AGU orienta governo a não pagar R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão
A AGU recomendou “interpretação mais segura” da decisão de Flávio Dino e orientou bloqueio total dos R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão
atualizado
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Parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF) orienta o governo a não pagar os R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão, liberadas pelo ministro Flávio Dino, até que haja decisão judicial que não deixe “dúvidas”. Em nova decisão publicada neste domingo (29/12), o ministro do STF liberou o pagamento de parte das chamadas emendas de comissão, as chamadas RP8, que são indicadas pelas comissões permanentes da Câmara e do Senado. Elas não são impositivas.
Dino defendeu a transparência sobre o uso dos recursos e o inquérito policial federal determinado por ele mesmo na última segunda-feira (23/12), afirmando que a necessidade de investigação “torna-se a cada dia mais nítida”. O ministro pediu um parecer da AGU sobre a abrangência da decisão e obteve resposta nesta segunda-feira (30/12).
“Não obstante a dúvida razoável, mostra-se, neste momento, prudente adotar-se a interpretação mais segura da decisão, no sentido de que, ao menos até ulterior esclarecimento judicial, não estão ressalvados os empenhos das emendas de comissão objeto do Ofício n. 1.4335.458/2024, ainda que anteriores a 23/12/2024 e ainda que em destinados à Saúde”, diz parecer da AGU.
Assim, a AGU determina que, até nova decisão judicial, sigam bloqueadas as emendas de comissão que não atendem aos requisitos de transparência previstos em lei. A AGU considerou a necessidade de haver uma decisão mais clara em alguns pontos, como:
- A decisão de 29/12/2024 declara a “nulidade insanável” do Ofício n. 1.4335.458/2024, enviado pela Câmara ao STF determinando ser “inviável sua acolhida e seguimento, de modo que ao Poder Executivo fica definitivamente vedado empenhar o que ali consta”. Em seguida, no entanto, diz que há ressalva, “quanto aos empenhos de “emendas de comissão” realizados antes da suspensão e que fica excepcionalmente admitida a continuidade da execução do que já foi empenhado como “emenda de comissão” até o dia 23 de dezembro de 2024.
- Há, portanto, segundo a AGU, uma dúvida razoável se esta ressalva alcança ou não as emendas de comissão objeto do Ofício n. 1.4335.458/2024. Essa dúvida fica ainda evidente se considerar as emendas de comissão destinadas à Saúde.
Saúde
Na decisão de 29 de dezembro, Dino autorizou o empenho, até 31 de dezembro, de emendas destinadas à Saúde, além da movimentação, até 10 de janeiro, de recursos já utilizados em fundos da área. O que, pelo parecer da AGU, ficam com pagamento suspenso até posteriores esclarecimentos.
As emendas de comissão são parte dessas verbas previstas no Orçamento da União e pagas a partir da indicação de deputados e senadores. Pelas regras atuais, cabe a cada comissão permanente da Câmara e do Senado chegar a um acordo sobre a indicação desses valores, aprovar as emendas e registrar essa aprovação em ata.
“A transparência é um dever em relação aos reais donos do dinheiro público destinado pelas emendas parlamentares. E é algo que fortalece a política como instância fundamental para a sociedade. Somente o pensamento iliberal, que se nutre e é nutrido pela antipolítica, se beneficia com práticas orçamentárias tumultuadas ou ímprobas”, escreveu o ministro na decisão.
Entenda
Emendas parlamentares são uma forma de deputados e senadores participarem da execução orçamentária. Previstas pela Constituição, elas permitem que os congressistas destinem recursos para obras e investimentos em suas bases eleitorais.
O embate entre os Poderes Legislativo e Judiciário em torno das emendas se acirrou em agosto, quando o ministro Flávio Dino bloqueou o pagamento dos recursos, exigindo mais transparência e rastreabilidade do dinheiro público. A decisão foi chancelada pelos demais integrantes da Corte.
Nos meses seguintes, houve a campanha eleitoral, período em que emendas não podem ser pagas. Mas, depois do pleito municipal, realizado em outubro, deputados e senadores se debruçaram para aprovar um projeto fruto do acordo dos Três Poderes para dar mais transparência ao pagamento das emendas.
Depois de ser aprovado pela Câmara e pelo Senado, o texto foi sancionado na íntegra por Lula, mas Dino liberou a volta das emendas estabelecendo novas regras, o que causou “mau humor” no Congresso. A partir disso, acentuou-se a relação tensa também com o governo, já que parlamentares ameaçavam não votar pautas importantes, incluindo o pacote fiscal, sem receber emendas.
Em meio a atritos, e com sinalizações do Planalto em defesa das emendas, as principais propostas foram concluídas antes do recesso parlamentar no Congresso. Porém, o Orçamento de 2025 ficou para o próximo ano e deve continuar preocupando o Executivo nos primeiros meses, uma vez que a novela envolvendo o pagamento de emendas segue ativa.
Em 23 de dezembro, Dino determinou a suspensão imediata do pagamento de mais de 5,4 mil indicações de emendas de comissão, o que afeta uma fatia de R$ 4,2 bilhões do Orçamento da União. Além disso, mandou a Polícia Federal (PF) abrir uma investigação sobre as emendas.
O magistrado considerou que o pagamento não poderia ser concretizado até que a Câmara apresentasse as atas das sessões das comissões permanentes. Na madrugada do dia 27, a Câmara respondeu à Corte. Argumentou que cumpriu as atuais regras determinadas pela Corte e que a decisão de destinar as emendas recebeu o aval do Executivo, ou seja, do governo Lula.
No fim da manhã do mesmo dia, Dino manteve o bloqueio e pediu mais informações, elencando em quatro perguntas o que queria saber. A Câmara respondeu na noite de sexta, em tom mais político do que técnico, reforçando que as regras foram cumpridas e tiveram o aval do governo, além de acrescentar, nas palavras da defesa dos deputados, que o Senado Federal fez a mesma coisa e não estava sendo cobrado.
No entanto, no ofício enviado pelos senadores ao governo, diferentemente da Câmara, houve a indicação de que os líderes partidários eram os padrinhos de cada uma das indicações.
Neste domingo, Dino fixou o prazo de 10 dias úteis para que o Senado se manifeste sobre as alegações da Câmara.