Vice-governador não vai à acareação na CPI da Saúde sobre grampos
Renato Santana alegou que já disse tudo o que sabia no primeiro depoimento. Distritais queriam que ele ficasse frente a frente com a presidente do SindSaúde, Marli Rodrigues, que gravou conversas que tratam de um suposto esquema de propina no GDF
atualizado
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O vice-governador Renato Santana (PSD) desafiou os deputados distritais e não foi à acareação com a presidente do SindSaúde, Marli Rodrigues, marcada para a manhã desta segunda-feira (15/8), na Câmara Legislativa, sob a alegação de que já esclareceu tudo que sabe. A justificativa (veja a íntegra abaixo) foi entregue pelo advogado de Santana à assessoria da CPI da Saúde, pouco antes do início da sessão.
A sindicalista e o número dois do Palácio do Buriti seriam colocados frente a frente para esclarecer algumas divergências do primeiro depoimento prestado à CPI da Saúde. Em áudios divulgados em 15 de julho, os dois falam em um esquema de propinas em contratos da Secretaria de Saúde que giraria em torno de 10% e 30%.Santana, por exemplo, disse que só havia se encontrado com Marli uma vez. Mas um segundo encontro teria sido gravado pela sindicalista. As conversas foram divulgadas no momento em que o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) discute a transição do atual sistema de gestão da saúde para o modelo das organizações sociais. Em um dos áudios, Renato Santana faz críticas à proposta de Rollemberg.
Segundo integrantes da CPI da Saúde, a assessoria de imprensa de Santana havia confirmado a participação dele na comissão. Marli, por sua vez, compareceu à sessão, que devido à importância foi marcada para o plenário e não na sala das comissões.
“Eu creio que a ausência do vice-governador prejudica muito os trabalhos da CPI. Quando não temos o poder de convidá-lo ficamos impedidos de esclarecer os vários encontros que ele teve com a Marli” , repudiou Wasny de Roure (PT).
Novo depoimento de Marli
Sem a acareação, Marli prestou um novo depoimento. Ela esclareceu que se encontrou pelo menos cinco vezes com o vice-governador. Uma vez no gabinete dele. Dois outros encontros teriam ocorrido no restaurante Traíra sem Espinha, na Vila Planalto. Uma reunião foi marcada na casa da própria Marli e outra na residência de um assessor de Santana. “Todos os encontros foram gravados”, afirmou.
Ela negou que tenha outros áudios e garantiu que não entregou as gravações para a imprensa. “Não tenho mais nada em meu poder. Não há mais nada que possa vir à tona em relação à membros do Executivo”, declarou. E completou: “Não estou atuando contra o governo, mas contra um esquema de corrupção que está instalado na Secretaria de Saúde”.
Ticket Car
Boa parte do depoimento de Marli foi para explicar um dos áudios, em que o ex-subsecretário de Infraestrutura e Logística da Saúde, Marco Junior, cita supostas irregularidades na contratação de serviços. Entre elas estaria um contrato de manutenção de veículos, no valor de quase R$ 12 milhões por ano. O contrato foi assinado com a TicketCar e, de acordo com ele, “sem dotação orçamentária, sem passar pelo Jurídico, sem passar pela Procuradoria”.
O negócio, conforme Marco Júnior, teria sido coordenado pelo subsecretário de Infraestrutura da Saúde, Marcello Nóbrega, citado por ele como “operador” da mulher do governador, Márcia Rollemberg, na pasta. Marli confirmou o teor das gravações.
À tarde, as secretarias de Saúde e de Planejamento, Orçamento e Gestão publicaram notas sobre as declarações de Marli. Segundo as pastas, “tal contrato foi celebrado em março de 2016 entre o governo e a empresa Ticket Car. O contrato foi firmado à época pela então Secretaria de Gestão Administrativa (Segad)”.
Ainda segundo a nota, “atualmente, a contratação que está vigente é gerida pela Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão. Trata-se de ata de registro de preços, cujo valor anual máximo é de R$ 11,8 milhões. O gasto mensal máximo pode chegar a R$ 991 mil — o que nunca ocorreu. Por meio desse contrato, que atende a 35 órgãos, a Secretaria de Saúde tem a possibilidade de oferecer manutenção a 1,8 mil veículos cadastrados – inclusive os que integram o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu)”.
Confederal e Ipanema
Ainda questionada por Wasny de Roure, que listou 25 perguntas para a sindicalista, Marli confirmou que os áudios de Marco Júnior indicavam que o ex-diretor do Fundo de Saúde do DF, Renato Cardoso, privilegiava empresas na hora do pagamento. O petista questionou, então, se as empresas citadas seriam a Ipanema, da família do distrital Cristiano Araújo (PSD), e a Confederal.
Marli confirmou, baseada nos áudios, que o esquema se tratava de passar na frente os pagamentos a essas empresas e que, para fazê-los, Cardoso teria utilizado recursos públicos de forma inapropriada, como o que serve para o pagamento de servidores (Fonte 100) e para saúde primária (Fonte 138).
Veja o conteúdo da carta enviada pela defesa do vice-governador à CPI da Saúde:
RENATO SANTANA DA SILVA, Vice-Governador do Distrito Federal, devidamente qualificado, por seu advogado, nos termos da convocação n. 019/2016, que tem por escopo convidar o Vice Governador do Distrito Federal “para prestar esclarecimentos e demais informações relativas à saúde pública do Distrito Federal, com vistas a subsidiar os trabalhos desta Comissão Parlamentar de Inquérito”, vem, à presença de Vossa Excelência expor e ao final requerer o quanto segue.
A Câmara Legislativa do Distrito Federal está exercendo seu papel junto à sociedade garantido constitucionalmente ao apurar com ímpar isenção e determinação, eventuais irregularidades na área da saúde pública do Distrito Federal.
O Vice Governador do Distrito Federal foi convidado para contribuir com as investigações da CPI da Saúde, como de fato ocorreu no dia 21/07/2016, onde ele esclareceu todos os fatos vinculados às denúncias que havia recebido em seu Gabinete, estas referentes à Secretaria da Fazenda, e que com relação aos fatos referentes à área da saúde nunca lhe foram noticiadas quaisquer irregularidades.
Diante dos fatos o Vice-Governador cumpriu com sua missão com zelo, lealdade, diligência e retidão ao comunicar o Governador Rodrigo Rollemberg, os fatos que vieram ao seu conhecimento por meio de denúncia de empresários de suposto esquema de fraude no setor financeiro do Distrito Federal. Assim, cumprindo com absoluta clareza, a determinação contida na Lei Complementar 840/2011, Título V, Capítulo Único, “Dos Deveres”, que em seu artigo 180, inciso VI, determina de levar ao conhecimento da autoridade superior as falhas, vulnerabilidades e as irregularidades de que tiver ciência em razão do cargo público ou função de confiança.
Em relação ao conteúdo da convocação n. 019/2016, para prestar esclarecimentos e demais informações relativas à saúde pública do Distrito Federal, com vistas a subsidiar os trabalhos desta Comissão Parlamentar de Inquérito esclarece:
Isso tudo já está superado, pois o Vice-Governador já compareceu ao convite anteriormente feito pela Comissão, e inclusive já esclareceu todos os fatos necessários relativos às denúncias que teve conhecimento da pasta da Fazenda.
O único ponto controverso, aquele ponto em que a Sra. Marli acusa o Vice-Governador de ter mencionado o Governador Rollemberg nos áudios gravados clandestinamente, será motivadamente apurado na esfera criminal.
Ademais, e conforme já explicitado, o Vice Governador já contribuiu com tudo o que sabia, inclusive junto ao Inquérito Policial 35.2016, que apura tais fatos, nada mais tendo a acrescentar.
Por todo o exposto esclarece:
– que o Vice Governador já compareceu espontaneamente na CPI da Saúde quando convidado;
– que o Vice Governador já esclareceu as ações adotadas nas denúncias das quais tinha conhecimento na Secretaria de Fazenda;
– que o Vice Governador já esclareceu que nada sabia sobre denúncias na área da saúde;
– que o Vice Governador já prestou os esclarecimentos necessários no inquérito 035/2016;
– que o Vice Governador nada mais pode contribuir com o objeto da convocação 019/2016.
Estas as considerações que nos competiam.
César Caputo Guimarães
OAB/SP – 303670
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