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A Semana em Fakes: ivermectina: a (falsa) “cura milagrosa” da Covid-19

Parceiro do Metrópoles analisa como as fake news transformaram o remédio em uma inexistente “tábua de salvação” contra a doença

atualizado

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Prefeitura de Itajaí/Divulgação
ivermectina
1 de 1 ivermectina - Foto: Prefeitura de Itajaí/Divulgação

Quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou que a Covid-19 havia se tornado uma pandemia, lá em março de 2020, cientistas passaram a se debruçar na busca de uma vacina e um tratamento contra o novo coronavírus (que já nem é tão novo assim). Uma das estratégicas adotadas por pesquisadores foi testar drogas já existentes contra o vírus.

Dentre outras medicações que se mostraram “promissoras” no início da pandemia, estava a ivermectina. O remédio, utilizado inicialmente como antiparasitário em humanos e animais (como o gado), surgiu como esperança contra a Covid-19 no dia 3 de abril de 2020. Naquele dia, pesquisadores da Monash University (da Austrália) divulgaram resultados de um estudo in vitro com o remédio.

Infelizmente, e assim como tantos outros casos, o anúncio foi replicado na mídia mundial com a simplificação que fez o remédio ser apontado como a cura do coronavírus. Títulos como “ivermectina mata coronavírus em 48 horas” não demoraram a surgir. Em um cenário no qual as pessoas têm dificuldade de ler uma notícia completa (ainda mais da editoria de Ciência e Saúde), muitos deixaram de se atentar a alguns detalhes que vamos listar abaixo (até para facilitar a leitura):

  1. Os testes que mostravam a eficácia da ivermectina contra a Covid-19 foram feitos in vitro. Ou seja: células cultivadas em laboratório foram infectadas pelo novo coronavírus e colocadas em um tubo de ensaio junto com o remédio em questão.
  2. Passar nos testes in vitro não significa curar a doença. A própria Monash University divulgou um status sobre as pesquisas. Para poder ser aprovada contra a Covid-19, a ivermectina precisaria passar por testes pré-clínicos (na qual seria ajustada a dose eficaz contra a doenças) e clínicos (fases I, II e III) para verificar segurança e eficácia. Só aí o uso “clínico” estaria aprovado.
  3. Não foram poucos os remédios que se mostraram eficazes em testes in vitro, mas não passaram em testes clínicos (a cloroquina é um exemplo).

Na época do estudo e nos meses seguintes, tivemos que desmentir por duas oportunidades (aqui e aqui) que a ivermectina seria a cura “comprovada” da Covid-19. Porém, a desinformação sobre o remédio só aumentou com o passar do tempo.

Em julho, em um período no qual a OMS descontinuou os testes com a cloroquina, a ivermectina passou a ser apontava como a “bala de prata” contra a Covid-19. A tese só se fortaleceu quando, sem nenhuma indicação de eficácia, autoridades e personalidades passaram a defender o uso do remédio como “preventivo” contra a Covid-19 (como é feito com parasitas).

Teses bizarras como a que apontava que a ivermectina “aniquilava a Covid-19” se usada preventivamente, que funcionaria mais do que a vacina e que poderia fazer parte de um “kit contra Covid-19” viralizaram na internet.

A fake news de que a ivermectina “é a cura” foi reforçada por notícias falsas “anexas” como a de que a Anvisa chegou a recomendar uma “dose do remédio” para combater o coronavírus, que governadores boicotaram o remédio, que Biden estava distribuindo o remédio nos EUA e até de que o médico Anthony Wong havia sido assassinado por “defender o remédio”.

Por mais que muitas dessas notícias falsas sejam inverossímeis para alguns, elas ajudaram a reforçar ações que transcenderam o “curtir e compartilhar”. Com a ajuda da desinformação, o governo passou a incentivar um “tratamento precoce” com ivermectina e outras drogas sem eficácia comprovada e pessoas correram às farmácias atrás do remédio.

Felizmente (ou infelizmente, porque, de fato, queríamos que o remédio fosse eficaz contra o coronavírus), a situação parece começar a mudar. Algumas pessoas que defenderam o remédio publicamente morreram de Covid-19, nenhum estudo confiável mostrou a eficácia do remédio e, nesta semana, a Merck, uma das empresas que fabrica a ivermectina, anunciou o que todos deveriam saber: que não há eficácia comprovada do remédio contra a Covid-19.

E, por mais que algumas pessoas, empresas e autoridades ainda resistam, não há como negar a ciência. E o fato é que a ivermectina é, sim, uma medicação eficaz… contra infecções causadas por alguns parasitas em seres humanos e animais. Contra a Covid-19, o remédio não funciona nem antes, nem durante, nem depois da infecção.

Trends da semana

As palavras mais buscadas no Boatos.org nos últimos sete dias foram, em ordem decrescente, onda de calor, Whatsapp, WhatsApp, Ivermectina, Fui Vazado, Ferronorte, Onda de calor em fevereiro, Equinócio, Vacina e Facebook.

Os desmentidos mais lidos do Boatos.org nos últimos 7 dias foram, em ordem decrescente, o texto que desmentia que uma forte onda de calor faria fevereiro o mês mais quente da história, a checagem da história falsa que apontava que a Nestlé havia doado leite condensado para as Forças Armadas, o desmentido de que a WWF estaria “patrocinando o fogo na Amazônia”, o desmentido de uma corrente que apontava que as pessoas estariam livres dos novos termos de uso do WhatsApp se compartilhassem uma mensagem que começava com “Eu não Autorizo” e o desmentido de que Biden teria distribuído ivermectina e leite condensado para pessoas nos EUA.

No Twitter, a matéria com maior engajamento foi a que desmentia o boato de que a deputada Flordelis iria assumir uma cadeira como “secretária da Mulher da Câmara”. A mesma matéria foi a mais compartilhada na semana do Facebook. No Instagram, o conteúdo de maior engajamento foi o desmentido sobre o “Facebook ter se arrependido de censurar a cloroquina”.

No YouTube, o conteúdo mais visto da semana foi o que desmentia a tese da mensagem “Eu não Autorizo” no WhatsApp. Por fim, o conteúdo mais visto da semana no Telegram era o que a Nestlé estava doando leite condensado para o Exército.

Edgard Matsuki é editor do Boatos.org, site que já desmentiu quase 6 mil notícias falsas

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