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A arte de (não mais) transformar dinheiro e saúde em fumaça

O Distrito Federal tem 300 mil fumantes e, por ano, registra 2 mil mortes em decorrência de doenças relacionadas ao consumo do cigarro.

Autor Otto Valle

atualizado

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Não me considero um sujeito maluco, mas já queimei muito dinheiro — fato pelo qual, para muitas pessoas, eu até poderia ser enquadrado no grupo daqueles que não batem bem da cabeça. Para ser mais preciso, foram exatos 16 anos nos quais transformei milhares de reais, literalmente, em fumaça. Dos 15 aos 31 anos, fiz parte de uma população que tem cada vez menos espaço na sociedade: a dos fumantes.

Na semana em que é comemorado o Dia Mundial sem Tabaco, também celebro uma marca pessoal, a de estar há quase seis anos longe do cigarro. O vício é cruel. Senti na pele os efeitos da abstinência e passei anos na luta para me livrar da dependência química. Entre idas e vindas, precisei substituir a droga por outra — chicletes de nicotina (sim, o cigarro é uma droga, das mais nocivas que há, especialmente por ser legal)

Foram cinco meses com as gomas. Ao acordar, lá ia eu mascar uma delas. Ao deitar à noite, já havia consumido cinco ou seis chicletes ao longo do dia. As primeiras semanas de rompimento definitivo com o cigarro foram tensas e coincidiram com as férias que passei com minha esposa e filho no litoral de Alagoas, mais precisamente em São Miguel dos Milagres, no fim de 2010.

Tinha levado um estoque de quatro caixas de chicletes, que acabaram com a mesma velocidade com que a maré subia e descia diariamente na pacata praia nordestina. Mas a tranquilidade do mar repleto de corais contrastava com a agonia que passou a me consumir quando o organismo se ressentiu da falta de nicotina. Cheguei ao ponto de, com o carro que havia alugado, sair pela manhã e voltar apenas à noite, após percorrer todas as farmácias (sério, todas mesmo) de uns quatro pequenos municípios da região.

Nenhum santo me ajudou na peregrinação, e voltei a São Miguel dos Milagres sem as benditas gomas viciantes. Aliás, parando para pensar agora, acho que houve, sim, um tipo de intervenção divina. Naquela noite, pouco antes do jantar, percebi que aquela derrota não me faria voltar a fumar. Passei a semana restante de férias resignado. Mas a primeira coisa que fiz ao voltar para Brasília foi seguir do aeroporto para uma farmácia.

Poucos meses após as férias e muitas caixas de Nicorette 2mg depois, fui reduzindo a frequência com que usava o chiclete e fechei o capítulo da minha vida que poderia ter me transformado em uma triste estatística: a dos 170 mil brasileiros que morrem, a cada ano, em decorrência de doenças relacionadas ao consumo de tabaco. Só no Distrito Federal, são contabilizados 2 mil óbitos anuais. Eu não estarei entre eles.

Felizmente, estou em outro percentual. Daqueles que conseguiram abandonar o hábito nocivo. Segundo levantamento mais recente da Secretaria de Saúde do DF divulgado nesta semana, a turma da fumaça em Bsb também vem trocando de lado. Nos últimos anos, o tabagismo entre a população local caiu de 16%, em 2006; para 9,7% em 2014 — algo na casa de 300 mil fumantes em todo o Distrito Federal.

Apoio
E quem ainda luta contra o vício (afinal, não conheço um fumante que não tenha tentado, ao menos uma vez, largar o cigarro) conta com uma estrutura exemplar na rede pública. O Programa de Controle do Tabagismo do DF tem 94 unidades espalhadas nas regiões administrativas. Entre 2011 e 2014, foram atendidas 20.385 pessoas, sendo que 13.177 pararam de fumar na quarta sessão, a última do esquema terapêutico.

Uma vez eu aderi ao programa e fui surpreendido positivamente. Na época (não me lembro o ano) eles realmente tinham uma rede de apoio e tratamento forte, que incluía o suporte com patches e chicletes de nicotina. Espero que a iniciativa continue de excelência. No entanto, aquela não foi a vez em que consegui me livrar de vez do vício. No meu caso, foi uma jornada, com várias paradas e recaídas. Sei o quanto é duro controlar o próprio organismo. Mas também sei que não é impossível.

A Fernanda e o Tarsinho agradecem.

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