Grand Cru, uma sábia renovação
Quem odeia segundas-feiras ainda não foi ao restaurante Grand Cru. Segunda tem sido um dia emblemático para a casa, que fez uma aposta na renovação da sua cozinha
atualizado
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Quem odeia segundas-feiras ainda não foi ao restaurante Grand Cru. Segunda tem sido um dia emblemático para a casa que, há pouco mais de dois anos, fez uma aposta na renovação da sua cozinha. A antenadíssima Deise Lima, uma das proprietárias, pinçou do mercado os chefs Leônidas Neto e Alexandre Aroucha, que estavam esperando o chef Simon Lau decidir sobre os rumos do seu Acquavit (fechado em 2013), onde esses dois profissionais trabalhavam.
Alunos atentos, ele souberam extrair belos ensinamentos do dinamarquês, sem ficar à sombra. Uniram o aprendizado ao talento e ao conhecimento que adquiriram pelos estágios e pelas cozinhas que passaram. Deise apostou firme. Pois até então o Grand Cru era uma versão mais sofisticada dos tradicionais restaurantes contemporâneos em Brasília — como Universal e Dudu Bar –, que sempre optavam por servir aquelas duplas infames e óbvias: risoto e carne ou purê e carne, com um molho doce fazendo contraste com algum queijo.
A mudança lá na cozinha foi paulatina. Como abandonar o cliente da Grand Cru que gosta do “feijão-com-arroz” e oferecer pinceladas de contemporaneidade? Querendo ou não, estamos falando de negócio. Para testar os paladares mais conservadores, surgiram as segundas harmonizadas. Um menu criativo com entrada, prato principal e sobremesa, harmonizado com taças de vinho, a um preço mais acessível do que se pagava no Acquavit. Atualmente, o menu completo custa R$ 90 e a harmonização sai por R$ 73, mais 10% de serviço.
E assim, de maneira suave, mas com personalidade, as segundas foram contaminando positivamente os outros dias da semana. Dona Deise foi dando mais espaço e permitindo outras mudanças. Sorte nossa, os clientes. Então, os meninos intensificaram a brincadeira e equilibraram o cardápio com clássicos e combinações mais instigantes.
Deixe-me materializar o que comento com alguns pratos feitos ao longo desses dois anos de trabalho da dupla à frente da cozinha do Grand Cru: Kassler (costela suína confitada), purê de batatas, farofa de alho e geleia de laranja e molho roti; camarão com molho de moqueca, arroz de coco e farofa de banana; filé suíno com xerém (canjiquinha), molho de pimenta verde e crocante de couve; javali com risoto de ervilhas, queijo roquefort e maçã; camarões com arroz de legumes mediterrâneos tostados e molho de açafrão espanhol; pirarucu defumado artesanalmente com consomê de tucupi, sagu e stick de polvilho azedo… E por aí segue.
Tanto na escolha dos ingredientes quanto na execução, os chefs botaram no chinelo os aspirantes a Alex Atala em Brasília. Tem de suar para fazer o trivial. Tem de suar mais ainda para saber ousar, sem criar coisas estapafúrdias e achar que está abalando. Dosar o ego faz bem para a cozinha. Reclamo apenas da pouca antecedência da divulgação do cardápio das segundas. Uma questão de gestão que ajudaria a encher mais a casa. Não me olhem de cara feia, Dona Deise, Leônidas e Alexandre. Organização é tudo!
Em uma das minhas últimas idas, experimentei de entrada uma linguiça artesanal de cordeiro (R$ 41) com chutney, molho de iogurte e kummel (cominho) tostado. Uma iguaria que muito me lembrou dos sabores que experimentei no Marrocos. As entradas variam entre R$ 33 e R$ 73 (burrata artesanal com figos, nozes e manjericão). Sei que o restaurante tem zelo pelo que é servido, mas há alguns pontos fora da curva. Esse último valor, confesso, me deu um susto. Bem salgado!
Ando muito na onda do bacalhau. E o que comi por lá estava muito, muito saboroso, equilibrado e bem servido. Era um lombo, acompanhado de salada morna de grão de bico, alho, ovos cozidos, tomates cereja, azeitonas pretas e espinafre (R$ 89).
O ambiente do restaurante-adega traz conforto. Esse aconchego se dá tanto na varanda, onde o ambiente é mais barulhento, até os dois salões internos — o menor perto do balcão e o maior com mesas cercadas de vinhos por todos os lados. A meia luz, as mesas de madeira, a louça delicada da artista Célia Estrela e luminárias feitas com tachos de cobre compõem o cenário sóbrio, ótimo para um jantar a dois ou com amigos.
Saio de lá quase todas as vezes com boa impressão no meu paladar. Um lugar de boa comida e de boa energia.
Cortês sim; omissão, não
DEVO IR?
Sim, de preferência às segundas ou nos almoços executivos.
PONTO ALTO:
As combinações instigantes dos pratos e a beleza do salão.
PONTO FRACO:
Os preços. Sei que os ingredientes são caros e a mão-de-obra também. Mas não dá para ir com a frequência que eu gostaria.
Grand Cru (SHIS QI 09/11, Bloco L, Loja 6, Lago Sul, 3368-6868). O cardápio das segundas harmonizadas costuma ser anunciado no site do restaurante.