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Cannes: “Personal Shopper”, de Olivier Assayas

É raro ver alguém como o dramaturgo Assayas explorar o cinema de gênero, como ele explora o horror aqui. O resultado é excelente

atualizado

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Festival de Cannes/Divulgação
Personal Shopper
1 de 1 Personal Shopper - Foto: Festival de Cannes/Divulgação

Ao ouvir que o novo filme de Olivier Assayas teria Kristen Stewart como uma personal shopper em Paris, logo se imagina um filme sobre o tédio e a crise existencial de uma menina rica. Afinal, essa profissão, aonde um artista ou fashionista contrata uma consultoria para provê-la com roupas e looks, poderia ser um reflexo da própria Stewart, uma mega estrela de Hollywood desde 2008, quando começou a série de filmes “Crepúsculo”.

Mas Assayas rejeita esta convenção, amplamente explorada por diretores como Michelangelo Antonioni ou mesmo Sofia Coppola, e começa o filme de uma maneira inusitada. Stewart anda por um casarão abandonado, acompanhada por um casal de amigos, procurando uma “presença”. Espectadores ficaram bem surpresos pelo que começou a parecer um filme de terror. Pois é essa mistura de gêneros que faz de “Personal Shopper” um dos dramas mais interessantes do festival.

Maureen, a personal shopper, é uma médium, ainda se recuperando da morte repentina de seu irmão Gêmeo em Paris. Inconformada com o modo que ele morreu, ela reluta em sair da cidade enquanto espera uma mensagem do além. Mesmo com o namorado trabalhando em Dubai, ela quer ficar em Paris, e vai preenchendo seus dias montando looks para uma cantora francesa mimada. De repente ela começa a receber mensagens ameaçadoras em seu celular e começa a temer pela sua segurança.

Maureen é uma personagem que está desaparecendo dentro de si mesmo. Tímida e retraída, beirando uma depressão existencial, a busca pelo irmão é também uma tentativa de recuperar seu ego. Quando o irmão gêmeo morreu, ela perdeu a pessoa com quem tinha mais conexão, numa metáfora não muito discreta. Agora ela tem de interagir com pessoas que não a entendem, como a viúva do irmão, o namorado almofadinha da artista e a própria “chefe”. As cenas sobrenaturais, em que ela busca a conexão perdida ficam assim entrelaçadas com as cenas de auto-descoberta, incluindo meditações sobre saúde e sexo que incluem visitas a médicos e masturbação.

Tudo isso se passa com uma ambientação sombria e por vezes assombrosa. O filme parece aceitar como real a presença do sobrenatural desde o começo com frequente uso da computação gráfica. Mas os seres humanos que habitam essa história talvez sejam ainda mais tenebrosos. Um crime ocorrido no meio do filme é uma guinada bem-vinda, um sinal de que Assayas está bem empenhado em dar ritmo ao seu filme um ritmo interessante, em vez de se perder em vagarias.

E Stewart, que abriu o Festival de Cannes num filme de Woody Allen, encontrou o melhor parceiro de sua carreira no diretor francês. Esta é a segunda colaboração entre os dois após “Acima das Nuvens”, que também estreou em um festival passado. Ao consolidar uma relação de artista e musa como esta, ficamos no aguardo do que ainda está por vir.

Avaliação: Ótimo (4 estrelas)

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