Toupeira de Ulysses: Bolsonaro ofende Zelenski e Ucrânia (Vitor Hugo)
Zelenski (ator e comediante por profissão) chegou ao poder como um “outsider” da política, um combatente da corrupção
atualizado
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Desde que assumiu a Presidência da República, o ocupante do Palácio do Planalto, Jair Bolsonaro, quase não faz nada, além de produzir factóides para os seus. Atos provocativos para saciar carneiros sedentos de seu cercadinho no Alvorada, gente sequiosa de escândalos e intrigas. Ou ofender a adversários em termos indecorosos que beiram à falta de decoro e compostura inerente ao homem público. A mais recente e grave foi a tirada em tom jocoso de pretensa ironia, na verdade preconceituosa, arrogante e inoportuna agressão ao presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenski , e aos ucranianos.
Grosseria gratuita contra um chefe de estado e aos 44 milhões de cidadãos que Zelenski governa democraticamente. Atacados ferozmente há mais de uma semana por invasão promovida pelo autocrata russo, Vladirmir Putin, contra o país vizinho, que resiste bravamente: “O povo da Ucrânia confiou em comediante para traçar o destino do País”, disse Bolsonaro em sua insólita declaração, em Moscou, na recente viagem por motivos a espera de explicações convincentes. Inclusive para o papel do filho Carlos, na comitiva.
O destempero do mandatário brasileiro – em campanha de reeleição – comparado à maneira sóbria, hábil e firme de agir e falar do líder ucraniano (que surpreende positivamente o mundo, a ponto de ser aplaudido de pé em eventos internacionais, via internet, lembra exemplo citado por Ulysses Guimarães – senhor Constituição de 1988 e timoneiro da resistência democrática no Brasil – em um de seus pensamentos mais famosos, que transcrevo por ser exemplar e visionário: “O jeito também é força. Se vence obstáculos e antagonismos é força. “Suaviter in modo, fortite in ré”, eis a receita pessedista dos romanos que dominaram o mundo. A toupeira quando em seu caminho encontra a pedra, não podendo escalá-la, não tem jeito para contorná-la. Morre ao sol, à fome ou à sanha dos inimigos”.
Mais de uma semana depois de conduzir com arte, habilidade estratégica, firmeza e capacidade de liderança política da gente que o elegeu, Zelenski surpreende a seus críticos e encarna seu papel mais importante: liderar a Ucrânia na guerra contra Putin em seus desvarios expansionistas de restabelecer o velho império soviético. Este papel e sua relevância tem sido omitido ou mal compreendido abaixo da linha do Equador. Muito provavelmente em razão do choque binário “esquerda”(Lula) X “direita”(Bolsonaro) em que se pretende aprisionar a disputa presidencial deste ano no Brasil, enquanto a Terceira Via tenta furar o bloqueio.
Zelenski (ator e comediante por profissão) chegou ao poder como um “outsider” da política, um combatente da corrupção. Que mostrava-se seguro de sua capacidade para negociar a paz no conflito separatista, apoiado por Putin, confinado no leste da Ucrânia, como assinala a analista política Maria Zolkina, no jornal argentino Clarin. Venceu com 73% dos votos dos ucranianos cansados dos corruptos e corruptores. Vitória arrasadora frente ao “presidente em função”, Petro Poroshenko, um empresário endinheirado anti-Moscou. “Zelenski não é um presidente de guerra, nem escolheu lutar contra Putin e os soldados russos. Mas desde que ficou claro, pelos serviços de inteligência, a maneira como seu país seria atacado, vem atuando exatamente como deve fazer um presidente em tempo de guerra”, assinala Zulkina. Um fato. O resto o tempo, senhor da razão, dirá.
Vitor Hugo é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta. E-mail: vitors.h@uol.com.br