A paixão cura o tédio em “Anomalisa”, novo filme de Charlie Kaufman
Indicado ao Oscar de animação, longa acompanha o cotidiano de um palestrante que se apaixona por uma telefonista durante uma viagem a trabalho
atualizado
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Charlie Kaufman é um dos poucos e raros casos de roteirista celebridade em Hollywood. Ele responde pelos textos de alguns dos filmes indies mais adorados dos últimos quinze anos, como “Quero Ser John Malkovich” (1999) e “Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças” (2004). Em “Anomalisa”, indicado ao Oscar de animação, ele retoma seus personagens solitários e entediados no formato de stop-motion (feito com frames fotográficos), dividindo a direção com Duke Johnson.
Palestrante acostumado a viajar pelos Estados Unidos dando discursos sobre serviço de atendimento ao cliente, Michael Stone (voz de David Thewis) é o perfeito arquétipo de Kaufman: um homem adulto branco, inseguro, emocionalmente carente e sempre atormentado pelo cotidiano modorrento e repetitivo. A relação com as mulheres também não é das melhores. Stone é tímido, inconveniente e até ríspido em certos momentos.
Animação impressionante, ideias recicladas
Numa dessas viagens a trabalho, em Cincinnati, o tédio é desafiado horas depois de fazer check-in no hotel. A técnica de stop-motion revela traços perturbadores em rostos e ambientes. Os personagens caminham de um jeito cansativo e as feições das pessoas que rodeiam Stone são todas iguais, com vincos que revelam corpos parecidos com marionetes.
Uma antiga paixão de Stone vive em Cincinnati e isso tira a paz do palestrante. Num instante de desespero, sai pelo corredor batendo à porta de quartos alheios. Ele só para quando encontra Lisa (voz de Jennifer Jason Leigh), uma telefonista que acumulou dívidas para poder viajar e acompanhar a conferência. Dá nisso: o especialista em SAC se apaixona pela mulher que usa a voz para sobreviver.
Adaptado da peça homônima escrita por Kaufman sob o pseudônimo Francis Fregoli, “Anomalisa” sofre dos mesmos problemas da primeira experiência do roteirista como diretor, “Sinédoque, Nova York” (2008).
É uma narrativa ensimesmada, de metáforas confortáveis (os rostos genéricos representando uma humanidade adormecida pelo trabalho) e que leva muitíssimo a sério os ideais deprimidos de Kaufman, tão afeito a personagens que zanzam pelo mundo em busca de uma cura – de preferência por meio de uma mulher. Um filme lamuriento à beça – mais do que qualquer outro que Kaufman já tenha feito – e que só vale pelo bizarro visual em stop-motion.
Avaliação: Regular
Veja salas e horários de “Anomalisa”.