 anos de idade que cumprem medidas socioeducativas;
- Alunas matriculadas em escolas pactuadas no programa Saúde nas Escolas;
- Meninas e mulheres de 9 a 24 anos de idade, pertencentes a famílias beneficiárias do programa Auxílio Brasil.
Mesmo com a derrubada do veto, o entendimento de técnicos legislativos é de que não há conflito na coexistência do decreto e da legislação para regulamentar a distribuição. A lei tem prevalência sobre a norma editada pelo chefe do Executivo federal, uma vez que é mais ampla e institui um programa permanente. O decreto, por sua vez, tem caráter circunstancial.