Crítica: “O Nascimento de uma Nação” conta saga de escravo mártir
Filme de Nate Parker, “O Nascimento de uma Nação” narra a rebelião iniciada pelo escravo Nat Turner nos EUA do século 19
atualizado
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“O Nascimento de uma Nação” é certamente um dos filmes mais contraditórios de 2016. Começou o ano assim: venceu o Festival de Sundance, foi comprado por US$ 17,5 milhões pela Fox (um recorde do evento) e assumiu posição importante nas prévias para o Oscar 2017. Mas, no meio do caminho, descobriu-se uma acusação de estupro em 1999 envolvendo Nate Parker, diretor, roteirista e protagonista, e Jean McGianni Celestin, coautor da história. Do céu ao inferno.
O mais dissonante disso tudo é que o filme articula questões raciais e lida, entre outros temas, com o abuso sexual sofrido por escravas nos Estados Unidos pré-abolição. Por mais que isolar o artista da obra seja sempre arriscado, é importante pensar no que o longa adiciona ao catálogo (ainda pequeno) de trabalhos cinematográficos sobre escravidão e intolerância racial.
Bem como “12 Anos de Escravidão” (2013), “O Nascimento” narra uma trajetória bastante individual e particular dentro da secular história americana de racismo. Nat Turner, encarnado por Parker, foi um personagem real no século 19, antes da Guerra Civil. Um escravo que sabia ler e encontrou na Bíblia Sagrada o conforto para uma vida de privação, trabalho árduo e terror cotidiano.
A jornada de um mártir: mais emoção do que história
Sob o jugo de um fazendeiro “bondoso” (Armie Hammer), mas em crise financeira, Nat tornou-se um pregador usado para fins apaziguadores. Vai a propriedades vizinhas no estado da Virginia e é intimado a amansar os nervos de seus coirmãos. Certo dia, ele desperta como que numa epifania religiosa: reinterpreta versículos e vê no livro sagrado a centelha de uma revolução.
Pronto: surge uma revolta de escravos contra fazendeiros, resultando tanto em mortes de brancos supremacistas como de negros em retaliação pela rebelião. Parker mira a emoção do espectador. Cria momentos de choque em pesadas cenas de tortura física e psicológica para depois contar os desdobramentos vingativos dos insurgentes.
Parker esbarra em atalhos de roteiro (há sempre uma cena explicativa sobrando) e subtramas pouco funcionais, mas constrói um drama carregado de emoção sobre intolerância e busca por liberdade. Cem anos depois de “O Nascimento de uma Nação” (1915), o clássico de D.W. Griffith endossado pela Ku Klux Klan, esse título finalmente ganha um outro sentido.
Avaliação: Bom
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