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5 anos do caso Marielle: lentidão é reflexo das fragilidades na Justiça brasileira

Assassinato de Marielle Franco completa meia década nesta terça, ainda sem respostas. Familiares lutam pela responsabilização dos mandantes

atualizado

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1 de 1 Foto colorida de Marielle Franco - Metrópoles - Foto: Mídia NINJA

O assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes completa, nesta terça-feira (14/3), cinco anos sem respostas. No triste marco de meia década das mortes, a expectativa é que a Justiça brasileira finalmente rompa o ciclo de obstruções às investigações, costure pontas soltas e conclua o caso com a responsabilização dos mandantes do crime.

Marielle e Anderson foram executados em março de 2018, no Rio de Janeiro, e a investigação nunca foi concluída. O policial militar reformado Ronnie Lessa, acusado de ter feito os disparos que mataram a vereadora e o motorista, e o ex-policial militar Elcio de Queiroz, suspeito de dirigir o carro que perseguiu a política após ela sair de um evento na Lapa, zona central do Rio, foram presos em 2019.

Contudo, ambos jamais revelaram quem mandou matar Marielle e Anderson. Os suspeitos respondem por duplo homicídio triplamente qualificado – por motivo torpe, mediante emboscada e impossibilidade de defesa das vítimas. Eles permanecem detidos preventivamente, sem que o júri popular tenha sido marcado.

Na avaliação da diretora do Instituto Marielle Franco, Lígia Batista, o ciclo de impunidade que envolve o crime é um reflexo da “dificuldade estrutural de acesso à Justiça por parte de familiares de mulheres negras e, em especial, defensoras de direitos humanos vítimas do Estado”.

“O assassinato de Marielle é um atentado à democracia e enquanto esse caso não tiver uma resolução, essa democracia fica em xeque. Ainda assim, não vamos nos calar e seguiremos em coro, somadas a tantas vozes ao redor do Brasil e do mundo, que fazem ecoar esse grito por justiça por Marielle e Anderson”, defende a diretora-executiva do Instituto Marielle Franco, em entrevista ao Metrópoles.

Sinalização política do governo

No início deste ano, a investigação entrou, mais uma vez, em uma nova fase. Na última semana, familiares de Marielle e Anderson se reuniram com membros da força-tarefa que investiga  morte da vereadora e do motorista, na sede do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ). O procurador-geral de Justiça, Luciano Lessa, não participou. Após cinco trocas da comando da investigação, ele é o atual responsável por conduzir o caso no MP.

O Instituto Marielle Franco, ao lado de familiares e outras entidades que compõem o Comitê Justiça por Marielle e Anderson, solicitou que os representantes legais das famílias das vítimas tenham acesso aos autos de inquérito sobre os mandantes do crime – atualmente, em segredo de Justiça –, e que a PF esteja coordenada às autoridades responsáveis. Eles ainda não obtiveram resposta.

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Vereadora Marielle Franco foi assassinada há 5 anos com seu motorista Anderson Gomes
A vereadora também se engajou na luta pelos direitos das mulheres
A vereadora defendia pautas de direitos humanos, defesa da mulher e da comunidade LGBT
Marielle era vereadora e defendia direitos humanos
Marielle foi assessora de Marcelo Freixo e estava em seu primeiro mandato eleitoral
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Marielle Franco

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Vereadora Marielle Franco foi assassinada há 5 anos com seu motorista Anderson Gomes

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A vereadora também se engajou na luta pelos direitos das mulheres

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A vereadora defendia pautas de direitos humanos, defesa da mulher e da comunidade LGBT

Mário Vasconcellos/CMRJ
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Marielle era vereadora e defendia direitos humanos

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Marielle foi assessora de Marcelo Freixo e estava em seu primeiro mandato eleitoral

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Ela era vereadora pelo PSol, no Rio de Janeiro

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Marielle morreu aos 38 anos

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O velório foi marcado por protestos

WILTON JUNIOR/ESTADÃO
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Um grupo formado principalmente por mulheres protestou por justiça e fez uma homenagem à vereadora Marielle Franco na segunda-feira (14/3), em 2022

Matheus Veloso/Especial Metrópoles
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Estátua de Marielle foi inaugurada em 2022 no Buraco do Lume, onde ela costumava discursar,

Aline Massuca/Metrópoles
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Anielle Franco, irmã da ex-vereadora Marielle Franco, tomou posse como ministra da Igualdade Racial em 2023

Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles
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Ato em homenagem à Marielle, na Câmara dos Deputados, em 2018

Igo Estrela/Metrópoles

Em outra frente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assumiu o governo federal, em janeiro, prometendo ações concretas sobre o tema. Ainda em janeiro, a irmã de Marielle, Anielle Franco, assumiu o Ministério da Igualdade Racial. No Dia da Mulher, na última quarta-feira (8), Lula enviou à Câmara dos Deputados um projeto de lei que cria o Dia Nacional Marielle Franco, a ser comemorado em 14 de março.

Alinhado à proposta do presidente, o ministro Flávio Dino, da Justiça e Segurança Pública, tomou como tarefa pessoal a elucidação do caso: nas palavras dele, a resolução do crime é uma “questão de honra”. Em fevereiro, Dino determinou que a Polícia Federal entrasse na investigação, e designou o delegado Guilhermo Catramby para conduzir o inquérito na PF.

A decisão de Flávio Dino, no entanto, não representa uma federalização das investigações. Em 2020, dois anos após o assassinato, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) para o deslocamento do caso à Justiça Federal . O tribunal não concordou com a então PGR, Raquel Dodge, que havia apontado uma possível contaminação da apuração.

Ao Metrópoles o ministro detalhou que houve uma “determinação do presidente Lula no sentido de a PF atuar no caso”, e que o diálogo com o MP está “sendo proveitoso” para o processo.

“A PF também está realizando suas próprias diligências e o que eu posso afirmar é que o trabalho está evoluindo bem”. Como as investigações correm em sigilo, o ministro informou que não é possível antecipar ou atualizar qualquer passo. Contudo, garante o comprometimento com a conclusão das investigações.

“Eu posso afirmar à sociedade, família e amigos da Marielle que a PF está trabalhando para que nós possamos ajudar no esclarecimento definitivo deste terrível crime”. Ele frisou que ainda não é possível fixar um prazo para novas atualizações ou finalização do caso. “Mas eu posso afirmar que há prioridade, há uma equipe dedicada na PF só para isso”.

Passos lentos na Justiça

A professora de direito Luisa Ferreira, pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre o Crime e a Pena da Fundação Getulio Vargas (FGV), explica que a proposta de Dino é, na verdade, uma “união de forças”, uma vez que ainda não está claro, judicialmente, que não se trata de um caso de competência da PF.

A ideia é que não se possa descartar, ainda na investigação, que é um crime político, portanto, poderia ter competência da Justiça Federal. Ao mesmo tempo, homicídios estão sob a competência da Polícia Civil. Não há problema que as polícias unam forças para encontrar esses mandantes do crime. Quando eles forem encontrados, no entanto, somente um processo será aberto”, explica.

Na visão da especialista, a lentidão judicial reflete problemas estruturais no sistema de Justiça brasileiro. “A lentidão na Justiça é comum, não é raro um caso demorar mais de 4 anos para a investigação. O que não é comum é um caso tão famoso e com tanta dedicação como esse demorar tanto tempo”, comenta a jurista.

“As mudanças em geral atrapalharam as investigações. A gente viu e tem comprovadamente episódios de depoimentos falsos e obstrução da apuração. Isso é algo que precisa ser investigado firmemente, e pode ser esse um dos motivos pelos quais um caso como esse, com tanta força policial envolvida, tantas testemunhas e dados, ainda não conseguiu chegar a uma resolução, porque tem pessoas claramente tentando atrapalhar as investigações”, reforça.

Em 2010, o delegado Leandro Almada, que verificou a atuação da Polícia Civil do Rio de Janeiro (PC-RJ) no caso Marielle, concluiu que houve obstrução de Justiça na apuração do assassinato. O inquérito aponta que policiais militares e advogados fluminenses atuaram em organização criminosa para tentar atrapalhar as investigações do homicídio.

Outro fator inédito para o sistema judicial brasileiro, é existencia de um arcabouço jurídico limitado para investigar, julgar e punir crimes de violência política de gênero, termo definido em lei sancionada em 2021. Segundo Anielle Franco, o caso da irmã foi um “feminicídio político”. O MP e a Polícia Civil, no entanto, ainda divergem sobre a questão.

“A Justiça brasileira não tem arcabouço robusto para lidar com nenhum tipo de violência, menos ainda, com casos de violência política de gênero. Temos um sistema muito problemático do ponto de vista de investigação, uma máquina de prender, de condenar. É um formato de justiça que lida com a violência política como todos os outros crimes, sem adotar uma perspectiva de gênero nesses julgamentos”, argumenta a professora.

Meia década de história

Segundo Lígia Batista, diretora-executiva do Instituto, “a cada ano que passa é mais difícil reaquecer nas pessoas esse sentimento de indignação. Por isso, trabalhamos a partir do Instituto para manter viva a luta por justiça, a fim de que as autoridades reconheçam que meia década é tempo demais sem respostas e que o Estado brasileiro precisa responder quem mandou matar Marielle”.

É com essa proposta que a organização conduz, nesta terça-feira (14), uma programação extensa de ações culturais, de preservação da memória e de justiça pelo assassinato de Marielle. Entre as atividades estão uma missa na Igreja Nossa Senhora do Parto, no centro do Rio de Janeiro, e também o lançamento da escultura Marielle Gigante e da exposição A Voz de Marielle abertas a visitação, respectivamente, no Museu de Arte do Rio e no Museu do Amanhã. Confira aqui a programação completa.

Durante a tarde, há a expectativa de um encontro entre familiares e o Procurador Geral de Justiça, Luciano Mattos, com objetivo de cobrá-lo, em nome do MP, o compromisso da instituição diante desse caso.

“O assassinato de Marielle é paradigmático e se dá num contexto em que a violência política faz parte do cotidiano de parlamentares mulheres negras, cis e trans. Assim, por tudo que significou ter uma mulher negra parlamentar assassinada, em pleno exercício de seu mandato e no auge de sua carreira política, é muito importante que esse caso não caia no esquecimento”, lembra Lígia.

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