Surpresa. Técnica de informática recebe cartão do Bolsa Família com crédito de R$ 77
Moradora de Formosa (GO) afirma que nunca se inscreveu no programa, que concede ajuda na renda de pessoas em situação de extrema pobreza. Ministério afirma que vai apurar para descobrir o que ocorreu
atualizado
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Com o orçamento curto, o Bolsa Família corre risco de sofrer cortes este ano. Mas a suspensão poderia não ser necessária caso o governo fosse mais rigoroso na concessão do benefício. Tem gente que não precisa, está inscrita no programa e nem sabe. É o caso da técnica em informática Débora Kunzler, de 20 anos, que recebeu um cartão do Bolsa Família sem pedir o benefício. Surpresa, a moradora de Formosa (GO) quer saber o que fazer e a quem procurar para resolver a situação.
Há uma semana, Débora recebeu a correspondência, que veio com data de emissão de 15 de janeiro. Um dia antes, afirma, havia recebido uma notificação de que o cartão chegaria. “Nem dei bola, porque achei que fosse a carta informando o saldo do meu Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) que recebo todo mês”, contou ao Metrópoles.“O cartão veio com o meu nome e o meu número do Programa Integração Social (PIS). Vou procurar saber o motivo de eu ter sido beneficiada e devolver. Se eu recebi, pode ter mais gente que não precisa e também foi contemplada”, destaca a jovem.
Procurado pela reportagem, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) afirmou, em nota, que determinou o bloqueio do benefício e que vai apurar se houve má-fé por parte de algum dos envolvidos no cadastro.
Susto
Com renda familiar superior à exigida para ser beneficiada, Débora conta que levou um susto ao abrir o envelope e ver o cartão. O choque não foi à toa: para participar do programa, as famílias devem estar em situação de extrema pobreza (renda mensal de até R$ 77 por pessoa) ou pobreza (entre R$ 77,01 e R$ 154). Débora, que mora com os pais e a irmã, estima que a renda de sua família gire em torno de R$ 4,5 mil – o que resultaria em um ganho mensal médio de R$ 1.125 por pessoa.
Ela conta que a única vez que se cadastrou em algum programa do governo foi para fazer um curso do Bolsa Futuro, em 2014. “Na época, eu ainda não tinha a carteira assinada e recebia R$ 400 por mês. Na inscrição, não exigiam a participação em nenhum outro programa do governo. O meu pai já trabalhava e tínhamos renda, então não vejo motivos para ter sido incluída no Bolsa Família”, alega Débora.
Inclusão
Kênia Vieira, gestora do Cadastro Único (CadÚnico) e coordenadora do programa Bolsa Família em Formosa (GO), afirma que ao procurar o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) para cadastro na Bolsa Futuro, Débora foi incluída no CadÚnico – porta de acesso a vários programas do governo federal.
Ainda segundo a gestora, ela teria declarado uma renda per capita de R$ 66 na época do registro e, por isso, foi enquadrada como possível beneficiária do programa. Ainda de acordo com Kênia, a assistente social que fez o cadastro não trabalha mais no local.
Começamos a apurar e fiscalizar todas as famílias que foram atendidas pela assistente social responsável pelo o caso de Débora Kunzler, para verificar se, de fato, todas essas famílias estão no perfil do Cadastro Único e dentro dos critérios do benefício.
Kênia Vieira, gestora do Cadastro Único e coordenadora do programa Bolsa Família em Formosa (GO)
Em nota, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome informou que “as informações registradas no sistema indicam renda compatível com os limites do Programa Bolsa Família”. A pasta acrescentou que a seleção para que o benefício seja concedido ocorre por meio do Cadastro Único, realizado pelas prefeituras de cada município.
“Depois que a família se inscreve no CadÚnico, o sistema informatizado analisa as informações de acordo com critérios definidos na legislação”, completa a nota. Se a renda declarada estiver dentro dos critérios do programa, a família é automaticamente incluída no Bolsa Família.
O benefício do cartão de Débora estaria disponível para saque na quinta-feira (21). O Metrópoles teve acesso ao extrato da conta em que o auxílio foi depositado e constatou saldo de R$ 77, referente ao benefício básico – que deveria ser concedido a famílias em situação de extrema pobreza.
Irregularidades
Auditorias realizadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) detectaram irregularidades no Programa Bolsa Família e no Cadastro Único. A última análise do TCU no programa foi feita em 2014, quando o órgão detectou, entre outros problemas, indícios de descumprimento da legislação aplicável, ocorrências de erros e indícios de fraudes e deficiências no acompanhamento e gestão do sistema.
Em 2009, também foram identificados problemas no sistema. Entre eles estavam indício de famílias cadastradas em desconformidade com o critério de renda do CadÚnico e, ainda, pessoas falecidas cadastradas que recebiam benefícios pelo programa.