Acervo de Bertha Lutz garante certificado da Unesco à Câmara
Documentos ganharam ainda mais importância após incêndio destruir Museu Nacional do Rio de Janeiro, onde a bióloga e ativista trabalhou
atualizado
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A Câmara dos Deputados foi condecorada com o certificado Memória do Mundo, pelo conjunto de documentos relacionados à Bertha Lutz: feminista, bióloga e deputada, que deixou um legado para o progresso das mulheres. O certificado, concedido pela Organização das Nações Unidas pela Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), tem a função de valorizar e incentivar a preservação de acervos que tenham grande importância para a sociedade.
A candidatura do acervo Feminismo, Ciência e Política – O Legado de Bertha Lutz, 1881-1985 foi apresentada em conjunto com o Arquivo Histórico do Itamaraty, o Arquivo Nacional e o Centro de Memória da Universidade Estadual de Campinas (CMU). Cada instituição disponibilizou documentos de diferentes atuações da deputada feminista.
O conjunto de documentos foi um dos 10 selecionados pela Unesco neste ano, de um total de 29 candidaturas no país.
Conheça mais sobre Bertha Lutz:
Esta é a segunda vez que a Câmara dos Deputados recebe o certificado Memória do Mundo (veja fotos abaixo). A primeira foi em 2013, com o acervo da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil de 1823.
Os documentos de Bertha Lutz referentes ao acervo da Câmara dos Deputados estarão disponíveis no site Arquivo Histórico. Todos os arquivos originais sob custódia da Câmara podem ser acessados por qualquer cidadão, que pode consultar o acervo ou, ainda, obter cópia dos documentos.
Sobre Bertha Lutz
Deputada, feminista e bióloga, Bertha Lutz (1894-1976) foi uma das fundadoras da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, entidade criada em 1922, que lutou pela igualdade de direitos entre homens e mulheres. Por meio dessa federação é que se desenvolveu a luta pelo acesso das mulheres à educação e ao mercado de trabalho no Brasil. Além disso, o trabalho de Bertha Lutz contribuiu para que as mulheres passassem a votar, direito garantido na Constituição de 1934.
Bertha Lutz se formou em ciências, na Universidade da Sorbonne, na França. Ela também atuou como pesquisadora no Museu Nacional do Rio de Janeiro, em uma época em que as mulheres eram excluídas do campo científico.
Ela assumiu a cadeira de deputada em 1936, e foi uma das representantes do Brasil na Conferência de São Francisco de 1945, que resultou na Carta da ONU.
Incêndio no museu do RJ destruiu documentos
O acervo da Câmara trata predominantemente da atuação de Bertha Lutz como deputada. Ela foi a segunda mulher no Brasil a assumir esse cargo. Preservar sua memória se tornou ainda mais importante após o incêndio no Museu Nacional do Rio de Janeiro; documentos valiosos da bióloga, que eram ali guardados, foram destruídos pelas chamas. Tratava-se, principalmente, de peças históricas que contavam a atividade profissional e política dela no período de 1919, quando foi admitida no serviço público federal, até 1965, quando atingiu a idade limite e se aposentou.
Para a historiadora da Universidade de Brasília (UnB) Teresa Marques, estudiosa da vida de Berta Lutz, o Museu Nacional do Rio de Janeiro, onde a bióloga trabalhou, era uma verdadeira extensão de sua casa. “Os papéis que ela deixou lá, as cartas que mandou e que recebeu, um material valiosíssimo que foi consumido pelo fogo, infelizmente”, explicou.
Os documentos guardados por Bertha Lutz não se referiam apenas ao seu trabalho como bióloga, mas à uma infinidade de outros assuntos importantes para o país, relacionados à diplomacia, ao feminismo. Um exemplo citado pela historiadora é o reconhecimento da própria profissão de cientista, que Bertha conseguiu junto ao então presidente da República, Getúlio Vargas. Ela entrou na carreira pública como secretária, mas teve sua profissão reconhecida.
Na diplomacia, por exemplo, Bertha Lutz criou em 1928 a Comissão Interamericana de Mulheres, de caráter supranacional, que tinha a função de fazer pressão sobre os governo em relação ao reconhecimento dos direitos das mulheres.
O órgão, após o fim da Segunda Guerra e a criação da Organização dos Estados Americanos (OEA), acabou incorporado pelo organismo internacional e funciona até os dias de hoje.
Sobre o Memória do Mundo
A visão do programa Memória do Mundo é de que o patrimônio documental mundial pertence a todos, e deve ser completamente preservado e protegido por todos, com o devido reconhecimento e respeito por hábitos e práticas culturais, devendo ser permanentemente acessível, sem obstáculos.
A nominação como Memória do Mundo pela Unesco é concedida após a deliberação do Comitê MoWBrasil, reunido em sessão plenária, com a maioria dos seus membros. É considerada a relevância do acervo, não havendo número mínimo de candidaturas a serem nominadas. O comitê pode, inclusive, não conceder nominação para os candidatos se não entenderem relevantes. Isso dá ainda mais importância à nominação recebida pela Câmara.
Os selecionados ficam inscritos no Registro Nacional do Brasil do programa Memória do Mundo da Unesco. Entre os critérios de seleção para a inscrição de um acervo documental na lista do registro, estão a sua importância mundial e o seu destacado valor universal. Ponto para o grupo de pesquisadores da Câmara dos Deputados.