Cerveja de guarda: o tempo a nosso favor

Antes mesmo de bebermos cerveja, sabíamos que ela servia para matar a sede. Depois, descobrimos que cada estilo proporciona sensações diferentes, seja refrescância, potência, amargor, e assim por diante.

Hoje, pelo menos em relação aos degustadores brasileiros, vivemos um momento em que a maturidade nos desafia a ter paciência. Pergunte-se: você está pronto para esperar o tempo melhorar a sua bebida?

O advogado Fabrício Carvalho Mattos transformou o hábito de guardar cerveja em hobby e hoje é considerado um dos maiores colecionadores do Brasil. “Tenho garrafas que só abro em ocasiões especiais. Outros rótulos, porém, compro em maior quantidade para acompanhar a evolução da cerveja. Esses, abro a cada três ou seis meses”, explica.

Sobre o tamanho do tesouro guardado com tanto carinho, Fabrício desconversa e diz ser um segredo mortal. No entanto, revelou que sua cerveja mais antiga tem nada menos que 26 anos. Repetindo: existe uma garrafa guardada há 26 anos à espera de seu grande e triunfal momento. Quando isso irá acontecer? Ninguém sabe.

 

Primeiros passos
Se você tem a paciência necessária para entrar nesse universo e curiosidade tinindo para descobrir diferentes cervejas em apenas uma receita, é hora de começar. Primeiro, compre duas ou mais garrafas do mesmo rótulo, deguste uma delas e tome nota.

Depois, coloque uma etiqueta na cerveja intacta com informações como nome, ano de fabricação, data em que foi engarrafada e vencimento. Em seguida, ponha sua preciosidade para dormir.

É claro que uma adega ou geladeira com temperatura controlada em torno de 12ºC é o lugar ideal para esse tipo de armazenamento, mas na falta de um local milimetricamente planejado, procure um canto fresco onde nunca bata sol. Cervejas com tampa de metal devem ser guardadas na vertical. As rolhadas podem ficar deitadas.

Quais cervejas podem ser envelhecidas?
Para evoluir com a guarda, a cerveja precisa ter potência sensorial capaz de suportar a ação do tempo. Em geral, deve ter bastante álcool e corpo (açúcar residual) para desenvolver sabores e aromas que vão se modificar e balancear a inevitável oxidação.

O envelhecimento do malte pode revelar aromas amadeirados, vínicos ou acastanhados. Os principais estilos indicados para guarda são Barleywine, Belgian Strong Ale, Gueuze, Russian Imperial Stout e Doppelbock.

O que acontece quando ela envelhece?
Com o passar dos anos, a cerveja tende a ficar mais seca, menos doce e mais vínica no sabor. A sensação de álcool queimando é suavizada, dando lugar a novos sabores, como caramelo e pêssego.

Fabrício Mattos também explica que notas de frutas presentes em algumas cervejas jovens podem, com o envelhecimento, se transformar em aromas de frutas secas como figo e ameixa.

Além disso, “uma cerveja ácida envelhecida pode tornar-se mais suave e complexa ao longo dos anos, com a emergência de novos sabores antes ocultados pela acidez da bebida jovem”, completa.

Como ter certeza de que vai dar certo?
É impossível determinar com precisão a data ideal para o consumo de uma cerveja que está descansando. Você pode curtir alguns traços de oxidação que outras pessoas achariam detestáveis. Além disso, assim como o vinho, cada cerveja envelhece de um jeito e em uma determinada velocidade.

A dica é usar a própria experiência e a vivência de outros colecionadores para diminuir o risco e não ficar totalmente no escuro. De uma coisa você pode ter certeza: essa bebida que tanto nos fascina nunca estraga, só fica diferente.

*André Vasquez e Marina Cavechia são sócios e curadores do clube de cerveja por assinatura Ohmybeer.com.br.