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José Serra: “Como para todo governo, o mais difícil é governar”

“Como para todo governo, o mais difícil é governar”, afirmou o ministro das Relações Exteriores

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Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles
Ministros do governo Michel Temer – Brasília – DF 12/05/2016
1 de 1 Ministros do governo Michel Temer – Brasília – DF 12/05/2016 - Foto: Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

A estreia do presidente Michel Temer no cenário internacional foi positiva, avaliou o ministro das Relações Exteriores, José Serra, que o acompanhou na visita recente à China para a reunião do G-20. A despeito de Venezuela, Bolívia e Equador haverem retirado seus embaixadores do País em protesto contra o processo de impeachment de Dilma Rousseff, na avaliação do ministro houve manifestações favoráveis de parceiros importantes, como os Estados Unidos e a Rússia, além das Nações Unidas e da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Porém, os desafios à frente não são fáceis. “Como para todo governo, o mais difícil é governar”, afirmou. Segundo ele, Temer tem em sua agenda alterações importantes na Constituição, a serem discutidas num Congresso onde a base governista ainda é heterogênea e a oposição, atuante. Veja abaixo os principais trechos da entrevista.

Como o senhor avalia a estreia do governo Temer no cenário mundial?
A presença do Brasil no G-20 foi boa, como também foi boa a participação na reunião dos Brics (grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e na reunião de chanceleres que lá estavam.

Boa em que sentido?
Foi um primeiro contato com o resto do mundo. E o presidente passou a impressão de seriedade, tranquilidade e determinação. Estou falando isso sem nenhum governismo. Do ponto de vista dos Estados Unidos, o Joe Biden (vice-presidente americano) deu uma excelente declaração. A Argentina deu uma nota formal a partir da assunção do Temer, também positiva. O Chile, que é um governo do partido socialista, disse que quer fortalecer a relação bilateral. A Colômbia foi na mesma direção e chamou o governo de constitucional. O Peru foi na mesma direção. A Rússia elogiou a relação com o governo Dilma mas, lembrou, também do vice-presidente Temer. O chanceler russo pediu até uma reunião em Nova York comigo.

Mas, aqui na região, o sucesso não foi tanto.
A Unasul inicialmente tinha tido um projeto de nota. Mas além, naturalmente, do Brasil, Argentina, Colômbia, Chile, Paraguai e Peru disseram que não apoiariam o comunicado. Na reunião da OEA, Argentina, Paraguai, México, Colômbia, Chile, Granada e Jamaica tomaram uma posição mais a favor do governo Temer. Isso é mais significativo, porque não é uma nota, é uma orientação de governo. E o secretário da ONU disse confiar que, sob a liderança de Temer, o Brasil e as Nações Unidas continuarão sua parceria tradicional. Então, eu diria que nesse front as coisas foram bem, para poucos dias de governo.

E agora?
Como para todo governo, o mais difícil é governar. Tem um quadro econômico difícil, uma herança econômica difícil, um processo legislativo complexo que envolve muitas mexidas na Constituição. Tem uma base ainda heterogênea, mas ao longo do tempo a esperança é que ela se torne mais homogênea, mais integrada. E tem uma oposição atuante. Que já se move por meio dos seus quadros, principalmente centrados no PT. Não vai ser fácil. Vai exigir bastante. Mas não justifica uma visão pessimista sobre o futuro – pelo contrário.

O senhor diria que a projeção externa do governo Temer já é uma questão superada?
Eu não diria que é superada. Mas para nós é uma questão para lá de neutra. Talvez, positiva.

Mas e a Venezuela congelando a relação com o Brasil, a Bolívia e o Equador chamando os embaixadores?
A Venezuela é um país fora de controle. Não é o caso da Bolívia. Nosso embaixador lá já estava no Brasil por causa da morte de um familiar. Então, não é que ele foi chamado; ele apenas não voltou.

Até quando ficaremos assim?
Gradualmente, as coisas vão sendo organizadas. Não vamos esquecer que o Equador está em pleno processo eleitoral.

Essa tensão regional não atrapalha?
Não ajuda, mas não é algo que possa atrapalhar.

E o Mercosul?
Mercosul é um outro processo. Não tem nada a ver com isso que estamos falando. O importante no Mercosul é que temos reformas a fazer. E, quanto a isso, há total concordância da Argentina, do Paraguai e do Uruguai.

Quais serão os próximos passos em relação à China?
Vamos criar um grupo China dentro da Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos). Porque a China é muito grande e é o primeiro parceiro do Brasil nas exportações. O que queremos em relação à China? Por um lado, queremos exportação de capital chinês para infraestrutura no Brasil. É o caso típico da compra da CPFL. Dou especial valor a isso, porque o fato é que a distribuição de energia se deteriorou no Brasil na última década, nos governos do PT. E a qualidade da distribuição é um fator muito importante para o desenvolvimento. Com a CPFL e mais uma distribuidora no Rio Grande do Sul, os chineses têm 15% da distribuição no Brasil. Temos interesse em atrair os chineses e seu capital de longo prazo para outras áreas.

E no comércio?
Na parte comercial, temos de caminhar para um acordo comercial que permita ao Brasil aumentar as exportações com valor adicionado. Por exemplo, a soja. A China faz uma escalada tarifária. Zero para a soja em grão, 5% para o farelo e 9% para o óleo. Ou seja, forçam o Brasil a vender matéria-prima. Essa é uma situação que temos de negociar. Coisa parecida é feita em relação ao café. Em grão, é zero. O solúvel é praticamente impossível de ser exportado. E tem o milho. A China se candidata a ser exportadora de frango, usando milho brasileiro. Compram milho no Brasil, alimentam seus frangos, exportam e deslocam nossas exportações de frango.

Mas tem abertura para um diálogo como esse?
Obrigatoriamente.

Qual será a postura em relação aos Estados Unidos?
A questão são as barreiras não tarifárias, cada vez mais importantes. Uma coisa que queremos, até, é que essas barreiras possam ser crescentemente normatizadas pela Organização Mundial do Comércio, no sentido de ter padrões comuns. Para as barreiras sanitárias, por exemplo, terem uma base científica.

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