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Cannes: “The Neon Demon”, de Nicolas Winding Refn

“The Neon Demon” será um fracasso de bilheteria e um sucesso de publicidade, enquanto críticos e teóricos debatem o que sentir e o que fazer com as imagens do filme. É uma provocação imperdível.

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Divulgação/Festival de Cannes
The Neon Demon
1 de 1 The Neon Demon - Foto: Divulgação/Festival de Cannes

“The Neon Demon” começa com um frenesi orgiástico de som, luz e visão. A trilha sonora oitentista de Cliff Martinez e os títulos em neon são um prelúdio para o que está por vir: vemos uma jovem com roupa moderna deitada num sofá antiquada, sua garganta banhada em sangue, seu olhar fixo e ausente. Mas a jovem Jesse (Elle Fanning) não está morta, e é tudo encenação. Ela está meramente posando para seu portfólio amador de modelos. Recém chegada em Los Angeles, a menina de 16 anos pretende entrar no mundo da moda, e já fez amizade com um fotógrafo (Karl Glusman).

Nas sequencias seguintes, Jesse tenta emplacar. Leva suas fotografias para uma agência de modelos, infiltra uma boate frequentada pelas já bem-sucedidas e paga aluguel num hotel fuleiro de beira de estrada. É uma história típica da menina de interior que vem tentar a sorte na cidade grande, mas o diretor dinamarquês Nicolas Winding Refn não é um diretor típico. Quem já conhece seu trabalho prévio (a trilogia “Pusher”, “Drive” e “Apenas Deus Perdoa” são os mais citados) sabe o tipo de coisa que poderá acontecer aqui. Quem não o conhece, e está começando com “The Neon Demon” está prestes a experimentar uma jornada inesquecível, mesmo que não seja prazerosa.

Em suas mãos, o mundo da moda vira um filme de terror surrealista. Na verdade é um pretexto para explorar o que lhe interessa: a beleza superficial, dos objetos e das pessoas (que não seja confundida com a beleza filosófica, de conceitos, emoções e experiências). Winding Refn estabelece bem cedo que Jesse tem uma beleza de deixar todos embasbacados, incluindo fotógrafos, designers e especialmente as modelos mais velhas e experientes. Com isso o filme muda de perspectiva e, em vez de seguirmos uma carreira em ascensão, vemos a cobiça que Jesse desperta em todos os outros.

O Consumo da Beleza
Vários temas da cobiça por beleza estão presente. Beleza como objeto sexual está presente tanto no fotógrafo amador que faz as primeira fotos de Jesse e que está obviamente apaixonado por ela quanto na maqueadora (Jenna Malone) que finge ser sua amiga para depois tentar ser algo mais íntimo. Beleza como ideal estético está presente no estapafúrdio e pretensioso designer (Alessandro Nivola) que a coloca como modelo principal de seu desfile e no outro fotógrafo (desta vez profissional) que manda ela tirar toda a roupa num tom de ameaça mas depois faz algo realmente surpreendente. Beleza que desperta inveja está corroendo as outras modelos do filme (Bella Heathcote e Abbey Lee) que, desesperadas por manter suas juventudes, já colecionam intervenções cirúrgicas enquanto Jesse não tem nenhuma.

Nem Jesse escapa da própria beleza. Na cena de seu primeiro desfile, as luzes se apagam e entramos em seu subconsciente. Ela caminha por uma passarela confrontada por triângulos eretos, tanto nos espelhos quanto em neon azul. Ao fim da caminhada, o triângulo azul se inverte, apontando para baixo, e fica vermelho. Difícil não relacionar este novo triângulo com o órgão genital feminino, e perceber que este é o momento em que Jesse atinge uma certa maturidade.

A beleza aliás, parece ser o princípio que guia a câmera do diretor e de sua fotógrafa, Natasha Braier (NWR colaborou pela primeira vez com uma mulher na direção de fotografia). Cada frame poderia virar um quadro, cada movimento da câmera uma pincelada. A visão não é do mundo real, mas sim de uma impressão sobre ele.

Winding Refn é um diretor que usa o cinema para fazer terapia. Mais ocupado com si mesmo, não está preocupado em agradar os outros. “The Neon Demon” com certeza será criticado por misoginia, por violência e por mau gosto. Mas retratar essas coisas em um filme não quer dizer que o diretor faça uma apologia a elas. Winding Refn está mais satírico neste filme do que em qualquer outro. Uma cena com elementos de necrofilia, que com certeza será uma das maiores controvérsias do filme, não deve ser considerada como gratuita neste filme, mas sim como uma exploração da beleza como “natureza morta”–literalmente.

Falar muito explicitamente sobre tudo que acontece nesta caótica obra-prima seria arruinar algumas das surpresas viscerais que estão por vir. O filme merece ser visto minimamente pois nenhum outro diretor conseguirá lançar um filme como este no circuito comercial. Quem já viu seus outros filmes e não gostou não precisa ver este. Mas se você estiver no outro campo, dê uma chance ao cinema que não está interessado em entreter, mas sim em provocar.

Branding
O filme é portanto uma extensão da marca Nicolas Winding Refn. Para deixar de lado qualquer discrição, os títulos inicias já tem cara de marketing, usando a abreviação do diretor, NWR, como uma logomarca. Refn, parece, coloca lenha na fogueira de que seus filmes devem ser aguardados como “eventos” cinematográficos. Com seus últimos dois filmes dividindo críticos, que os aplaudiram E vaiaram nas sessões de imprensa, seu lema parece ser “Falem bem, falem mal, mas falem de mim”. (Realeza no Festival, ele já recebeu o prêmio de melhor diretor em 2011 e uma vaga no jury do festival em 2015.)

“The Neon Demon” seguirá um caminho interessante daqui pra frente. Será um fracasso de bilheteria e um sucesso de publicidade, enquanto críticos e teóricos debatem o que sentir e o que fazer com as imagens do filme. No fundo, porém, caberá a cada espectador formar sua opinião desta grande provocação autoral.

Avaliação: Excelente (5 estrelas)

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