Defesa do homem que cumpriu pena no lugar do “irmão de coração” quer indenização de R$ 3 milhões
Francisco Magalhães de Souza foi surpreendido em 2009 com um mandado de prisão por homicídio. O crime foi praticado em 1989, em Ceilândia, pelo primo dele, que tem o mesmo nome
atualizado
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A primeira coisa que Francisco Magalhães de Souza, 42 anos, fez depois de passar dois anos e quatro meses entre idas e vindas do presídio, acusado de homicídio injustamente no lugar de um primo homônimo (que tem o mesmo nome), foi comer uma coxinha, um pão de queijo e tomar uma Coca-Cola, seu refrigerante preferido. O lanche foi feito na Rodoviária Interestadual.
Ao sair do Complexo da Penitenciário da Papuda, na tarde desta terça-feira (15/3), ele sequer esperou o advogado buscá-lo. A vontade de sair de trás das grades era tão grande que sem um centavo no bolso ele saiu á pé mesmo. No caminho, conseguiu uma carona de outra advogada que passava na via. “Até perguntaram se eu queria esperar porque eu estava sem dinheiro. Não pensei duas vezes, fui andado, carregando uma mochila com meus objetos pessoais”, contou.Além da carona até a rodoviária, a advogada deu R$ 50 a Francisco. O dinheiro bancou o lanche e seria utilizado para comprar uma passagem para a Paracatu (MG), cidade em que mora a sua família. O maior desejo dele era reencontrar a família. Rever a mulher Nay Gonçalves da Silva e a filha adotiva de 23 anos. Quanto ao primo, que ele considera “irmão de coração”, Francisco diz que não guarda nenhuma raiva.
“Fiz amigos na prisão, até conversava um pouco para me distrair, mas a saudade que sentia da minha esposa me consumia la dentro. Desde que fui transferido para o DF não conseguia contato com ela”, lembra Francisco, que morava em Paracatu até ser preso. “Cheguei a enviar um carta, mas até então não sabia se ela tinha recebido. Ontem, ao chegar em casa, descobri que ela recebeu e chegou a me enviar duas cartas, que nunca tive acesso”.
Em liberdade, Francisco falou com o Metrópoles. Veja o vídeo:
A prisão
Francisco sempre morou em Paracatu. Visitou o DF uma única vez aos nove anos. O auxiliar de serviços gerais foi surpreendido em 2009 com um mandado de prisão por homicídio. O crime foi praticado em 1989, em Ceilândia. O autor confesso é seu primo de criação, homônimo, porém, mais velho.
“Foi uma sucessão de erros. Primeiro, não conferiram as digitais. Na época do crime, se este Francisco tivesse mesmo praticado o crime, ele teria 15 anos. Não poderia responder criminalmente. Outro fato é que o crime já tinha prescrito em 2009”, explica o advogado Ivo Ribeiro.
Ainda em 89, ano do homicídio, o primo de Francisco se apresentou à polícia e confessou o homicídio. No entanto, aguardava o julgamento em liberdade. Quando o juiz decidiu pela prisão, o endereço que constava no processo era o do outro Francisco, em Paracatu.
A partir de então, ele foi preso por 11 meses na cidade mineira. Foi solto porque a Justiça entendeu que poderia haver, de fato, um homônimo. Em 2012, o juiz definiu que Francisco tinha duas identidades e pediu a prisão do homem novamente. À época, ele já tinha se restabelecido e encontrado outro emprego. Porém, ficou preso por mais quatro meses.
Em 2015, veio transferido para a Papuda. O objetivo era fazer, finalmente, o confrontamento de digitais. E colocar um ponto final em toda essa confusão, que lhe custou a liberdade e o privou da convivência daqueles que mais amava.
“Fui contratado pelo primo. Iria resolver dois problemas. O primeiro é que ele não conseguia tirar o título de eleitor porque no momento em que foi fazer a biometria o sistema acusou que havia duplicidade de nomes. Ele também notou que o processo de homicídio ainda estava em aberto”, disse o advogado. Ele localizou Francisco.
A família que morava no mesmo endereço informou que o homem havia sido preso por homicídio. “Entendi que não se tratava de duplicidade e, sim, um erro do Estado. Francisco não sabia porque estava preso e o primo não entendia porque não foi detido”, disse Ivo.
Do Centro de Detenção Provisória (CDP) da Papuda, Francisco quer distância. Ele dividia uma cela com 20 detentos, quando a capacidade era para sete. Tinham dois beliches com 3 camas e dois colchões no chão.